AGENCIA ESTADO - |ultimosegundo.ig.com.br|
A Argentina descumpriu promessa feita ao Brasil e não reduziu a burocracia para as importações de calçados e móveis, setores que selaram acordos de "restrição voluntária" de vendas um mês atrás. O sócio do Mercosul está demorando quase quatro meses para liberar uma licença de importação.
Os exportadores relatam cancelamento de pedidos, estoques de produtos fora de moda, e receio de perder clientes de longa data no mercado vizinho.
"A situação está degradando o ambiente de negócios entre Brasil e Argentina. Diante de um atraso tão grande, o importador argentino deixa de comprar o produto brasileiro", disse o secretário executivo do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Ivan Ramalho.
Por conta das medidas protecionistas e do impacto da crise, a balança bilateral registrou déficit de US$ 48 milhões no primeiro semestre. O Brasil não tinha um resultado negativo no comércio com a Argentina desde janeiro a junho de 2003. As exportações para o vizinho caíram 42,7%, para US$ 4,9 bilhões, um ritmo superior à queda de 22% das vendas totais. Segundo o governo, 14% das vendas para a Argentina foram afetadas por licenças não automáticas ou antidumping.
Os exportadores argumentam que as restrições da Argentina provocam desvio de comércio. Conforme a consultoria Abeceb.com, as exportações brasileiras dos produtos sujeitos a licenciamento não automático recuaram 61% de janeiro a maio, enquanto as vendas dos mesmos produtos vindos da China caíram 39%.
Segundo José Luis Dias Fernandez, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Móveis, os argentinos não liberam nenhuma licença de importação para móveis desde abril, apesar do acordo. O setor aceitou reduzir em 35% o volume exportado para a Argentina. "As eleições deles acabaram e a nossa paciência também", disse Fernandez. Ele se refere às eleições parlamentares da Argentina em que a presidente Cristina Kirchner perdeu maioria do Congresso.
"O acordo não mudou nada", disse Micheline Twigger, diretora de comércio exterior da fabricante de calçados Picadilly. Ela conta que ainda tem produtos da coleção de inverno no Brasil e que calçados que seriam entregues em março e abril só chegaram agora na Argentina. Por causa do atraso, o varejo local cancelou pedidos e 20% dos sapatos ficaram no estoque do distribuidor em Buenos Aires e só devem chegar nas lojas no próximo inverno, quando estarão fora de moda.
O setor calçadista se comprometeu com o governo argentino a reduzir as exportações em 17% este ano, para 15 milhões de pares, e esperava como contrapartida a liberação das licenças. Conforme Heitor Klein, diretor executivo da Associação Brasileira da Indústria Calçadista o setor tinha 4,5 milhões de pares sem licença quando o acordo foi selado. "Ainda estamos fazendo as contas, mas temos relatos de que uma parte não saiu", disse Klein. "Acreditamos que agora o governo brasileiro vai agir com mais vigor."
Em outros setores, as negociações se complicaram e os dois países estão longe de um acordo. Segundo fabricantes de tecidos, os argentinos são muito intransigentes e chegam a afirmar que "não cabe nem um metro de denim (tecido utilizado para jeans) no mercado local por causa da crise". O governo argentino praticamente não liberou licenças de importação nesse caso e as vendas brasileiras no país caíram 78% de janeiro a maio.
"Concordamos com a adoção de licenciamento para coibir práticas ilegais, mas os argentinos privilegiam o produto chinês e isso não dá para entender", disse Aguinaldo Diniz Filho, presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil. Segundo ele, a fatia do Brasil nas importações de denim da Argentina caiu de 42% em 2008 para 23%.
Maria Teresa Bustamante, coordenadora da área de comércio exterior da Associação Nacional dos Fabricantes de Eletroeletrônicos, disse que a indústria brasileira da linha branca aceitou restrições no passado e ajudou a Argentina a se reerguer depois da crise do país em 2003, mas que agora os acordos não fazem mais sentido. "Chegamos a um ponto que ou o governo brasileiro toma uma atitude, ou o Mercosul não tem mais sentido."
No próximo dia 14 de julho, haverá uma reunião bilateral Brasil-Argentina, em Brasília. Apesar da expectativa dos setores e da insatisfação do Ministério do Desenvolvimento, a posição do Brasil em relação à Argentina não deve mudar. Segundo auxiliares próximos, a visão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva sobre a Argentina é mais no sentido de ajudar o país vizinho do que de impor restrições ao trânsito de mercadorias. "A Argentina está com uma situação pior do que a nossa, com uma dificuldade momentânea de balanço de pagamentos e nós vamos fazer o quê? Partir para cima?", disse um interlocutor do presidente.
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