Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

Cansados da crise política e indignados com a ameaça de elevação de impostos,  os empresários passam a criticar publicamente a presidente Dilma

  • // Por: Gabriel Baldocchi e Paula Bezerra
Flávio Rocha, presidente da Riachuelo: “Eu não vejo condições de a Dilma liderar o processo de reconstrução”
Flávio Rocha, presidente da Riachuelo: “Eu não vejo condições de a Dilma liderar o processo de reconstrução” ( foto: João Castellano/Istoé)

Em carta aberta à presidente Dilma Rousseff, dois dias após a sua reeleição, em novembro do ano passado, o empresário Abilio Diniz destacava a urgência de se trabalhar para restituir a confiança do setor privado, de forma a destravar investimentos no País. “Agora é preciso transformar discurso em ação”, afirmava o texto, em referência ao trecho do discurso de vitória de Dilma que pregava união e diálogo. As palavras de Abilio soam mais atuais do que nunca. Os empresários cansaram da crise política e da inação do governo federal em relação ao rombo fiscal.

O atestado mais recente da desconfiança generalizada em relação ao Brasil foi dado com o rebaixamento da nota do País pela agência de classificação de risco Standard & Poor’s (S&P), na quarta-feira 9, que é uma espécie de selo de bom pagador. Sem vislumbrar uma saída e diante de um cenário econômico que tende a sangrar os resultados do setor privado, o empresariado começou a manifestar publicamente aquilo que só era comentado reservadamente: “Eu não vejo condições de a Dilma liderar o processo de reconstrução”, afirmou à DINHEIRO Flávio Rocha, dono da Riachuelo, uma das maiores redes de varejo de moda do País, e vice-presidente do Instituto para o Desenvolvimento do Varejo (IDV).

Por questões estratégicas, os homens de negócios costumam evitar criticar os governantes de plantão. Afinal de contas, é sempre bom ter portas abertas em Brasília. Quando declarações fortes são ditas publicamente, como agora, é porque o quadro se deteriorou de tal forma que a saída da presidente Dilma representaria, na ponta do lápis, mais ganhos do que perdas para o setor produtivo. “O rebaixamento do País é o maior retrocesso da economia dos últimos 20 anos”, afirma Ricardo Lacerda, sócio-fundador do BR Partners.

“É o retrato da falência operacional do governo.” Desde o início do ano, o governo enfrenta dificuldades para estruturar uma agenda de reformas que sinalize a retomada do crescimento. Há resistências no Congresso, na base aliada e desencontros dentro do próprio Executivo, consequência natural da falta de liderança e coordenação política no Palácio do Planalto. O vaivém de propostas e medidas preliminares, conhecidas como balões de ensaio, vem contribuindo para conturbar ainda mais o ambiente de negócios, prejudicando a previsibilidade dos cenários e a tomada de decisões.

O desentendimento interno ficou ainda mais evidente com o envio ao Congresso da proposta de Orçamento para 2016, com previsão de déficit, que deixou a impressão de que o governo “jogou a toalha” na batalha para acertar as contas públicas. “Com esse ato, o governo abriu mão de governar”, afirmaram, em nota conjunta, Paulo Skaf e Eduardo Eugenio Gouvêa Vieira, presidentes das federações da indústria de São Paulo (Fiesp) e do Rio de Janeiro (Firjan). “O governo faz escolhas erradas e quem perde é o Brasil”, complementou Skaf.

A proposta orçamentária acabou antecipando o rebaixamento da nota de crédito brasileira, antes previsto apenas para o próximo ano. A S&P citou a crise política e o déficit para recolocar o País na lista de países considerados especulativos para os investidores. Lisa Schineller, analista principal da S&P para o Brasil, não considerou as declarações posteriores de Dilma e Levy, que reafirmaram o compromisso com o ajuste fiscal. A perda do selo de bom pagador pelo Brasil reacendeu a agenda do impeachment defendida pela oposição.

No dia seguinte ao anúncio da agência, parlamentares favoráveis à saída da presidente, entre os quais figuram nomes da base aliada, promoveram um ato em defesa do impedimento e convocaram simpatizantes a assinar uma petição on-line. “A perda do grau de investimento do Brasil e a perspectiva de revisão negativa mostram que o governo Dilma acabou”, afirmou o senador Aécio Neves (PSDB-MG). A visão de que o sinal enviado pela agência de classificação de risco pode inviabilizar o atual governo também é compartilhada por empresários e economistas.

“A pressão dos empresários agora vai ser insuportável”, afirmou o ex-presidente do BNDES, Luiz Carlos Mendonça de Barros, que é sócio majoritário da montadora chinesa de caminhões Foton, no Brasil. “Acho que ela vai ter de ir embora, vai ter de renunciar.” Para o vice-presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil (Abit), Alfredo Bonduki, pior do que ter de lidar com mais uma projeção de queda na produção do setor têxtil neste ano, é a falta de perspectiva de uma melhora “A solução infelizmente passa a ser política, mesmo que isso doa de alguma forma”, afirma Bonduki.

“Eu não vejo a presidente com condições de liderar esse processo. Ela não tem liderança para comandar uma agenda de mudança.” A indisposição do empresariado com o governo se deve, sobretudo, à relutância do Palácio do Planalto em buscar formas de cortar gastos e debater uma redução do Estado. A maior parte das propostas surgidas até agora para resolver a questão do déficit prevê aumento de impostos, um remédio amargo que tende a sufocar ainda mais a economia, num momento em que os juros sobem e a inflação custa a cair.

“Quando falam em aumentar impostos, é como se estivessem dando um analgésico para uma infecção muito brava”, afirma o vice-presidente da Associação Paulista de Obras Públicas (Apeop), Carlos Zveibil Neto, dono da construtora Amafi. Em paralelo ao Orçamento com déficit, ao menos três propostas de aumento de impostos que estariam em estudo pelo governo já vieram a público: a recriação do chamado imposto do cheque, a CPMF, a elevação da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide), cobrada sobre combustíveis, e a elevação do Imposto de Renda, mencionada por Levy em Paris, na última semana.

O ministro vem sustentando a ideia de que é preciso encontrar uma ponte fiscal para conseguir garantir o equilíbrio, mas parece não ter conseguido convencer o setor privado. Em recente entrevista, Josué Gomes da Silva, presidente da Coteminas e filho do falecido José Alencar, que foi vice-presidente no governo Luiz Inácio Lula da Silva, afirmou que “o esforço político que o governo terá de fazer para conseguir aprovar novas receitas é o mesmo que seria necessário para cortar gastos”.

Se continuar insistindo com medidas impopulares, a presidente Dilma será bombardeada por críticas. “Acho de um atrevimento propor aumento dos impostos antes mesmo de cortar as despesas”, afirma Philipp Schiemer, presidente da Mercedes-Benz no Brasil. É consenso entre os empresários que a carga tributária elevada é um dos fatores que determinaram a perda de competitividade da indústria brasileira, gerando distorções na economia do País.

O Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT) estima que as medidas adotadas neste ano elevem a carga tributária para mais de 36% do PIB, seis pontos percentuais a mais do que em 2000. Um Estado desse tamanho e sem capacidade gerencial acaba representando mais um freio para a atividade econômica. “Nestes tumultuados meses de 2015, ficou bastante claro que a fórmula de elevação de impostos com corte de investimento público não funciona”, afirmou o empresário Benjamin Steinbruch, presidente da CSN, em artigo.

CRISE POLÍTICA Mais do que o simples combate às medidas amargas do governo, os empresários entraram na cena política para cobrar dos parlamentares e de membros do Executivo uma solução para o imbróglio, em alguns casos até se oferecendo para contribuir a construir pontes. “Uma coisa que mal ou bem o PT construiu nesses 12 anos foi uma relação madura com o empresariado”, afirma Wagner de Melo Romão, professor de ciência política da Unicamp. “O pior que pode acontecer neste momento é que os empresários se omitam, porque fica tudo na mão dos políticos e aí o que fala mais alto é o poder.”

Já os representantes do setor têxtil acreditam que suas declarações podem encorajar mais lideranças a pressionar por medidas que cobrem um avanço de competitividade. “Já que fomos convidados a pagar essa conta, temos o direito e a obrigação de nos posicionar”, afirma Bonduki. Preocupado com o agravamento da situação, um grupo de empresários de primeira linha tem procurado respaldar a presidente, não sem discutir abertamente com ela, o encaminhamento mais razoável para a superação da crise.

Entre eles figuram nomes como a Luiza Trajano, do Magazine Luiza, e banqueiros como Roberto Setubal, do Itaú, e Luiz Carlos Trabuco, do Bradesco, um dos principais pilares de sustentação do ministro Joaquim Levy, nos meios empresariais. A favor ou contra, o que está claro é que é preciso tirar os problemas políticos da frente para deixar que as companhias voltem a atuar em situação normal de mercado.

“A pasmaceira tem um custo para a sociedade”, afirmou Trabuco, em recente entrevista. “O custo é diluído mesmo para aqueles setores sociais que nada têm a ver com os dissensos que estão acontecendo.” A julgar pela trajetória dos índices de confiança, que se mantêm nas mínimas históricas, e evolução dos juros, que não param de subir, o mais provável é que mais líderes empresariais se posicionem sobre a cena de Brasília, engrossando a rebelião do setor produtivo. E não será nenhuma surpresa se mais pesos-pesados da economia vierem a público pedir a saída da presidente Dilma.

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“O Estado precisa de uma cirurgia de grande porte”

Flávio Rocha, presidente da Riachuelo

Por que o sr. acredita que a economia está sem propósito? 
O propósito é uma coisa fundamental nas pessoas, nas empresas e mais ainda no País. Ele dá o sentido de convergência e de união. Essa é principal função de qualquer líder. Quando eu me referia a uma ausência de propósito no Estado, eu falo no sentido de um vácuo. A ausência de propósito leva a exacerbação do interesse egoístico e pessoal. E é isso que estamos vendo.

A condução do ajuste fiscal proporciona esse vácuo? 
Sim, pois na ausência de um parâmetro de direcionamento, metade do governo defende o ajuste pelo aumento de impostos e outra por corte de gastos. Se o propósito fosse tornar o Brasil competitivo ou vitorioso economicamente, não faria sentido o aumento de imposto, porque fere a competitividade. Ajuste fiscal para quê? Para garantir os privilégios do Estado, ou recolocar o País no rumo da competitividade? Ninguém sabe.

E como deveria ser o direcionamento? Fala-se em aumento de impostos...
Aumentar imposto é um tiro no pé. O varejo é um ótimo exemplo disso, passamos por uma década de formalização. Mas já estamos vendo os sintomas do retrocesso. O clandestino está surgindo e o aumento de imposto só coloca uma pedra em cima do processo de formalização. O que é necessário é primeiro tampar o ralo, colocar o Estado nos rumos de uma gestão mais eficiente. Mais dinheiro não vai resolver. O que precisa ser feito é uma cirurgia de grande porte no Estado.

O rebaixamento da nota do Brasil era o que faltava para a presidente Dilma mudar a condução da política econômica?
Pode ter um efeito positivo, que são os argumentos do ministro Joaquim Levy. Talvez ele seja uma pessoa solitária na defesa das contas públicas. Porém, diante de tanta pressão, pode ser que ele ganhe força e consiga fazer, pelo menos, o modestíssimo ajuste que está proposto. O susto pode trazer esse desdobramento positivo.

Qual é o papel do setor privado neste momento de crise política? Deve expor mais as ideias?
O pior castigo para quem não gosta de político é ser governado por quem gosta. O empresariado, pelo camarote privilegiado que observa o espetáculo maravilhoso do mercado, tem o dever de participar, principalmente, em um momento como este, quando um imperativo é resgatar a competitividade do Brasil. Eu não tenho medo porque não ataco pessoas, não ataco partidos, eu falo de ideias. Então, eu acho que se for de alguma utilidade para que meus pares empresários exponham as ideias que eu acho que são atuais e pertinentes neste momento, seria muito bom.

O sr. comentou que o impeachment seria uma saída menos agonizante...
O impeachment poderia ser uma saída menos agonizante. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso até se referiu à renúncia como um gesto de grandeza, mas, sinceramente, pelo enraizamento que existe em volta e toda uma estrutura partidária absolutamente cheia de tentáculos no poder, eu acho que essa é uma hipótese pouco provável. Sem dúvidas, é um processo traumático e o trauma enorme é concentrado. Só há uma vantagem: o processo seria mais curto. Não se trata apenas dos três anos e meio perdidos. Não sabemos o que vai restar para recomeçarmos a vida.

O sr. acha que será um mandato perdido caso a presidente permaneça os quatro anos? 
Eu acho que sim, até porque não vejo as condições de ela sair da toca e liderar realmente o processo de reconstrução.

http://www.istoedinheiro.com.br/noticias/economia/20150911/rebeliao...

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Já os representantes do setor têxtil acreditam que suas declarações podem encorajar mais lideranças a pressionar por medidas que cobrem um avanço de competitividade.

A colocação que o Flavio Rocha vem fazendo, é perfeita. Chega de mais estado e mais imposto.

   Por questões estratégicas, os homens de negócios costumam evitar criticar os governantes de plantão.

É ultrajante ver políticos, analfabetos em vários sentidos, ganhando mais e com mais vantagens do que a maioria dos empresários de pequenas e médias empresas conseguem apurar, que dão um duro enorme para sobreviver e, produzir com qualidade, meio à essa selva de dificuldades e indiferença.
Sem nem mencionar negócios escusos, ou nebulosos, com que nos contemplam no noticiário.

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