A Costura Perfeita tem recebido cartas de confeccionistas brasileiros questionando o motivo de tantas exigências e adequações às empresas nacionais com relação ao certificado ABVTEX, mas, enquanto isso, há uma enxurrada de vestuário importado vindo da China, Bangladesh, Índia, Camboja, entre outros, sem leis para coibirem a prática do trabalho escravo.
“Sabemos que nesses lugares as leis trabalhistas, quando existentes, são menos rigorosas que as nossas, sem contar que a carga tributária é muito menor, o que torna o produto muito atrativo. Mas vamos refletir: o que estamos analisando é a redução de custo ou a política social? Seria possível ter produtos com custos tão atrativos nesses lugares se lá houvesse as exigências que são expostas às empresas do nosso setor? Acredito que não. Quando as empresas adquirem produtos desses lugares, estão aceitando sua política social e dando força para sua continuidade. Seria uma ironia se não fosse a mais pura realidade; eles estão apoiando uma prática lá que aqui condenam” avalia Rubens Nunes, consultor da Megatech Cursos e Treinamentos. Ele acredita que a solução não seja fácil: “A maioria das exigências feitas a nossos confeccionistas já faz parte das leis existentes, que precisam ser cumpridas por todos. As demais seriam adequações possíveis e viáveis se os compradores não apertassem a margem de lucro das empresas, apresentando valores comparativos de produtos oriundos desses locais. A falta de uma política de preços, na qual não só os valores dos produtos sejam comparados, mas sim as condições como foram fabricados esses produtos, torna essa guerra desigual”.
LEGENDA: Rubens Nunes, consultor da Megatech Cursos e Treinamentos. FOTO: Divulgação
Nunes afirma que já existe uma certificação com normas internacionais, a AS 8000, que rege normas e procedimentos para garantir o cumprimento da responsabilidade social. A certificação SA 8000 aborda questões tais como trabalho escravo e infantil, saúde e segurança do trabalho, liberdade de associação e negociação coletiva, discriminação, práticas disciplinares, jornada de trabalho, remuneração e sistemas de gerenciamento. “Se as mesmas empresas que exigem a certificação da ABVTEX passarem a exigi-la dos fornecedores externos, pode ser que a concorrência comece a ficar mais interessante. Acredito muito no potencial profissional do brasileiro; se pudermos brigar de igual para igual, a história será outra”, avalia Nunes.
LEGENDA: Alcio Pittol, consultor em desenvolvimento de produto, produção, tempos e métodos, e redução de custos. FOTO: Divulgação
Alcio Pittol, consultor em desenvolvimento de produto, produção, tempos e métodos, e redução de custos, afirma que o Brasil é soberano da mesma forma que os demais países, ou seja, cada um possui suas legislações trabalhistas próprias. “A questão da enxurrada de vestuário vindo desses países deve-se ao fato de eles serem competitivos, ou seja, o tripé preço, prazo de entrega e qualidade atende às exigências do mercado nacional. A solução é simples: basta as empresas nacionais serem competitivas. Mas, na formação do custo de produção, não existe somente a questão do salário dos funcionários, mas outros encargos que têm impacto superior, como o custo das matérias-primas e os impostos. Com relação às matérias-primas, os países acima citados compram petróleo brasileiro e o transformam em tecido sintético, como poliéster e náilon, contudo o custo do tecido deles é muito menor que o nosso, mesmo com eles comprando nosso petróleo. O segundo ponto, que já é sabido de longa data, é que se deve fazer uma reforma nas leis tributárias para coibir a incidência dos impostos em cascata, ou seja, tributar várias vezes até chegar ao consumidor, e para isso o empresariado nacional deve exigir do Estado a votação do imposto único.”
Para Rubens Nunes, “o fato de internacionalizar o certificado nos moldes da ABVTEX é algo que entendo como possível e interessante, mas apenas trazer produtos com essa certificação concorrendo de forma igual com nossos produtos... isso, sim, eu gostaria de ver”.
LEGENDA: Eduardo Blatt, engenheiro têxtil, consultor de produção e confecção e sócio da PracticalTex. FOTO: Divulgação
Já Alcio Pittol e Eduardo Blatt, engenheiro têxtil, consultor de produção e confecção e sócio da PracticalTex, acreditam que essa é uma questão delicada, pois cada país é soberano, possui suas próprias leis trabalhistas, como acontece no Brasil. “Não acreditamos que os outros países venham a se sujeitar à certificação de outro país que diga o que é certo ou errado. A competitividade é a única saída, respeitando a livre concorrência de mercado, em que nosso país não feche as fronteiras e seja capaz até de exportar. Isso é possível, mas dependerá de muito planejamento e acordo entre as partes interessadas, que são os empresários e os governantes. As confecções brasileiras estão de mãos atadas frente a todas essas circunstâncias e vão sobrevivendo vendo os competidores ganhando cada dia mais mercado. Neste momento, torna-se necessária a união dos empresários e do governo com o sério propósito de reverter esse quadro fatídico.”
E o que elas acham disso?
A Lutestil está no mercado desde 1981, em São Paulo, e possui o certificado ABVTEX desde 10 de novembro de 2010. A confecção fez parte do projeto piloto da certificação. “Quando iniciou o projeto, a diretoria da Lutestil ficou preocupada, pois as exigências para aprovação eram muitas e não sabíamos o que poderia acontecer com o mercado brasileiro. Com o passar do tempo, passamos a compreender que colocaria todos os fornecedores em condições iguais, pois havia empresas parcialmente, e algumas totalmente, informais e, devido à informalidade, seus custos eram menores, com concorrência desleal”, comenta André Rogério Botura Zampol, diretor da empresa. Apesar dos benefícios da certificação, existe o outro lado da moeda. “Os custos de manter uma oficina certificada pela ABVTEX estão dificultando a permanência das empresas no mercado, devido a pagamentos como auditorias de qualificação, auditorias de manutenção anual, exigências de segurança e medicina do trabalho, entre outros”, revela Zampol.
LEGENDA: Fábrica da Lutestil, em São Paulo. FOTO: Divulgação.
Com relação à possibilidade de existir uma certificação ABVTEX para produtos estrangeiros, Zampol acredita que acabaria sendo contraditório, já que as empresas buscam o lucro, que é o que as mantém abertas. “A ABVTEX teria que respeitar as leis locais, cada país possui suas leis trabalhistas. Por exemplo, em uma recente visita à China, presenciamos que algumas empresas possuíam dormitórios para seus funcionários, que visitavam seus familiares uma vez a cada seis meses. As leis brasileiras jamais permitiriam, pois ligam a existência de dormitórios ao trabalho escravo”, diz Zampol, que afirma que uma certificação internacional por causa da ABVTEX beneficiaria as confecções brasileiras se as regras, imposições trabalhistas, impostos etc. fossem iguais às praticadas no Brasil, mas a realidade é outra no restante do mundo.
A Pele a Pelle, localizada em Guararapes, interior de São Paulo, atua há 22 anos no ramo de confecção de lingerie dia. Há 12 anos, a marca fornece para magazines e desde julho de 2012 possui o selo ABVTEX. Maria Fernanda de Souza Fuschini, responsável pelo departamento financeiro da empresa, acredita que é importantíssima a qualificação das empresas estrangeiras para produtos que entram no Brasil. “A concorrência internacional acaba sendo desleal quando se beneficia de mão de obra escrava, o que prejudica a indústria brasileira, que paga tantos impostos. Pensamos, sim, que as cobranças devem ser para todos, até porque todos os trabalhadores – brasileiros ou não – merecem ter condições dignas de trabalho.”
LEGENDA: Maria Fernanda de Souza Fuschini, da Pele a Pelle. FOTO: Arquivo Pessoal.
Combate ao trabalho escravo e exigências para importação
No dia 24 de maio, a Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) aprovou projeto que proíbe entidades ou empresas brasileiras ou com representação no Brasil de firmarem contratos com empresas que explorem trabalho degradante em outros países. O projeto (PLC 169/09) define como forma degradante de trabalho a que viola a dignidade da pessoa humana nos termos dos tratados internacionais ratificados pelo Brasil, como os trabalhos escravo e infantil, e cuja apuração tenha sido feita por organismos internacionais. A proposta evita o chamado dumping social, que dribla o rigor da legislação interna por meio da contratação de fornecedores e empresas no exterior que não estão sujeitos às mesmas leis e regras de proteção ao trabalho em seus países. O projeto ainda será analisado pela Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CRE) antes de ser votado pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ).
Saiba mais sobre a AS 8000
Lançada em 1997 pela Council on Economics Priorities Accreditation Agency (CEPAA), atualmente chamada Social Accountability International (SAI), organização não governamental norte-americana, a Social Accountability 8000 (AS 8000) é a primeira certificação de responsabilidade social para empresas com alcance global. Com base em normas internacionais sobre direitos humanos e no cumprimento da legislação local referente, a AS 8000 busca garantir direitos básicos dos trabalhadores envolvidos em processos produtivos. A norma é basicamente composta de nove requisitos:
Tendo como referência os padrões de gestão da qualidade ISO 9000 e de gestão ambiental ISO 14000, a AS 8000 segue estrutura que enfatiza a importância dos sistemas de gestão para a melhoria contínua.
Fonte: Wikipedia
http://www.costuraperfeita.com.br/edicao/26/materia/especial.html
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A maioria das empresas que pede a certificação as confecções, são as maiores importadoras de roupa.
Gostaria de saber se o Fisco federal e as autoridades aduaneiras pedem o certificado no momento da importação,carimbado , assinado e autorizado?
É mais uma bobagem brasileira que algum lobista intercedeu pra levar o seu e aprovar esta certificação contra indústrias que estão lutando pra dar a seus funcionários o café da manhã!
Quando você lê na Veja que o CEO da Estrela Brinquedos teve que esquecer que era uma industria e era na verdade um comerciante de brinquedos, fechou suas fabricas no Brasil e atualmente compra da China.
Pergunte a ele se quer voltar a fabricar no Brasil com a tributação, logística e produtividade que temos?
As confecções"Chinesas" tem este certificado ? e é exigido quando importamos ?
Penso que devemos esperar mais um pouco e quando o Decreto 8243 entrar em vigor criarmos uma Ong ou um grupo e fazer valer nossa voz( talvez possa ser : os SIT, os Sem Indústria Têxtil)
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