Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

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O desafio do desenvolvimento sustentável no Século 21 -Mercado Ético

O desafio do desenvolvimento sustentável no Século 21


 

Efraim Neto, especial para o CBJA

O debate urgente sobre desenvolvimento, economia e meio ambiente tem encontro marcado em 2012 no Brasil. O país sediará a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, maior reunião da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre as agendas, compromissos e diretrizes em torno de um novo padrão de relação entre Governança, Economia Verde e Sociedade Civil.

Quais são os novos desafios que o Século 21 colocados frente aos Estados, às empresas, aos trabalhadores e à sociedade? Estaríamos preparados para agir e proporcionar um mundo mais justo e reduzir as desigualdades? Nessa entrevista exclusiva, o economista e sociólogo Ignacy Sachs, que ajudou a formatar e organizar a Rio92, apresenta as linhas gerais de uma proposta que pode ser o elo entre forças e agendas ainda desencontradas e sugere soluções para a crise que acomete a todos.

CBJA - Considerando a questão do desenvolvimento sustentável, o estabelecimento de um novo planejamento é um caminho ou uma necessidade?

Sachs - Somos a única espécie com capacidade de pensar um cenário alternativo para o futuro. Um grande economista polonês, mundialmente reconhecido, Michal Kalecki, definiu o planejamento assim: “planejar é pensar adiante”. Portanto, temos que pensar quais são as possíveis consequências, caso a política continue sem mudança, bem como quais mudanças podem gerar desfechos distintos dessa primeira projeção de referência. Planejamento passa por um diálogo entre os principais protagonistas, um diálogo quadripartite.

CBJA - A descaracterização do planejamento passa pela má gestão do Estado?

Sachs – O descrédito atual do planejamento se deve a diversos fatores. Ainda sofremos as consequências da inclusão da União Soviética e a forte ofensiva neoliberal que existiu por conta disso. Não estou aqui advogando pela volta pura e simples do planejamento autoritário que prevaleceu no passado. Estou advogando pela volta do planejamento através de uma análise crítica das experiências do passado e da inclusão de conceitos como a pegada ecológica nessa nova forma de organização. O trabalho decente também deve ser recolocado na metodologia do planejamento.

CBJA - A ideia do PIB como o maior instrumento para mensurar o desenvolvimento é ultrapassada?

Sachs – O PIB é um indicador extremamente importante na mão do planejador, mas há outros indicadores que deveriam ser considerados. O problema é que não incluímos mais indicadores porque acompanhá-los fica extremamente pesado, difícil de ser realizado em tempo hábil. Acredito que teremos que continuar a mensurar o PIB, a sua distribuição, mas precisaremos introduzir indicadores sociais sobre a geração de oportunidades de trabalho decente. É necessário, também, incluir critérios ambientais, pois uma questão é acelerar o crescimento do PIB através de uma apropriação destrutiva dos recursos naturais, o que pode render um resultado positivo durante um, dois ou três anos, mas depois a conta a se pagar é enorme.

CBJA - Qual alternativa o senhor apontaria como possibilidade para modificar o nosso padrão de produção e consumo?

Sachs – Precisamos definir a postura do planejador como a postura de alguém que se rege por um voluntarismo responsável, ou seja, que quer mudar as coisas, mas que leve em conta que não é o mestre da natureza. Esse debate, curiosamente, apareceu fortemente na filosofia do século 17 com o grande filósofo francês Descartes, que dizia que somos mestres da natureza, o que não corresponde, a meu ver, à realidade. Já Blaise Pascal, conclamava que os homens devem atuar como cânhamo pensante, ou seja, aquela planta que se curva ao vento, mas que não fica unicamente numa postura reativa porque esse cânhamo deve ter posturas proativas e não unicamente reativas. Acredito que este debate filosófico está por trás do que estamos discutindo hoje.

CBJA - O que falta para a cooperação técnico-científica e para a transferência de tecnologia?

Sachs – Precisamos repensar a geografia das cooperações científicas e técnicas no que diz respeito ao aproveitamento dos recursos. Para tanto, temos que tomar como base o bioma. Você faz uma pesquisa no trópico úmido, outra no semiárido, outra na savana e no cerrado, e assim por diante. Acredito que tenhamos que reconstruir a cooperação científica e técnica usando os biomas como a unidade geográfica. Devemos, portanto, comparar com o que é comparável, ou seja, acarear a situação das populações da floresta amazônica com as do Congo e da Indonésia, e não comparar as características dos habitantes da floresta tropical úmida com os habitantes do semiárido.

CBJA - De que maneira seria possível instituir esse modelo?

Sachs – Não seria muito difícil instituir isso, até porque as instituições já estão consolidadas. Precisamos dar conta do fato de que o potencial similar dos recursos naturais é um ponto de partida para definir a estratégia de desenvolvimento socioeconômico e ambientalmente responsável. É, portanto, extremamente interessante começarmos a analisar como as condições naturais semelhantes e os diferentes povos chegam a uma proposta concreta. Com a análise de onde vêm as diferenças é possível discutir quais sãos as experiências que merecem ser partilhadas, quais as tecnologias devem ser aproveitadas. Acredito muito nas Nações Unidas como indutora dessas novas redes de cooperação técnica, baseadas numa filosofia comum.

CBJA – O que mudou da Eco92 para a Rio+20?

Sachs – Acredito que os futuros historiadores vão dizer que a Eco92 aconteceu na contra mão da história porque era o momento de inclusão da União Soviética e, também, o momento em que o neoliberalismo estava na crista da onda. Nessa oportunidade as propostas que precisavam de um protagonismo maior dos Estados ficaram um pouco no ar. Hoje, é muito difícil continuar dizendo que os mercados sabem o que é melhor, que os mercados podem se autogovernar. A crise, portanto, nos permite recolocar com força a ideia de que as soluções passam por estratégias a longo prazo nas quais o protagonismo do Estado desenvolvimentista é muito importante. A Rio+20 é o momento para um diálogo quadripartite onde os Estados, os empresários, os trabalhadores e a sociedade civil têm a oportunidade de organizar uma nova sociedade.

CBJA - Qual seria o desfecho ideal para a Rio+20?

Sachs – Acredito que a Rio+20 deveria ser, sobretudo, uma conferência que decida um roteiro, ou seja, um caminho a ser seguido. Para mim, um roteiro ideal seria pedir aos países membros das Nações Unidas que preparem planos de desenvolvimento includentes e sustentáveis a longo prazo, de maneira que esses planos possam ser colocados na mesa em dois ou três anos para que se inicie um trabalho de coordená-los e articulá-los gerando o máximo de sinergias positivas a partir da eliminação dos embates.

CBJA - Como isso seria viável?

Sachs – Para que essas questões possam sair do campo do debate, é preciso recursos. Então, em paralelo, seria necessário criar um grande fundo internacional de desenvolvimento includente e sustentável que pudesse ser financiado da seguinte maneira. Primeiro, retomar a velha promessa de que os países desenvolvidos devem destinar 1% do seu PIB para o desenvolvimento dos menos desenvolvidos; promessa não cumprida até hoje. Segundo, estabelecer uma taxa sobre o carbono. Se queremos caminhar para soluções de baixo carbono para evitar o aquecimento global, a taxa será um instrumento importante. Terceiro, implementar a velha proposta, conhecida como Taxa Tobin sobre as transações financeiras. A essas propostas, eu agregaria mais uma: estabelecer pedágios sobre os oceanos e os ares, que fazem parte do patrimônio comum da humanidade, e sobre cada viagem de avião teríamos uma sobretaxa, bem como em cada frete ou viagem de navio

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