Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

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Produzir Tecido: Arte ou Ofício?

 

O valor da roupa está em quem à veste. Bem, até aí, nada de novo seria, afinal é o que sempre se espera; que as pessoas tenham seus valores próprios, em quaisquer circunstâncias, e que a sua vestimenta possa ser somente um adereço de aparência sem interferir na sua personalidade ou, mais fortemente, no seu caráter. Entretanto, essa premissa não se apresenta como verdadeira.

A roupa completa a auto-estima do indivíduo, precisa ser algo que o identifique unicamente. Por isso tanto vexame há quando, sobretudo numa festa, uma mulher observa que existe alguém com uma roupa igual a que ela está usando.

A vestimenta é a “persona”, a máscara que esconde ou que revela; que evidencia o lado luz ou que oculta o outro,  sombra. Através dela se pronuncia ou se omite; insinua-se ou se retraí.

Daí a extraordinária e fascinante “ab-reação” que é produzir o tecido. Quem irá vestir aquele pano, qual o modelo, curvas e costuras e ainda, quais efeitos ela deseja atingir. O olhar-se no espelho e enxergar o que se busca. A viradinha do trazeiro.

Há uma descarga emocional tão intensa nisso que o meu querido amigo e guru, Altamir Otoni de Carvalho comparava-o ao orgasmo solitário, somente quem já experimentou sabe que essa figura de linguagem tem enorme propriedade.  Nada há de mais emocionante do que se deparar com alguém usando uma roupa com tecido que você produziu. Por vezes chega a ser vexatório.

Certo dia, eu estava numa loja aguardando a vendedora me atender. Estava inerte, pensamento vazio, “quando de repente, não mais que de repente”, como disse o poeta, observei, ao meu lado, um sujeito com uma bermuda em tecido que havia sido produzido na Fábrica em que eu trabalhava. Minha reação foi instantânea. Fiquei admirando a peça, frente e atrás, se a junção das costuras casava com a estampa, os bolsos realçando a estrutura e tudo mais que acrescentava maior beleza ao produto fabril. Tudo me dava prazer, me fazia bem e amenizava o sacrifício que foi arranjar o fluxograma de produção, as dificuldades de atingir a qualidade do artigo, as idas e vindas para acertar as cores e suas nuances. Muito trabalho.

Mas ali estava a maior recompensa. O ciclo se fechava, a perfeição sublime da aliança formada pelo trabalho e seu fruto maior. Estava em tal êxtase que não percebi que minha atitude incomodou o indivíduo. Assustei-me quando fui inquirido:

- Oi, o quê que “tu” tá olhando, meu chapa? Perguntou o moço, irritado.

Levei um susto e, pelo olhar intimidador, senti que ele realmente não aprovava minha atitude, estava deduzindo algo além do que acontecia. O brilho dos meus olhos fez-lhe inferir e exteriorizar seus preconceitos. Refiz-me do susto e esclareci que eu admirava o tecido. Com a voz impostada, disse:

- Me desculpe, eu estava olhando a sua bermuda. Esse tecido aí fui eu que “fiz” na minha Fábrica.

De repente era o fiandeiro, o tecelão, o tintureiro, o estampador e o dono da Fábrica, não sei se o convenci, mas, o sorriso em meu lábio e meu olhar de soslaio estava me denunciando.

Produzir tecidos é isso, é encantamento e paixão. Não encontro muitos adjetivos. É sentimento puro apesar de todos os infortúnios, dificuldades e tensões. Experimentei na vida poucos prazeres que me dessem semelhante sensação.

Valeu a pena!

Sempre “vale a pena, se a vida não é pequena”, já o disse F. Pessoa. A minha vida se engrandeceu na Indústria Têxtil, oh, Minas Gerais!

Produzir tecidos é arte e ofício, pode acreditar.

 

José Carlos Dias

21 de abril de 2012

 

 

 

 

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