Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

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Para que algo seja belo, não precisa necessariamente ser bonito

Do look decorativo da Saint Laurent aos desfiles de Rick Owens e Comme des Garçons, a temporada discute os limites físicos do corpo.

Certa vez, Rei Kawakubo disse a seguinte frase: “For something to be beautiful, it doesn’t have to be pretty”. A oposição é baseada na sutileza e significa que, para que algo seja belo, não precisa necessariamente ser bonito. Essa introdução do elemento estranho, disforme e até mesmo feio no design de moda tem tudo a ver com a visão do corpo defendida pelas criações de Rei em sua Comme des Garçons e outros de seus contemporâneos. Se agora as passarelas mostram algumas experiências no sentido de redesenhar o humano, é importante lembrar a trajetória desse pensamento na história do guarda-roupa.

Esconder ou deformar as linhas originais do corpo não é, claro, obra do século 20. Os corpetes e as crinolinas já faziam esse papel havia muitos séculos, dando superdimensões a quadris e ancas, enquanto oprimiam as cinturas. As ombreiras dos anos 1980, as modelagens oversized, os sapatos com solas gigantes, entre uma série de outras trends mais ou menos passageiras, também seguem o caminho da alteração de formas e colocam outros fatores à frente da harmonia padrãozinho.

Thom Browne

Thom Browne (Fotosite/Agência Fotosite)

É sempre possível encontrar um simbolismo em cada um desses recursos. Agigantar os ombros femininos no visual das working girls, por exemplo, equivalia de certa maneira a dar a essas mulheres uma estrutura mais masculina para enfrentar o mercado de trabalho, o que as ombreiras ofereciam de forma literal. Evidenciar atributos e mostrar contenção, submissão, poder, ostentação. São muitas as ideias aplicadas nesse sentido.

Em outras vezes, como no desfile mais recente da Saint Laurent, na semana de Paris, os looks “bolha” em vestidos e casacos são, além de releituras de clássicos da casa, uma variação muito mais ornamental do que conceitual da ideia de modificar a silhueta – o que não deixa de ter desdobramentos. Em outros casos, como na Balenciaga, o recurso funciona às vezes como ideia de styling e outras como uma visão modernizada e focada no streetwear, das experiências do próprio criador da marca com as propriedades arquitetônicas de tecidos e modelagens.

Saint Laurent

Saint Laurent (Fotosite/Agência Fotosite)

Na mesma temporada, Rick Owens e a própria Comme des Garçons mostraram ideias mais ousadas. No caso dessas marcas, modificar o corpo não é questão de trend ou vontade de momento, mas da essência de um trabalho de pesquisa.

Owens aciona sua ligação com o design brutalista, suas mulheres às vezes lembram esculturas orgânicas, com shapes e cores de pedra. Carregam pesos em lugares estranhos – talvez estejam se moldando de dentro para fora, em um movimento difícil, não homogêneo. Os estranhos looks de casulos elásticos que envolvem o corpo todo encerram o desfile, sem que nenhuma mulher definitiva saia deles. Já Rei coloca na passarela um anjo branco que, em seguida, contrasta com uma miscelânea de volumes, aplicações e estampas. Existe uma referência ao universo infantil, com seus brinquedos, comidas, personagens, o que tanto fala de crianças como da legião de adultos fãs de Hello Kitty, mangás e cupcakes. A estamparia viaja ainda por animais e naturezas- -mortas, faz pensar em instintos e transformação, talvez digam muito sobre a dificuldade de crescer, sobre o fenômeno que encurta a infância real ao mesmo tempo que a prolonga longamente como fantasia na idade adulta. A icônica coleção Body Meets Dress, Dress Meets Body, da Comme des Garçons, com seus famosos volumes duros, corcundas e curvas estranhas embaixo de singelos xadrezes vichy, está completando 20 anos. Rei foi homenageada pelo MET e seu gênio continua dando as cartas de muitas maneiras. Especialmente dizendo que nem sempre exibir o corpo é a maneira mais interessante de pensar sobre ele.

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