Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

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Na reunião com governadores, há pouca semanas, o ministro Guido Mantega apresentou proposta de unificação da alíquota interestadual do ICMS, que cairia dos atuais 12% e 7% para 4%, no prazo de oito anos. Trata-se de um passo na lenta caminhada para transformar a incidência desse imposto da origem para o destino, bem como de colocar um pouco de ordem na balbúrdia em que se transformou o ICMS, principalmente nas operações interesta­duais. Num arroubo de otimismo, o ministro da Fazenda declarou ser possível costurar um acordo com os governadores ainda este ano, de modo a permitir que a transição rumo à mencionada alíquota tenha início em 2013.

Além disso, o Executivo estuda modificações importantes na legislação do Cofins e, no âmbito legislativo, a Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do senado, com o apoio de especialistas, pre­para projeto de emenda constitucional que dispõe sobre as bases do federalismo fiscal do Brasil. Ou seja, a reforma tributária, embora fatiada, voltou à ordem do dia.

Neste artigo, procuro mostrar que uma reforma que efetivamen­te alivie o contribuinte do peso dos tributos e que tome o sistema tributário brasileiro mais simples, mais justo e, principalmente, meno s gerador de ineficiências na alo­cação dos recursos produtivos é sonho que dificilmente se tornará realidade. Vejamos por quê. A carga tributária de países com renda per capita semelhante à nos­sa (US$ 11.800, de acordo com o FMI, usando a metodologia da paridade do poder de compra) é mui­to inferior à brasileira. Costa Rica, Malásia, México, Uruguai, Turquia e África do Sul, por exemplo, arrecadam de 15% a 25% como proporção do PIB, ante 34% no Brasil.

Numa amostra que coletei, com cerca de 100 países excluindo as nações que há pouco mais de duas décadas ainda não faziam parte do mundo capitalista, bem como pequenas economias africanas e asiáticas sem nenhuma ex­pressão nota-se que a carga tributária é correlacionada positiva­mente com o nível de renda per capita e negativamente com seu grau de concentração. A razão para isso é praticamente intuitiva: é difícil arrecadar muito tributo quando a base de incidência é bai­xa e os indivíduos com capacidade contributiva representam parcela diminuta da população.
Na verdade, tal façanha só é possível com um sistema tributário como o brasileiro, em que o objetivo de maximizar a arrecadação desconsidera critérios como equidade, progressividade e eficiência econômica.

Para arrecadar tanto, dados o nível e a concentração da renda, é necessário concentrar a carga nos impostos indiretos, ou seja, aqueles cobrados nas atividades de produção e comercialização, que se incorporam aos custos (e aos preços) dos bens e serviços. Nenhum país no mundo, exceto o Brasil, arrecada tanto com esse ti­po de imposto. Nas economias de­senvolvidas, com cargas tributá­rias próximas à nossa, a maior par­cela da arrecadação é derivada dos impostos diretos (renda e patri­mônio), mais justos e com menor potencial para distorcer a aloca­ção eficiente dos recursos.

É essa ênfase excessiva nos im­postos indiretos que toma o siste­ma tributário brasileiro regressi­vo. Como a parcela mais pesada dos tributos está incorporada no preço dos bens e serviços, pagarão mais, como proporção de sua ren­da, aqueles que têm menor taxa de poupança, ou seja, os mais pobres.
A necessidade de arrecadar mui­to, sem a existência debase de inci­dência adequada, explica, por exemplo, a cobrança de alíquotas de ICMS desarrazoadas sobre energia e comunicação, que são insumos importantíssimos para o processo produtivo e serviços essenciais para o bem-estar dapopu- lação. Em alguns Estados, esse im­posto corresponde a cerca de 40% do custo do serviço prestado!

Cobra-se muito imposto no Bra­sil porque é necessário custear um Estado mastodôntico. E o Estado brasileiro é grande por suas raízes históricas, como nos mostra Raymundo Faoro em Os Donos do Poder e porque, desde a redemocratização, se construiu implicita­mente um pacto político favorá­vel ao aumento das transferências públicas ao setor privado (via prin­cipalmente aposentadorias e pro­gramas sociais). Foi um movimen­to compreensível, dadas as preca­riedades sociais do País. Mas esse arranjo gera consequências econô­micas indesejáveis, e a principal é o peso da carga tributária.
E não há indicações de que o pac­to será rompido no curto prazo. Ao contrário, hoje nenhuma força política relevante o questiona. Além disso, não se pode esquecer a reconhecida ineficiência da má­quina pública do País, ao mesmo tempo causa e conseqüência do in­chaço do Estado.

Além da questão macroeconô­mica acima discutida, há a grave distorção gerada pela estadualização do ICMS. Desconheço outro país do mundo onde um imposto sobre o valor agregado (IVA), co­mo é o ICMS, esteja sob a respon­sabilidade de entes federativos. Mesmo em países de sólida tradi­ção federativa, como a Alemanha, a cobrança e as normas que regem o IVA são nacionais, cabendo aos Estados (ou províncias) parcela do valor arrecadado. É como funciona o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) no Brasil, também um tributo sobre o valor agregado. Se o ICMS fosse nacional, as discussões sobre cobrança na origem ou no destino, alíquo­tas interestaduais e guerra fiscal não fariam sentido. Mas, infeliz­mente, vejo obstáculos políticos gigantescos para a criação do IVA nacional.

Do que foi dito aqui, não se deve concluir que não haja espaço para melhoras no sistema tributário brasileiro, especialmente median­te legislação infraconstitucional, menos penosa para ser aprovada. Mas não é bom ser tão otimista quanto o ministro Mantega, para não sofrer frustração. Sem a efeti­va redução do tamanho do Esta­do, uma verdadeira reforma tribu­tária, que corrija pelo menos a maior parte dos problemas acima mencionados, continuará na cate­goria dos mitos.

ARTIGO - Claudio Adilson Gonçalez

ECONOMISTA, DIRETOR-PRESIDENTE DA MCM CONSULTORES, FOI CONSUL­TOR DO BANCO MUNDIAL, SUBSECRE­TÁRIO DO TESOURO NACIONAL E CHEFE DA ASSESSORIA ECONÔMICA DO MINISTÉRIO DA FAZENDA
Fonte:http://www.senado.gov.br/noticias/opiniaopublica/inc/senamidia/notS...

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Comentário de Jorge Medeiros em 20 novembro 2012 às 8:39

Muito boa analise, mas, infelizmente não forças racionais nesse pais para mudar o status quo e modernizar o pais tributariamente.

As vantages e os ganhos seriam imensos para todos, mas há inteligencia e vontade politica para empreender tais reformas? Duvido.

Tudo só piora.

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