Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

O desperdício e o reúso da água na indústria

Fonte:|meiofiltrante.com.br|

Arno Rothbarth



Nos últimos anos temos observado uma preocupação ambiental
especificamente com o reúso, ou a recuperação da água nas indústrias.
Até mesmo o “fechamento de circuito” virou assunto predileto em
congressos e em artigos técnicos. A reutilização da água dos circuitos
de processo industrial é bem aceita e varia de acordo com os processos
aplicados na indústria. A água utilizada nas indústrias tem uma
peculiaridade que é ser, ao mesmo tempo, insumo e produto. Entretanto, o
maior problema, sob o ponto de vista econômico e ecológico, não está no
reúso ou não da água, mas no desperdício que ocorre nas instalações
industriais. Neste artigo vamos discorrer sobre as origens do
desperdício e os métodos aplicados para evitá-lo.

Água: insumo e produto
Em julho de 2000, o governo brasileiro criou a Agência Nacional de
Águas, que tem como missão implementar e coordenar a gestão
compartilhada e integrada dos recursos hídricos e regular o acesso a
água, promovendo o seu uso sustentável em benefício da atual e das
futuras gerações.
Trata-se de um órgão regulador criado para fazer aquilo que outros
órgãos de diferentes ministérios deveriam fazer. Apesar de ser uma
autarquia, sofre a ingerência direta do ministério do Meio Ambiente e
principalmente do IBAMA. Depois da criação desta agência, foram
alterados alguns procedimentos para o gerenciamento dos recursos
hídricos, classificando os principais consumidores deste insumo
insubstituível para a vida na terra. Uma das ações deste órgão foi a
implantação (embora tímida) da cobrança pelo uso da água; captação, uso e
despejo final do efluente.
Considerando a água como um insumo, devemos tratá-la de forma mais
racional possível, tanto sob o ponto de vista econômico como ambiental.
No seu conceito mais amplo, insumo é a combinação de fatores de
produção, diretos e indiretos (mão-de-obra, energia, matéria-prima), que
entram na elaboração de certa quantidade de bens (produtos) ou
serviços.
Quando a água passa a ser o próprio produto, isto é, compõe em mais de
80% o bem final, o reúso passa a ter importância menor do que o
desperdício. A água como produto final pode ser exemplificada como:
perfumes, bebidas, molhos, gelo potável etc.
Neste artigo, vamos considerar a água como insumo e avaliar os
aspectos de desperdício, reúso e fechamento de circuito.



Minimizar o desperdício – atitude e método


A minimização do desperdício pode ser observada de dois modos: atitude e método. Mudança de atitude em relação aos procedimentos operacionais e
de manutenção é vital para a obtenção de resultados positivos no
controle de perdas no processo. A principal atitude é reconhecer que é
necessário e obrigatório conter estas perdas e agir para efetivar as
ações necessárias. O método, é a forma como vamos executar estas ações.
Na metade do século XX, os dois americanos Walter Shewarth e William
Deming desenvolveram o PDCA, ferramenta principal dos CCQ – Ciclo de
Controle da Qualidade e do CEP – Controle Estatístico do Processo. Até
os dias atuais, estes métodos de análise e avaliação de processos são
eficazes para resolução de vários problemas que envolvem o controle de
processo. Porém, na minha avaliação, quem deu a maior contribuição à
utilização do “método”, viveu no século XVII na França; Rene Descartes.
Em sua obra, “Discurso sobre o Método” (1637), Descartes resumiu o que
significa método:
Nunca aceite as coisas como verdadeiras, sem antes conhecer as
evidências;
Divida cada uma das dificuldades que tiveres que examinar, no maior
número possível de etapas necessárias para melhor as resolver;
Ordene os meus pensamentos, começando pelos objetivos mais simples e
mais fáceis de conhecer, para subir pouco a pouco, como por degraus, até
ao conhecimento dos mais complexos, e admitindo mesmo certa ordem entre
aqueles que não precedem naturalmente uns aos outros;
Questione seus próprios métodos; faça tantas revisões quantas
necessárias para ter certeza de que nada omitiu.
Estes passos levam à certeza de que os processos estão realmente sob
controle. Passe esta tarefa a cada um dos colaboradores da empresa,
treine-os e cobre os resultados, para ter a certeza de um resultados
positivo.

Onde encontrar o desperdício?
Seguindo a metodologia do PDCA, ou outra que utilize o raciocínio
lógico, é possível verificar as fases do processo que geram os
desperdícios.
A forma mais simples para implantar ações buscando a redução das
perdas é dividir os processos em subprocessos. Também é importante
determinar o quê, como e onde fazer as medições. Sem medir, é difícil
determinar as causas e as soluções dos problemas. Então, o que é
importante medir num processo para determinar causas, ou a origem dos
problemas:
Medir a entrada de água bruta na indústria;
Medir o volume de água tratada;
Medir todos os efluentes líquidos que deixam o processo;
Medir todos os efluentes líquidos que são devolvidos ao corpo
receptor;
Medir a água de processo (separe a água das utilidades);
Medir a água das “utilidades” (torres de resfriamento, vapor etc);
Realizar o balanço de massa do processo e determinar a água
incorporada ao produto final;
Medir a água de “make up” e a água de reúso;
Monitorar a qualidade da água (análises físico-químicas).

Reduzindo o desperdício –
Determinando as causas

Considerando que o resultado geral do processo é responsabilidade
compartilhada, as equipes de produção, manutenção, engenharia,
suprimentos e também a equipe com funções administrativas, devem
contribuir com os objetivos gerais da empresa. No âmbito da indústria,
as equipes de produção e de manutenção são as mais envolvidas no
resultado do processo. As pessoas envolvidas devem ter conhecimento
pleno de suas atividades e visão sistêmica do processo como um todo.
Assim, a equipe de manutenção deve conhecer o processo e a equipe do
processo deve conhecer e colaborar com a equipe de manutenção. Já o
pessoal de engenharia e suprimentos é responsável por definir “lay out”,
compra e instalação de equipamentos atualizados em termos de tecnologia
e qualidade.
Para combater o desperdício, é preciso conhecer as principais causas:

No projeto
(a) Especificações incorretas;
(b) Gestão de compras;
(c) Adaptações;
(d) Qualidade do equipamento ou do material;
(e) Lay out que dificulta a manutenção.

Na manutenção
(a) Programa inadequado de manutenção preventiva;
(b) Programa inadequado de manutenção corretiva;
(c) Equipe não especializada;
(d) Utilização de manutenção terceirizada;
(e) Falta de conhecimento do processo;
(f) Adaptação ou reaproveitamento de peças;
(g) Demora na solução de problemas com vazamentos.

Na operação
(a) Falta de treinamento no processo;
(b) Derrame de tanques;
(c) Vazamentos de todo o tipo (tubulação, bombas, válvulas etc.);
(d) Uso indevido da água do processo;
(e) Contaminação de água de processo;
(f) Falta de controle nas medições do processo;
(g) Informação sobre problemas de manutenção;
(h) Falta de comprometimento com os resultados.

Reduzindo o desperdício –
oportunidades para a redução

As oportunidades de redução dos desperdícios implicam basicamente em
três fatores:
Revisão do processo;
Viabilidade econômica;
Avaliação dos aspectos ambientais.
Na revisão do processo estão incluídas alterações de matérias-primas e
insumos, além das variáveis de processo, tais como vazão, concentração,
temperaturas, pressões etc. Na revisão do processo, pode ser exigida
alteração de “lay out”, de equipamentos, de instrumentação e automações.
Convoque a equipe de engenharia e manutenção para colaborar. Crie,
atualize, altere procedimentos e treine suas equipes, e sempre que
possível, provoque o “job rotation”, pois a percepção da “coisa nova”
ajuda a verificar os pontos fracos do sistema.
A viabilidade econômica, via de regra, define se as alterações são
viáveis ou não, e apresenta parâmetros de fundamental importância para
promover ou desencorajar as ações de redução do desperdício. Esta
avaliação sempre está baseada em custo e orçamento da produção.
Sempre que houver uma grande vantagem ambiental, principalmente na
reutilização da água e de outros insumos, incentive as ações contra o
desperdício. Geralmente, há uma confrontação entre as vantagens
ambientais e a viabilidade econômica. Junte todas as alternativas,
observe o cenário de oportunidades e coloque em prática o que trouxer
melhor resultado.

Reúso e fechamento de circuito
Fazendo a distinção entre estes dois procedimentos, no fechamento de
circuito (plant closure) busca-se a recuperação das águas de processo
até seu limite de utilização. O limite é estabelecido pelas
concentrações de materiais dissolvidos e em suspensão, e pelo custo de
retificação dos contaminantes.
O reúso de água, tem como prioridade a reutilização de água através de
critérios de qualidade, também limitado pelo uso harmonizado com as
exigências do processo. Nestes dois procedimentos, a determinação do
volume de água de reúso ou o controle do fechamento do circuito será
determinado por parâmetros como:
STD – sólidos totais dissolvidos;
SDI – silt density index;
LSI – índice de Langelier;
Potencial Zeta.
Na medida em que se reutiliza a água, o ciclo de concentração [CC] vai
aumentando e saturando esta água com vários tipos de ânions e cátions,
além de materiais orgânicos que produzem uma atividade microbiológica
nos sistemas.
[CC= água em circulação/água de reposição]: é uma relação da água em
processo com o “make up” de água fresca.
Muitos processos são sucessivos e interdependentes, quando outros, são
isolados, e o efluente de um subprocesso poderá ser o afluente de outro
subprocesso, resultando no final, o efluente geral do processo
industrial.
Para ambas alternativas, o processo de reutilização da água pode
acarretar em danos aos equipamentos provocando depósitos, incrustações,
corrosão etc. Para ficar bem claro, citamos como exemplo de reúso,
utilizar a água de “blow down” de uma torre de resfriamento para lavar a
cana de açúcar, toras de madeira, utilizar em sanitários etc. No
fechamento de circuito, a água é utilizada várias vezes no mesmo
processo ou subprocesso, até atingir os limites de concentração para
aquela utilidade. Usando o mesmo exemplo anterior, uma torre de
resfriamento pode utilizar a mesma água para enviar aos trocadores de
calor, até atingir o limite crítico de concentração de material
dissolvido. A partir deste limite, inicia-se a purga e o “make up” para
ajustar as concentrações. Tentativas de recuperação (tratamentos
físico-químicos) são possíveis, limitados ao custo deste, e ao impacto
ambiental provocado pelo descarte do material retido.

Conclusão
Ao longo de muitos anos de minha vida profissional, mais de 30,
assisti a implantação de bons e péssimos programas de redução de
desperdício nas indústrias brasileiras e estrangeiras. Quando se tratava
de desperdício de água, o mais comum era verificar a falta de interesse
de alguns empresários e gestores de processos industriais com a
economia de água, pois “havia água em abundância” e a questão ambiental
não era prioridade das empresas. Digo isso, pois auditei várias empresas
que sequer mediam e/ou monitoravam a água que entrava e saia do
processo. Um paradoxo neste contexto é que aonde a água é mais abundante
no Brasil é justamente na região norte, onde a industrialização é
incipiente. No sul e sudeste a escassez de água já afeta algumas regiões
mais industrializadas.
Quando fizemos o comentário sobre o PDCA e citamos W. Deming,
lembramos também de Juran, do TQM, TQC, 5S, Housekeeping e outros
programas de qualidade. Todas as técnicas que buscam a excelência do
processo são bem-vindas, mas não aposte tudo nelas. Evite os modismos,
por conta destas técnicas. Evite criar comitês para isso ou aquilo. Crie
“métodos”, mude de atitude, questione, estabeleça metas e objetivos.
Desperdício é dinheiro perdido, é recurso mal empregado, é o exemplo que
não deve ser seguido.

Engº Químico Arno Rothbarth
Engenheiro químico especialista em Utilidades e Cogeração, com 30 anos
de experiência em indústrias nacionais e internacionais. Atua nos
setores de Celulose & Papel e Agroindústria como consultor e
palestrante. É diretor técnico da RTH Consultoria Técnica Ltda
www.rthconsult.com.br


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