Fonte:|picoa.blogspot.com|
Picão é uma freguesia do concelho de Castro Daire. Fica situada na Serra de Montemuro. A natureza e a cultura são os seus centros de interesse. No interior da aldeia, existe ainda marcas do passado e também rostos de pessoas que retratam bem como é dura a vida na serra.
A cultura do linho (Linum usitatissimum L.)[1] faz parte da cultura tradicional da aldeia de Picão. Apesar de na aldeia já não haver produção do linho, a tecelagem do linho continua viva como sinal de um património cultural que deve preservar-se. Na aldeia de Picão podemos encontrar as Lançadeiras de Picão trabalhando o linho de uma forma que nos transporta a tempos já perdidos.
A tecelagem do linho surge como derradeira fase de um ciclo muito vasto onde a fiação do linho, e outras tarefas sequentes aparecem tão comezinhas no circuito familiar que apenas na última se expressam.[2]
De linho fazia-se a camisa do corpo, os lençois e almofadas e as toalhas de todos os usos. O tecido é ligeiro (o mais grosseiro é a estopa).
A planta do linho, como fornecedora de fibra têxtil, tem um passado histórico bastante longo na Península Ibérica. A sua utilização remonta à Idade Pré-Histórica, o que se constata por vestígios deixados em cavernas e outros achados arqueológicos.
Quando das invasões romanas na Península Ibérica, a cultura do linho foi dinamizada tendo sido levadas sementes e panos de linho para Roma, uma vez que em Itália a cultura tinha pouca expressão e o linho aí produzido era de baixa qualidade.
Os Romanos desenvolveram a agricultura e, em consequência, a cultura do linho na Península Ibérica, tendo a invasão dos Visigodos provocado no início a queda da sua importância. Quando a cultura ressurgiu, dá-se a invasão árabe, que volta a desestabilizá-la. No entanto, a expulsão dos Árabes da Península Ibérica e do Reino de Portugal faz reavivar a cultura.
São então importantes pólos de produção industrial as regiões de Guimarães e Lamego.
Com a epopeia dos Descobrimentos e o abandono das terras por gentes que iam procurar fortuna além-mar, dá-se um decréscimo na importância da cultura embora esta não tenha desaparecido. Todavia, sofreu um grande revés, não tendo sido incrementada a sua industrialização, como aconteceu, por exemplo, em França, Espanha, Inglaterra e Países Baixos.
De Norte ao Sul de Portugal não havia lavrador que não cultiva-se o linho, mulher que não fia-se e aldeia por mais pobre que não tivesse um ou mais teares.[3] Na aldeia de Picão, quase todas as famílias tinham um tear e cultivavam o linho, para uso próprio.
Para o cultivo do linho é necessário percorrer várias etapas, desde as sementeiras até chegar ao tecido fino e macio.
Sementeira
Em finais de Março início de Abril prepara-se o campo para a sementeira. A semente depois de estar pronta é lançada à terra, depois desta ser passada com um ancinho.
No início de Julho o linho é arrancado com a mão. Este é batido no joelho para retirar a terra e colocado em molhos pequenos.
Ripagem
O linho é depois sujeito a uma operação que se chama ripagem com o objetivo de separar a baganha (película que envolve a semente). Esta operação é feita com a ripança.
Com pancadas verticais, faz-se passar por entre os dentes da ripança o topo das plantas. As cápsulas, bem fechadas e rijas, saltam para o chão.
A baganha é colocada ao sol para sair a semente, que é guardada para semear no próximo ano.
Após ripado faz-se molhos que se colocam num poço de água durante quinze dias. Tiram-se da água e são secos durante três dias. Torna-se a colocar os molhos na água durante mais quinze dias e secam-se.
Esta operação consiste na dissociação dos cimentos pectidos e hemicelulósicos que ligam os feixes fibrosos entre si, sendo efectuada por microorganismos (fungos e bactérias) em anaerobiose.[4]
Maçar
Após a secagem, segue-se o "maçar", que consiste em separar as fibras lenhosas das fibras têxteis, ou seja tirar a casca do linho. Esta operação é efectuada com uma maça de madeira numa pedra lisa.
Tascar
Posteriormente vem a fase de "tascar" o linho como se diz em Picão, também conhecida por "espadelagem" noutras localidades. Trata-se de uma operação manual, que consiste em limpar o linho batendo de raspão com a espadana de encontro a um cortiço.
A espadana tem a forma de um cutelo.
Sedeiro
Após tascar o linho, este vai para o sedeiro. É no sedeiro, que se separa as fibras do linho da estopa.
As estopas apresentam sempre muitas arestas, que são os restos das palhas que ficam aderentes. Os linhos finos não devem apresentar arestas porque este é um factor depreciativo da fibra.[5]
Fiação
A operação seguinte é a fiação do linho com uma roca. A fiação é uma operação que consiste em produzir, por torção das fibras têxteis, um cilindro de comprimento ilimitado que se designa por «fio». Este deve apresentar em todo o seu comprimento o mesmo aspecto e a mesma resistência.
A utilização da roca exige que a operadora seja bastante hábil, uma vez que requer grande perícia manual. Faz-se primeiramente uma pasta com as fibras do linho e depois, em movimento lento, enrolam-se as fibras até ficarmos com uma maçaroca que prende com um fio para dar pressão. A seguir e molhando sempre o dedo vai-se puxando as fibras, formando um fio que deve ser torcido uniformemente e será depois enrolado ao fuso. Logo que se disponha duma porção bastante grande de fio, este é retirado do fuso e o novelo assim obtido passa para o sarilho.[5] No sarilho, serão obtidas as meadas.
Branqueamento
Depois das meadas feitas vão para a barrela para corar. Após quatro dias à cora, põe-se a secar, o qual posteriormente vai para a dobadoura para fazer os novelos.
Os novelos vão para a urdideira e daí para o tear.
[1] A. Proença da Cunha, Alda Pereira da Silva e Odete Rodrigues Roque, Plantas e Produtos Vegetais em Fitoterapia, 2ª Edição, Fundação Calouste Gulbenkian, 2006, p. 426.
[2] Alberto Correia, Alexandre Alves e João Inês Vaz, Castro Daire, Câmara Municipal de Castro Daire, 1995, p. 183.
[3] J. C. Estevéns Lança e J. M. Fernandes Baptista, A Cultura do Linho, nº 6, Ministério da Agricultura, 1993, p. 7.
[4] J. C. Estevéns Lança, J. M. Fernandes Baptista, A Cultura do Linho, nº6, Ministério da Agricultura, 1993, p. 20.
[5] J. C. Estevéns Lança, J. M. Fernandes Baptista, A Cultura do Linho, nº6, Ministério da Agricultura, 1993, p. 22.
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