O Brasil entrou em confronto com a China e a Rússia no encontro do G-20 agrícola, ontem em Paris, por causa da demanda dos dois parceiros que, na prática, faria com que a política brasileira de biocombustível fosse sujeita à segurança alimentar global.
Os ministros do G-20 concordaram em aumentar a produção agrícola e dar mais transparência e previsibilidade ao mercado, numa tentativa de reduzir a volatilidade de preços dessas commodities no futuro. Mas as divergências sobre etanol, alimentos e preços altos agora surgem também entre os emergentes.
O Valor apurou que o debate se acirrou entre os três grandes aliados no Brics, nos últimos momentos da negociação do plano para evitar a volatilidade dos preços agrícolas, por volta de uma hora da manhã. A divergência foi em relação a um parágrafo que encorajava os países a produzirem etanol a partir de plantas e não de matérias-primas para produção de alimentos, e a reduzirem suas exigências de utilização de biocombustíveis no transporte, o que demanda mais produção de etanol e biodiesel.
Para a China, produção de biocombustíveis é a responsável pelo aumento de preços globais dos alimentos
O pressuposto do texto era que é impossível elevar a produção de biocombustíveis e alimentos no mundo ao mesmo tempo. O Brasil não concorda, considerando que aumentou a produção de ambos.
O negociador brasileiro no encontro, diplomata Luis Balduíno Carneiro, reagiu dizendo que a política nacional de etanol não ia ser negociada no nível internacional e num plano de segurança alimentar que sequer está definido. O representante russo interveio para insistir no contrário, argumentando que o G-20 tentava exatamente uma coordenação para garantir segurança alimentar em nível global.
A China entrou na polêmica também apontando a produção de biocombustíveis como a responsável pelo aumento de preços dos alimentos e acusando-a de ser um problema para sua segurança alimentar.
O debate prosseguiu entre os representantes brasileiro e chinês em meio ao silêncio dos representantes dos Estados Unidos, país que tem sido o maior alvo de críticas, já que utiliza milho como matéria-prima para a produção de etanol. Atualmente, cerca de 40% da produção americana de milho é destinada ao biocombustível. Além da alimentação humana, o milho é a principal matéria-prima para a ração de aves, suínos e bovinos.
A Índia, que apoiava a posição chinesa, foi menos vocal. A Arábia Saudita, líder na exportação de petróleo, preferiu se calar.
Após o encontro do G-20, o ministro da Agricultura brasileiro, Wagner Rossi, observou, de maneira geral, que "não se pode obrigar os países a terem uma política determinada".
O secretário de Agricultura dos EUA, Tom Vilsack, prometeu apoio ao desenvolvimento da segunda geração de etanol à base de algas, dejetos e outros, o chamado etanol celulósico, para "compensar a instabilidade no mercado de energia, que ajuda na flutuação dos preços das commodities".
Os Estados Unidos, Brasil, Canadá terminaram bloqueando tentativas de recomendação de mudanças ou ajustes nas políticas de biocombustível.
O G-20 só diz ser preciso aprofundar os estudos sobre todos os aspectos e necessário examinar os desafios e as oportunidades da produção de biocombustíveis.
Enquanto defendia que o Brasil reduzisse a produção de etanol por razões de segurança alimentar global, a China se opôs a acabar com barreiras na exportação de alimentos sob o argumento de que a segurança dos chineses era mais importante que a do resto do mundo. A China disse que não podia se comprometer em exportar alimentos, porque antes de tudo tinha de garantir a comida dos próprios chineses.
A presidência francesa do G-20 explicou que o texto recomendava proibir só as restrições na exportação para fins emergenciais para atendimento a países em situação de insegurança alimentar aguda.
Para desbloquear a discussão, Pequim arrancou o "reconhecimento de que a responsabilidade primeira de cada país-membro é assegurar a segurança alimentar de sua própria população".
Fonte:|valoronline.com.br|
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