Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

Como a segunda maior rede varejista do mundo deixou para trás uma temporada de maus resultados e retomou a liderança no mercado brasileiro

Desmartis, presidente: “Temos uma nova geração de hipermercados e eles voltaram a crescer”
Desmartis, presidente: “Temos uma nova geração de hipermercados e eles voltaram a crescer” ( foto: Ana Paula Paiva/Valor)

No sétimo andar da sede do Grupo Carrefour em Boulogne-Billancourt, uma vila a oeste de Paris, uma exposição de produtos criados por uma equipe de pesquisa e desenvolvimento da rede francesa lembra a sala do Professor Pardal, o inventor mais famoso do universo infantil. Ali, os talentos criativos da rede francesa de supermercados, a maior da Europa, seguem o mesmo modelo do supergênio dos quadrinhos: tentam descobrir soluções simples para o dia a dia, de colchões infláveis de solteiro, que podem ser unidos várias vezes com um zíper, a formas de gelo com tampa, que evitam o desperdício de água no trajeto entre o filtro e o freezer.

Pequenas melhorias como essas, tratadas com tanta atenção num negócio com faturamento global de € 100,5 bilhões, simbolizam a reinvenção da empresa. Desde a chegada de Georges Plassat à presidência executiva mundial, em maio de 2012, o Carrefour voltou a se preocupar com os detalhes, principalmente com os alimentos, segmento onde o grupo é historicamente forte. Até ali, a rede parecia acomodada na sua posição de segunda maior varejista do mundial, atrás apenas da Walmart, e despreocupada com valores importantes para o consumidor. A conseqüência foi uma deterioração acelerada dos resultados financeiros, que estavam aquém do tamanho de um negócio gigantesco, com cerca de 11 mil lojas espalhadas por mais de 30 países.

Como em outras partes do planeta Carrefour, a subsidiária no Brasil reproduzia o que acontecia na matriz. Acostumado, durante décadas, a liderar o mercado local, o Carrefour foi superado durante três anos, de 2010 a 2013, pelo Grupo Pão de Açúcar, hoje controlado por seu arqui-rival na França, o Casino. Com um agravante: a casa estava extremamente bagunçada. Em 2010, foi descoberto um escândalo na gestão, que deixou um rombo de R$ 1,2 bilhão na operação. O brasileiro Luiz Fazzio, que fora diretor-geral da C&A no País, assumiu o lugar do francês Jean-Marc Pueyo e deu início a um bem-sucedido processo de austeridade.

O que não estava dando certo, não podia consumir esforços e dinheiro. Planos foram redesenhados, como a criação do Projeto Fórmula 1, para dinamizar a área comercial. Em 2012, por exemplo, Fazzio encerrou a venda online, na contramão da concorrência, que acelerava na área digital. Ele não era unanimidade internamente, mas conquistou o respeito por tomar decisões difíceis sem transferir o ônus para a equipe. “Era muito difícil lidar com o Fazzio, mas sem ele o Carrefour não teria se recuperado tão rapidamente”, diz um executivo, que trabalhou ao lado do antigo CEO.

Os frutos dessa arrumação apareceram no ano passado, quando a operação brasileira já estava sob o comando do francês Charles Desmartis, que substituiu Fazzio, em dezembro de 2013. 
Em 2014, a liderança perdida em alimentos para o Pão de Açúcar foi retomada. Apesar de investimentos maiores nas lojas e na oferta de produtos terem contribuído com a expansão de 4,9% nas vendas em um ano, o fraco desempenho do principal concorrente facilitou a passagem. O mercado credita a maior parte do sucesso à operação do Atacadão, o braço no chamado atacarejo do grupo, que cresce a taxas superiores às dos supermercados há pelo menos cinco anos.

“O primeiro grande acerto do Carrefour foi comprar o Atacadão e perceber o sucesso do formato atacarejo”, diz o especialista Alberto Serrentino, fundador da consultoria Varese. O Carrefour, porém, divide os méritos entre todos os negócios. “Temos uma nova geração de hipermercados, mais foco na mercadoria e nas ofertas e menos na decoração das lojas, um sortimento maior de produtos, além de pessoas que trouxemos da Europa com know how”, diz Desmartis. “Os hipermercados voltaram a crescer.” Para este ano, o Carrefour decidiu investir na abertura de lojas de proximidade em São Paulo, lançadas em 2014, com a marca Express. 

O formato mais enxuto está ligado à tendência dos consumidores em comprar menos volumes e freqüentar uma varejista perto de casa ou do trabalho. O objetivo, ainda distante, é reproduzir o modelo francês, onde as lojas do Carrefour estão localizadas a seis minutos de distância de seus clientes, com um de seus sete bandeiras. “Os multicanais são adaptados a cada país, mas em alimentação o mais avançado está na França”, afirmou à DINHEIRO o vice-presidente financeiro Pierre-Jean Sivignon, segundo homem na hierarquia do grupo. “O formato Drive, por exemplo, é responsável pela venda de 6% de perecíveis na França.”

O Drive é uma das marcas que Desmartis planeja implantar no Brasil, ainda neste ano. A tendência é que a loja no bairro de Pinheiros, em São Paulo, seja a primeira a receber esse formato, que funciona como uma rede de fast food. O consumidor realiza a compra pela internet e retira os pacotes, após duas horas. Em Chambourcy, cidade nos arredores de Paris, o Carrefour Drive está instalado num galpão de 1,6 mil metros quadrados e lida com 100 encomendas diárias, com tíquete médio de € 90 – cerca de 25% dos pedidos são feitos por celulares ou tablets. Para que esse formato funcione, porém, o Carrefour precisa colocar no ar o seu novo canal de vendas pela internet.

O projeto deve ser relançado no início do quarto trimestre ou no começo de 2016. Para se manter na liderança e fazer esses planos andarem, o Carrefour precisa atacar um de seus pontos fracos: a logística, área em que o Pão de Açúcar sempre esteve muito à frente. Uma experiência a ser eventualmente replicada é a da rede na Espanha. Com a reformulação dos centros logísticos, a implantação de novas tecnologias e o aumento de produtividade, os depósitos de distribuição foram reduzidos de sete para cinco. Agora, eles conseguem atender um pedido realizado por uma loja em dois dias, em média, e o índice de cumprimento chega a 99,8%, sem distinção entre hipermercados ou pequenas lojas.

“As carências logísticas ainda estão nos prejudicando um pouco”, afirma Desmartis. “Precisamos de 12 a 18 meses para que os sistemas estejam prontos para atender todos os formatos.” O concorrente Pão de Açúcar conseguiu desenvolver uma área sofisticadíssima, com tecnologia e otimização de processos, que penaliza quem entrega apenas 80 de 100 produtos encomendados. Essa era uma obsessão do antigo controlador, o empresário Abilio Diniz. Abilio é a peça-chave em todos esses processos, da maior eficiência logística ao sucesso dos investimentos.

Em dezembro de 2014, ele pagou R$ 1,8 bilhão através do Península, o fundo de investimento de sua família, por uma participação de 10% no Carrefour Brasil. Até o ano que vem ele pode exercer a compra de mais 6% dos ativos da operação nacional. Os recursos do ex-dono do Pão de Açúcar, cuja aproximação com o Carrefour, no passado, foi o principal motivo das desavenças com seus sócios do Casino, no Pão de Açúcar, garantiram o plano de investimento sem a necessidade de realização da abertura de capital na bolsa de valores, no curto prazo.

A presença de Abilio é controversa no Grupo. Em abril, ele aumentou de 2,4% para 5,07% sua participação no capital da matriz e tornou-se seu quarto maior acionista. Ele almeja uma vaga no Conselho de Administração, mas precisa do aval dos executivos. No Brasil, Diniz tem sido mais do que um conselheiro – a Península ocupa duas das oito cadeiras do Conselho. É comum ele convocar executivos da rede varejista para reuniões na sede de sua gestora de fundos.

Há três nomes de sua confiança no dia a dia do Carrefour: Sandra Gebara, Antonio Ramatis e Sylvia Leão, ex-executivos do Pão de Açúcar, que estão na direção jurídica, comercial e marketing, respectivamente. Esse lado executivo de Abilio tem sido visto com cautela pela matriz, talvez até para prestigiar seus executivos de confiança. “O sr. Diniz é um conselheiro como os outros. A diferença é que ele conhece bem o Brasil e o varejo”, afirma Sivignon, que substitui Plassat, adoentado, no comando do Carrefour, desde fevereiro. “As ideias dele são bem-vindas e estão à disposição de Desmartis.”

FONTE: http://www.istoedinheiro.com.br/noticias/negocios/20150504/reinvenc...

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