Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

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Crescimento chinês deixa 61 milhões de crianças longe dos pais

Como milhões de crianças na zona rural da China, Yang Hailian, de dez anos, mal pode esperar pelo momento em que seus pais voltarão de seus empregos numa cidade distante para passar em casa o feriado do Ano Novo Lunar, que neste ano começa no dia 31 de janeiro. Fábricas e canteiros de obras fecham e a maioria dos trabalhadores migrantes do país faz uma longa viagem para se reunir com suas famílias. "Eles sempre me trazem roupas novas", diz ela.

Os pais de Hailian saíram de casa há cerca de sete anos. Ela e sua irmã de sete anos, Yang Haili, são exemplos de uma das mais dolorosas consequências da maior migração na história da humanidade. A China tem cerca de 250 milhões de trabalhadores migrantes, que se deslocam em massa das áreas rurais até as cidades para ajudar a suprir a demanda por mão de obra barata das fabricas do país.

Os migrantes geralmente vivem em dormitórios, acampamentos ou abrigos. Seus filhos raramente vão com eles por causa das regras rígidas estabelecidas há décadas pelo governo para controlar o fluxo de pessoas em todo o país.

Cerca de 61 milhões de crianças chinesas - uma em cada cinco do país mais populoso do mundo - não veem um ou ambos os pais há pelo menos três meses, segundo a Federação das Mulheres de Toda a China, um grupo de defesa dos direitos da mulher ligado ao Partido Comunista. Essas crianças são conhecidas na China como os filhos deixados para trás. Em nenhum outro lugar do mundo há um número tão grande de crianças vivendo basicamente por conta própria.

Muitos pais migrantes acreditam estar cumprindo seu dever de elevar o padrão de vida da família. O salário enviado para casa ajuda a pagar por mais comida e educação. Alguns trabalhadores economizam dinheiro suficiente para construir uma casa nova em seus municípios rurais. É comum ambos os pais saírem de casa juntos.

A ausência deles obriga as crianças a assumir as responsabilidades da administração de uma casa. Avós que vivem com crianças deixadas para trás muitas vezes estão doentes ou trabalham longas horas no campo ou catando lenha. Muitos avós chineses da zona rural são analfabetos e não podem ajudar com a lição de casa.

A rotina diária de Hailian começa saltando da cama às cinco da manhã. O despertador acorda os cachorros e galos ao redor da casa, na província de Guizhou, no sudoeste da China. Trata-se de uma das regiões mais pobres da China, a três horas de avião de Pequim. "Não é difícil", diz ela. "Quanto mais você trabalha, mais fácil fica."

As palavras corajosas de muitas dessas crianças ocultam um problema mais profundo que pode prejudicar a economia chinesa e provocar agitação social, dizem assistentes sociais e pesquisadores. Mais de 70% das crianças em áreas rurais da China mostram sinais de problemas de saúde mental, como ansiedade e depressão, em testes padronizados, diz Scott Rozelle, professor da Universidade de Stanford e um dos realizadores do estudo que chegou a essas conclusões. Isso torna ainda mais difícil para as crianças concluir o ensino médio em escolas rurais.

A indignação pública sobre os filhos deixados para trás eclodiu em 2012, depois que cinco meninos abandonados morreram numa caçamba de lixo em Guizhou. Para se abrigar do frio, eles se fecharam na caçamba, acenderam uma fogueira e morreram envenenados por monóxido de carbono.

Em novembro, o Partido Comunista anunciou que cidades pequenas vão relaxar suas exigências para a residência de menores, de modo a permitir que as crianças possam viver com seus pais migrantes. Mas as autoridades não estão revendo as regras que proíbem migrantes de levar os filhos a cidades maiores, como Pequim e Xangai, onde está a maior parte dos empregos. Autoridades estão preocupadas com o aumento que tantas crianças causariam nos custos de saúde e educação.

Os pais de Hailian trabalharam durante um ano numa usina elétrica no Irã e depois em várias cidades chinesas. "Viajamos para o leste e para o oeste", diz Yang Ziyong, pai de Hailian. Sua mãe, Li Xiaochan, acrescenta: "Vamos para onde nos pagarem mais." Ambos têm 28 anos e enviam dinheiro quando podem. O avô de 76 anos de Hailian está com a saúde debilitada; a avó morreu há anos.

Depois que seus pais saíram de casa, o irmão mais novo de Hailian, Ping'an, que tinha três anos, morreu afogado num poço de água, segundo parentes e vizinhos. Seus pais vieram rapidamente para o funeral e voltaram a seus empregos alguns dias mais tarde.

O pai diz que seu filho morreu de uma doença. "Não me sinto mal por isso", diz ele. Hailian não fala sobre o assunto. Ela e sua prima de 11 anos lavam roupa todos os dias no mesmo poço.

Dos 75 alunos da Escola Primária Mao Cao Ping, de Xia Qing, 39 foram deixados por pais migrantes, diz o professor de língua chinesa Yang Yuansong. "Os pais dizem: 'Comportem-se, estudem bastante, façam a coisa certa'", diz Yang. "Eles sentem que seus pais não lhes dão amor suficiente."

Yang encoraja as crianças a expressar seus sentimentos em diários. Hailian escreveu sobre a surpresa de ver seus pais retornarem antes do esperado. Fazia cerca de um ano que não os via, mas eles voltaram para casa em dezembro por haver deixado seus empregos e queriam fazer uma pausa antes de tentar encontrar outro mais bem remunerado. Ela encontrou sua mãe e seu pai na casa nova construída com as economias que eles haviam enviado. A casa fica fechada quando eles viajam.

"Eu vi fumaça saindo da cozinha", escreveu Hailian. "Corri até lá. Quando cheguei à casa nova, vi que meu pai havia comprado coisas para eu comer. Eu gostei tanto. Hoje, estou muito feliz."

Poucos dias depois de sua chegada, o pai de Hailian, enquanto fumava um cachimbo longo de água feito de bambu, mostrava estar desapontado com a filha. "Ela é muito mediana", disse ele.

Hailian geralmente está entre os três melhores alunos de sua classe, mas isso não impressiona o pai dela. "Suas notas são boas para um lugar pequeno como esse, mas numa cidade grande não seriam satisfatórias", disse ele. Ela ouviu com um olhar indiferente, agarrando-se à sua mãe.

E eles sentem falta de seus filhos? "Para isso não há remédio", respondeu o pai de Hailian. "Se você não pode engolir a amargura, não vai chegar a lugar nenhum."

Hailian logo teve outra decepção. "Vamos ficar longe mais 15 anos", disse o pai. Ele quer continuar a trabalhar em fábricas até que seja considerado velho demais para competir com migrantes mais novos e mais fortes das áreas rurais da China. Até lá, Hailian vai ter idade suficiente para, ela também, deixar Xia Qing para trás.

Por Andrew Browne | The Wall Street Journal, de Xia Qing, na China


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