Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

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ICMS e Cofins 
 
Leia voto de Marco Aurélio sobre base de cálculo 
 
Faturamento é tudo aquilo resultante da venda de mercadorias ou prestação de serviços. Imposto, portanto, não é faturamento. O entendimento é do ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal, que votou pela exclusão do ICMS da base de cálculo da Cofins. 
 
Seu voto foi seguido por seis dos sete ministros que já votaram na questão. Apenas Eros Grau votou pela manutenção do imposto na base de cálculo. Votaram a favor da exclusão do imposto da base de cálculo da Cofins os ministros Marco Aurélio, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Carlos Ayres Britto, Cezar Peluso e Sepúlveda Pertence. Ainda faltam se posicionar os ministros Gilmar Mendes (que pediu vista), Celso de Mello, Ellen Gracie e Joaquim Barbosa. 
 
Leia a íntegra do voto 
 
TRIBUNAL PLENO 
 
RECURSO EXTRAORDINÁRIO 240.785-2 MINAS GERAIS 
 
RELATOR : MIN. MARCO AURÉLIO 
 
RECORRENTE : AUTO AMERICANO S/A DISTRIBUIDOR DE PEÇAS 
 
ADVOGADO : ROQUE ANTONIO CARRAZZA 
 
ADVOGADOS : RAQUEL CRISTINA RIBEIRO NOVAIS E OUTROS 
 
RECORRIDA : UNIÃO 
 
ADVOGADA : PFN - ELYADIR FERREIRA BORGES 
 
R E L A T Ó R I O 
 
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO - O recurso extraordinário foi interposto, com alegada base na alínea “a” do permissivo constitucional, contra acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região que implicou a manutenção de entendimento sufragado em sentença, no sentido da harmonia da contribuição prevista na Lei Complementar nº 70/91 com a Carta (folha 88 a 90). 
 
Exsurgiram sucessivos embargos de declaração, nos quais a contribuinte pretendeu ver examinado o pedido sucessivo formulado na ação, relativo à exclusão da base de cálculo da Cofins do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços. Ambos foram desprovidos mediante os acórdãos de folhas 99 a 101 e 115 a 118. O Colegiado consignou ter sido a matéria amplamente analisada e discutida no âmbito desta Corte quando do julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 1-1/DF, “inclusive no que tange à previsão de se incluir o ICMS na base de cálculo do tributo, consoante disposto no artigo 2º da Lei Complementar nº 70/91, lei esta, reafirme-se, cuja constitucionalidade foi declarada e que, por força do artigo 102, § 2º, da Constituição Federal, não é mais passível de discussão por órgãos jurisdicionais ou administrativos” (folha 116). 
 
Nas razões do recurso, articula-se com a ofensa ao artigo 195, inciso I, do Diploma Maior, insistindo-se na inconstitucionalidade do artigo 2º, parágrafo único, da citada lei complementar, no que autorizada a inclusão do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços na base de cálculo da Cofins, questão que não teria sido apreciada na ação declaratória de constitucionalidade. Salienta-se que se desvirtuou o conceito técnico de faturamento, ao incluir-se o referido tributo na base de cálculo. Noutro passo, assevera-se que, acaso esta Corte conclua pela falta de prequestionamento, deverá, antes, declarar a nulidade do julgado por ofensa aos princípios da ampla defesa e do devido processo legal (incisos LIV e LV do rol das garantias constitucionais), em face da recusa do Tribunal de origem de analisar a controvérsia (folha 120 a 134). 
 
A União apresentou as contra-razões de folha 137 a 140, ressaltando o envolvimento de matéria legal e a harmonia da conclusão adotada com a “jurisprudência de nossos Tribunais”. 
 
O Juízo primeiro de admissibilidade disse da natureza infraconstitucional da discussão (folha 140), decorrendo o processamento do recurso do provimento dado a agravo, oportunidade na qual consignei: 
 
Quando do julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 1, o Relator, ministro Moreira Alves, apontou para o envolvimento, na espécie, apenas dos artigos 1º, 2º, 9º, 10 e 13 da Lei Complementar nº 70, de 30 de dezembro de 1991. Por isso mesmo, não foi objeto de deslinde a circunstância de o artigo 2º, parágrafo único, da mencionada lei englobar, na base do cálculo da COFINS, o ICMS. A referência feita no voto do ministro Sepúlveda Pertence ganhou contornos de simples opinião de Sua Excelência a respeito da matéria, no que, aludindo a memoriais distribuídos, afirmou estar a definição de faturamento no âmbito da legislação infraconstitucional. 
 
Confira-se com o acórdão publicado na Revista Trimestral de Jurisprudência nº 156, página 722 a 755. Por outro lado, o tema está a merecer o crivo de Colegiado desta Corte, definindo-se o alcance do inciso I do artigo 195 da Constituição Federal. 
 
A Procuradoria Geral da República emitiu o parecer de folha 166 a 169, preconizando o não-conhecimento do recurso. 
 
É o relatório. 
 
V O T O 
 
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO (RELATOR) – Na interposição deste recurso, foram observados os pressupostos de recorribilidade. Os documentos de folhas 33 e 135 revelam a regularidade da representação processual e do preparo. A recorrente indicou o permissivo constitucional à folha 120, nos termos do artigo 321 do Regimento Interno da Corte. Quanto à oportunidade, o acórdão proferido na apelação restou publicado no órgão oficial de imprensa do dia 27 de setembro de 1994 (folha 91), terça-feira. A recorrente protocolou embargos de declaração em 4 de outubro de 1994 (folha 92), terça-feira, já que o dia 3, segunda-feira, foi feriado forense. As conclusões do acórdão prolatado nos embargos foram veiculadas no Diário da Justiça de 23 de maio de 1995 (folha 102), terça-feira. Em 29 imediato, segunda-feira, a recorrente interpôs novos embargos de declaração (folha 104), sendo que o acórdão daí resultante foi publicado no Diário da Justiça de 22 de agosto de 1995 (folha 119), terça-feira. Protocolou-se o extraordinário em seguinte (folha 120), segunda-feira. Portanto, exsurge a tempestividade deste recurso, considerada a interrupção instituída pela Lei nº 8.950/94, que deu nova redação ao artigo 538 do Código de Processo Civil. Resta examinar o específico, ou seja, a violência ao artigo 195, inciso I, da Constituição Federal. 
 
Sob o ângulo do prequestionamento, não procede o óbice apontado pela Procuradoria Geral da República. Se é certo que o acórdão inicialmente prolatado mostrou-se de simplicidade franciscana, apenas consignando que esta Corte assentou a constitucionalidade da Cofins, isso ao apreciar a Ação Declaratória nº 1-1/DF (folha 88 a 90), não menos correto é que a recorrente, atenta ao passo que se avizinhava, no sentido de adentrar a sede extraordinária, protocolou os embargos declaratórios de folha 92 à 94, reclamando manifestação sobre a inconstitucionalidade de incluir-se, na base de incidência da Cofins, o ICMS (folha 92 a 94). 
 
Pois bem, analisando estes embargos, o Colegiado concluiu que seria de se presumir o exame do tema no julgamento da declaratória de constitucionalidade, aludindo à eficácia vinculante do pronunciamento. Já aqui entendeu, portanto, a Turma julgadora pela inexistência da pecha quanto à inclusão combatida (folha 99 a 101). Mesmo assim, voltou a empresa a protocolar novos embargos declaratórios, mais uma vez reclamando prequestionamento explícito do tema (folha 104 a 112). Aí, a Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, na forma do acórdão de folha 115 a 117, refutou a argüição de inconstitucionalidade, tudo a partir, é certo, da premissa de que assim o teria feito este Plenário ao apreciar a Declaratória nº 1. Portanto, tem-se como prequestionada a matéria. A defesa sustentada pela recorrente foi rechaçada pela Corte de origem, consagrando-se, destarte, a óptica de que a Cofins incide sobre o ICMS. Sob o ângulo do prequestionamento, exigir mais do que isso é adotar o fetichismo da forma, a utilização de formas sacramentais. A Corte já assentou que o prequestionamento, a encerrar o debate e a decisão prévios do tema jurígeno explorado, nas razões do recurso, como causa de pedir, a viabilizarem o cotejo, prescinde de referência a artigo, parágrafo, inciso e alínea – Recurso Extraordinário nº 128.519-2/DF. 
 
Também não vinga o óbice relativo ao envolvimento, na espécie, de interpretação de norma estritamente legal. O que sustenta a recorrente é que o decidido pela Corte de origem discrepa da tipologia do tributo, tal como prevista no artigo 195, inciso I, alínea “b”, da Constituição Federal, considerado o teor primitivo do preceito, ou seja, anterior à Emenda Constitucional nº 20/98, no que, na citada alínea, fez inserir como base de incidência da contribuição devida pelo empregador, juntamente com o faturamento, a receita, utilizando a adjuntiva “ou”. Há de se examinar, assim, se a conclusão a que chegou a Corte de origem, refutando a defesa sobre a inconstitucionalidade de ter-se a incidência do tributo sobre o ICMS, incluindo este no que se entende como faturamento, conflita, ou não, com o dispositivo constitucional. A tríplice incidência da contribuição para financiamento da previdência social, a cargo do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, foi prevista tendo em conta a folha dos salários, o faturamento e o lucro. As expressões utilizadas no inciso I do artigo 195 em comento hão de ser tomadas no sentido técnico consagrado pela doutrina e jurisprudencialmente. Por isso mesmo, esta Corte glosou a possibilidade de incidência da contribuição, na redação primitiva da Carta, sobre o que pago àqueles que não mantinham vínculo empregatício com a empresa, emprestando, assim, ao vocábulo “salários”, o sentido técnico-jurídico, ou seja, de remuneração feita com base no contrato de trabalho – Recurso Extraordinário nº 128.519-2/DF. Jamais imaginou-se ter a referência à folha de salários como a apanhar, por exemplo, os acessórios, os encargos ditos trabalhistas resultantes do pagamento efetuado. Óptica diversa não pode ser emprestada ao preceito constitucional, revelador da incidência sobre o faturamento. Este decorre, em si, de um negócio jurídico, de uma operação, importando, por tal motivo, o que percebido por aquele que a realiza, considerada a venda de mercadoria ou mesmo a prestação de serviços. A base de cálculo da Cofins não pode extravasar, desse modo, sob o ângulo do faturamento, o valor do negócio, ou seja, a parcela percebida com a operação mercantil ou similar. O conceito de faturamento diz com riqueza própria, quantia que tem ingresso nos cofres de quem procede à venda de mercadorias ou à prestação dos serviços, implicando, por isso mesmo, o envolvimento de noções próprias ao que se entende como receita bruta. Descabe assentar que os contribuintes da Cofins faturam, em si, o ICMS. O valor deste revela, isto sim, um desembolso a beneficiar a entidade de direito público que tem a competência para cobrá-lo. A conclusão a que chegou a Corte de origem, a partir de premissa errônea, importa na incidência do tributo que é a Cofins, não sobre o faturamento, mas sobre outro tributo já agora da competência de unidade da Federação. 
 
No caso dos autos, muito embora com a transferência do ônus para o contribuinte, ter-se-á, a prevalecer o que decidido, a incidência da Cofins sobre o ICMS, ou seja, a incidência de contribuição sobre imposto, quando a própria Lei Complementar nº 70/91, fiel à dicção constitucional, afastou a possibilidade de incluir-se, na base de incidência da Cofins, o valor devido a título de IPI. Difícil é conceber a existência de tributo sem que se tenha uma vantagem, ainda que mediata, para o contribuinte, o que se dirá quanto a um ônus, como é o ônus fiscal atinente ao ICMS. O valor correspondente a este último não tem a natureza de faturamento. Não pode, então, servir à incidência da Cofins, pois não revela medida de riqueza apanhada pela expressão contida no preceito da alínea “b” do inciso I do artigo 195 da Constituição Federal. Cumpre ter presente a advertência do ministro Luiz Gallotti, em voto proferido no Recurso Extraordinário nº 71.758: “se a lei pudesse chamar de compra e venda o que não é compra, de exportação o que não é exportação, de renda o que não é renda, ruiria todo o sistema tributário inscrito na Constituição” - RTJ 66/165. 
 
Conforme salientado pela melhor doutrina, “a Cofins só pode incidir sobre o faturamento que, conforme visto, é o somatório dos valores das operações negociais realizadas”. A contrário sensu, qualquer valor diverso deste não pode ser inserido na base de cálculo da Cofins. Há de se atentar para o princípio da razoabilidade, pressupondo-se que o texto constitucional mostre-se fiel, no emprego de institutos, de expressões e de vocábulos, ao sentido próprio que eles possuem, tendo em vista o que assentado pela doutrina e pela jurisprudência. 
 
Por isso mesmo, o artigo 110 do Código Tributário Nacional conta com regra que, para mim, surge simplesmente pedagógica, com sentido didático, a revelar que: 
 
A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios para definir ou limitar competências tributárias. 
 
Da mesma forma que esta Corte excluiu a possibilidade de ter-se, na expressão “folha de salários”, a inclusão do que satisfeito a administradores, autônomos e avulsos, não pode, com razão maior, entender que a expressão “faturamento” envolve, em si, ônus fiscal, como é o relativo ao ICMS, sob pena de desprezar-se o modelo constitucional, adentrando-se a seara imprópria da exigência da contribuição, relativamente a valor que não passa a integrar o patrimônio do alienante quer de mercadoria, quer de serviço, como é o relativo ao ICMS. Se alguém fatura ICMS, esse alguém é o Estado e não o vendedor da mercadoria. Admitir o contrário é querer, como salientado por Hugo de Brito Machado em artigo publicado sob o título “Cofins - Ampliação da base de cálculo e compensação do aumento de alíquota”, em “CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS – PROBLEMAS JURÍDICOS”, que a lei ordinária redefina conceitos utilizados por norma constitucional, alterando, assim, a Lei Maior e com isso afastando a supremacia que lhe é própria. Conforme previsto no preceito constitucional em comento, a base de cálculo é única e diz respeito ao que faturado, ao valor da mercadoria ou do serviço, não englobando, por isso mesmo, parcela diversa. Olvidar os parâmetros próprios ao instituto, que é o faturamento, implica manipulação geradora de insegurança e, mais do que isso, a duplicidade de ônus fiscal a um só título, a cobrança da contribuição sem ingresso efetivo de qualquer valor, a cobrança considerado, isso sim, um desembolso. 
 
Por tais razões, conheço deste recurso extraordinário e o provejo para, reformando o acórdão proferido pela Corte de origem, julgar parcialmente procedente o pedido formulado na ação declaratória intentada, assentando que não se inclui na base de cálculo da contribuição, considerado o faturamento, o valor correspondente ao ICMS. Com isso, inverto os ônus da sucumbência, tais como fixados na sentença prolatada. 
 
Revista Consultor Jurídico,

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