Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

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Inventário de Artes - Mãos Que Fazem História

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Para o livro, 243 artesãs foram entrevistadas por todo o Ceará
MARÍLIA CAMELO
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Técnicas diversas, utilizadas por artistas tradicionais do estado
MARÍLIA CAMELO/ALEX COSTA
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As técnicas foram mapeadas por equipe do Diário do Nordeste
MARÍLIA CAMELO/ALEX COSTA
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Equipe do Diário do Nordeste
MARÍLIA CAMELO/ALEX COSTA

Premiada série de reportagens do Diário do Nordeste, "Mãos que fazem história" vira livro

Fazer um trabalho realmente inspirador exige, além do comprometimento, paixão. Não por acaso, é esse o sentimento que salta das páginas de "Mãos que fazem história - A vida e a obra de artesãs cearenses", livro originado da série de reportagens homônima publicada ao longo de 2010 pelo Diário do Nordeste. O lançamento será hoje, às 19 horas, na Livraria Cultura.

Seja pelos textos das autoras, as jornalistas Germana Cabral e Cristina Pioner (da equipe da revista Siará), pelas imagens das fotojornalistas Marília Camelo e Patrícia Araújo ou pelos depoimentos colhidos, fica claro o envolvimento da equipe com o tema, ao discorrerem sobre as lembranças das viagens e as conversas com as centenas de mulheres que reproduzem a riqueza do Ceará em barro, rendas, fibras e outros materiais.

Embora fosse um desejo antigo de Germana, à época editora do extinto Eva (suplemento feminino do Diário do Nordeste), o projeto concretizou-se a partir da realização de uma matéria com as crocheteiras de Jericoacoara, publicada no caderno em 2008. O resultado levou o diretor editor do Diário, Ildefonso Rodrigues, a sugerir uma expansão da proposta - visitar todas as regiões do Ceará para traçar um perfil de artesãs atuantes em diferentes tipologias. "Escolhemos mulheres porque a série era destinada ao Eva e, também, porque precisávamos delimitar nosso universo de personagens", explica Germana.

O objetivo, no entanto, era ir além das peças de artesanato e explorar as histórias de vida de quem as fazia. "Vemos os produtos em evidência, mas nem sempre sabemos quem está por trás deles. Então o propósito era mapear essas mulheres, contar de onde são, como vivem, seus sonhos e frustrações", detalha Cristina Pioner.

Tal direcionamento torna "Mãos que fazem história" um trabalho pioneiro. "Conheço importantes livros que traçam um perfil do artesanato cearense, a exemplo de ´Mãos preciosas - O artesanato do Ceará´, de Oswald Barroso, e ´Ceará feito à mão: artesanato e arte popular´, de Dodora Guimarães e Gilmar de Carvalho. Mas acredito que trilhamos caminhos diferentes, ao optarmos por não só mostrar as obras, mas contarmos a história dessas personagens e torná-las protagonistas", ressalta Germana Cabral.

Etnografia

O ineditismo do projeto também é ressaltado por Ildefonso Rodrigues. "É um trabalho etnográfico, que vai além do jornalismo, ao evidenciar as mulheres que fazem o artesanato cearense e contar suas histórias. Foi necessário quase um ano de pesquisa e apuração. O resultado ficou belíssimo", comemora o diretor-editor.

Ao todo, a série de reportagens teve 243 mulheres entrevistadas, com idade entre 8 e 94 anos (algumas, já falecidas). O projeto incluiu dez roteiros e 71 cidades visitadas, em todas as regiões do Ceará, somando mais de 11 mil quilômetros ao longo de 65 dias. As viagens iniciaram em abril de 2009, com destino ao litoral leste, e foram finalizadas em outubro do mesmo ano.

O material apurado foi publicado em oito cadernos quinzenais, de março a junho de 2010, divididos por tipologias - barro, rendas (bilro, labirinto e filé), linhas (bordado e crochê), fibras (como as palhas de carnaúba e de milho, o sisal etc), tecidos (bonecas de pano, colchas de patchwork, peças em fuxicos, dentre outros artigos feitos, principalmente, com refugo de indústrias), miscelânea (tipologias variadas), indígena e redes.

Para o livro, que tem prefácio do artista plástico e diretor-curador do Museu Afro Brasil, Emanoel Araújo, foram, selecionadas 150 artesãs da série. A publicação foi realizada via Lei de Incentivo à Cultura, do Ministério da Cultura (MinC), com patrocínio das empresas Nacional Gás, Banco do Nordeste e Coelce e apoio da Fundação Edson Queiroz - Universidade de Fortaleza.

Além dos editores e das fotojornalistas, a equipe contou com o designer Eduardo Freire (responsável pelo projeto gráfico) e a diagramadora Adriana Rodrigues, além dos seis motoristas que enfrentaram horas de estrada. "Percebemos que o material renderia um livro ainda durante a produção da série, tamanha era a qualidade dos cadernos", recorda Ildefonso

Na fase de pesquisa, foram utilizadas indicações do Centro de Artesanato do Ceará (Ceart) e do Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae-CE). Várias personagens, no entanto, foram descobertas ao longo das viagens ou em feiras das cidades visitadas. "Fizemos muitos contatos antes de partir, especialmente de artesãs vinculadas a associações ou grupos. Mas, em alguns lugares, não tínhamos nenhuma informação. Foi um garimpo mesmo", recorda Cristina Pioner.

"Tivemos dificuldade de comunicação com as artesãs que moravam na zona rural. Muitas até já têm celular, mas quase sempre ficavam fora das áreas de cobertura. O jeito era pegar a estrada e procurá-las pessoalmente. Várias vezes o carro da reportagem não conseguia chegar. Enfrentamos estradas esburacadas, quase intransitáveis no período das chuvas ou cheias de poeira na estiagem. Subimos e descemos serras, andamos por dunas, abrimos cancelas, ficamos no prego, pegamos carona em motocicletas", complementa Germana.

Emoção

Segundo as jornalistas, a maioria das artesãs demonstrava muito interesse em recebê-las. "Algumas gritavam quando a gente chegava, sem acreditar que era verdade, ´minhas amigas disseram que era trote´, falavam", conta Cristina.

A experiência, segundo a jornalista, era intensa. "Muitas choravam ao contar suas histórias. Lembro de uma que aprendeu a bordar quando foi presa política. Disse que o bordado a tirara da depressão. Em outra ocasião, uma índia que faz tratamento contra a dependência do álcool falou sobre a força que o artesanato dá. Por isso as peças são tão carregadas de emoção", ressalta Cristina.

Germana também lembra uma lição aprendida. "Estávamos nos despedindo de dona Maria de Lourdes Cândido, em Juazeiro, quando Patrícia, sem querer, quebrou uma peça. Ao ver a aflição da nossa fotógrafa, Maria de Lourdes tratou de acalmá-la: ´minha filha, não se preocupe. Isso faz parte da vida. Até o ser humano se quebra, quanto mais uma peça de barro´", recorda a jornalista. O encontro com as irmãs de Várzea Alegre, no Sítio Mocotó (Rosinha, Ceilda e Cileide - esta última, falecida em fevereiro deste ano), portadoras de deficiência física, é outro exemplo citado pela autora. "Elas conseguiram, fazendo redes de dormir, uma fonte de renda não só para a família, como para a comunidade"

Já a fotógrafa Marília destaca a entrevista com Dona Branca, mestra ceramista respeitada do município de Ipu. "É pessoa encantadora, apesar dos problemas ela não fala da vida com pesar. Pelo contrário, surpreende seu amor pela vida, pela família e pelo ofício", reconhece.

A série de reportagens ganhou quatro prêmios (Américo Barreira, da Associação Cearense de Imprensa; Prêmio Embratel, na categoria Regional; Prêmio do Banco do Nordeste e Prêmio do Sebrae). Ainda, a verdadeira recompensa para a equipe, dizem as jornalistas, foi o conjunto de histórias registradas.

A partir delas, fica o desafio para o Ceará de cuidar melhor de seus artesãos, muitos desafiados diariamente frente ao apurado mirrado com suas peças. "Salvo raras exceções, eles ainda são mal remunerados. Talvez por essa situação não encontramos muitos jovens envolvidos com o artesanato", observa Germana.

Para a jornalista, apesar da intensificação da cadeia produtiva promovida pelos órgãos oficiais nas últimas três décadas, ainda falta muito a ser feito. "Um grave problema persiste na figura do atravessador, que existe por conta da incapacidade das artesãs de desenvolverem seu potencial empreendedor. É preciso formação mais direcionada e financiamento", avalia.

A responsabilidade, no entanto, precisa ser dividida com o público, "que pode dar preferência a um produto, que pode ser mais caro, mas com valores incomparáveis", explica Germana. "Arquitetos e designers também são fundamentais nesse processo".

Mais informações:

Lançamento do livro "Mãos que fazem história"
Livraria Cultura (Av. Dom Luís, 1010, Aldeota, shopping Varanda Mall). Contato: (85) 4008.0800

Fonte:|http://diariodonordeste.globo.com/materia.asp?codigo=1111510

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