Vanessa Barone, para o Valor, de São Paulo
Impossível falar em economia criativa sem falar em moda. Num país de dimensões continentais, como o Brasil, essa economia reúne influências, tradições e estilos dos mais diversos. Organizar essa força multicultural - presente nas grifes mais sofisticadas do eixo Rio-São Paulo e, igualmente, no trabalho das rendeiras do Nordeste - é o desafio da indústria da moda. Só assim é possível pensar em desenvolvimento, lucro e principalmente capacidade de competição com os grupos internacionais. "Precisamos aproximar o Brasil do design do Brasil da tradição", diz Graça Cabral, vice-presidente do Instituto Nacional de Moda e Design (In-Mod) e diretora de relações corporativas do São Paulo Fashion Week (SPFW), que segue até o dia 22, no Pavilhão da Bienal, em São Paulo.
O evento de moda - que já é o maior da América Latina - é um exemplo de economia criativa, segundo Graça. "Somos uma central de conexões e de convergência de várias redes", diz Graça. Para entender a economia criativa, segundo ela, é preciso pensar nos processos, antes do produto. "O SPFW sempre foi pensado desta forma: como um processo longo de formação de uma cultura de moda, no Brasil". Além disso, hoje, ele alinha outros setores econômicos e culturais que se alimentam da moda - tudo isso funcionando como um motor poderoso. Atualmente, o SPFW tem um orçamento de R$ 10 milhões, bancado por patrocinadores como Natura, Shopping Iguatemi, Oi e Havaianas. Junto com os desfiles, o evento apresenta exposições, lançamentos de filmes e livros e conferências com profissionais da área de moda.
Mas, se dentro do SPFW a economia criativa pode ser vista em pleno funcionamento, na indústria da moda há um ´gap´ a ser transposto, segundo Graça Cabral. Apesar do design brasileiro ser reconhecido internacionalmente, ainda faltam recursos, incentivos e organização à cadeia têxtil, como um todo. "A moda vai além da roupa e engloba a questão do valor agregado." Quando se trata da economia criativa, a cultura e as tradições de uma nação são os valores intangíveis que, uma vez apropriados e bem trabalhados, viram bons negócios. Foi assim com países como França e Inglaterra - que souberam fazer uso de suas tradições para virarem referências mundiais de moda e design. "Nosso país é um caldeirão de culturas", diz Graça. "Mas precisamos ir além das manifestações folclóricas. O país tem as condições para trabalhar focado na construção de uma moda sustentável, mas, para isso, dependemos de políticas públicas."
São essas políticas que podem, por exemplo, tornar o trabalho artesanal um negócio organizado e lucrativo. Segundo uma Pesquisa de Informações Básicas Municipais (Munic) realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE) em 2005, o bordado é a principal atividade artesanal de 75% dos municípios brasileiros. Apesar disso, boa parte desta produção não acompanha a evolução da moda e segue repetindo o mesmo processo de trabalho há gerações. Muitas vezes, o resultado é um produto pouco valorizado. "Nos últimos dez anos, este setor conseguiu um nível de organização inédito. Mas ainda temos um longo caminho de apropriação dos nossos talentos", opina o estilista mineiro Ronaldo Fraga, que além de ser um dos designers que melhor lançam mão da tradição para criar roupas contemporâneas, já percorreu várias regiões do Brasil para pesquisar o artesanato brasileiro. "E, felizmente, ele não é mais visto como coisa feita por pobre, para pobre", garante.
De acordo com Fraga, o primeiro passo para transformar o artesanato em business passa pela reafirmação cultural da região. "É preciso respeitar a vocação do lugar e tentar encontrar o que aqueles artesãos têm de mais rico", diz Fraga. "Não podemos chegar impondo que eles abandonem o que estão acostumados a fazer para produzir o que está na moda. Não dá para mandá-los parar de fazer renda para produzir peças de malha, só porque isso está vendendo bem nos grandes centros." Recentemente, Fraga coordenou o projeto Natal Pensando Moda - uma ação do Sebrae-RN, em parceria com o Senai e o Governo do Estado do Rio Grande do Norte.
O projeto reuniu cinco empresas que fazem parte do pólo de confecções do Estado para participar do Fashion Business, no início do mês, no Rio. "Levamos empresas que realizam um trabalho elaborado e com qualidade de acabamento", diz Zeca Melo, superintendente do Sebrae do RN. "Já havíamos participado do evento antes, mas não de forma profissional e focada nos negócios, como foi desta vez." O estilista Ronaldo Fraga trabalhou com os estilistas das confecções da região, para produzir um catálogo de produtos que funcionasse como uma vitrine. "O resultado foi que as empresas venderam três vezes mais", diz Melo.
Os resultados não espantam Fraga. "Temos vocação para as peças feitas à mão e isso encanta os mercados interno e externo", afirma. "Nós temos tudo, temos a renda Renascença, que nasceu na Holanda, onde não é mais produzida." Falta agora valorizar os produtos artesanais, agregando a eles técnicas de modelagem e de acabamento.
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