Com arquitetura inovadora e "qubits gato", Ocelot chega com a promessa de acelerar o futuro da computação.
A corrida pela supremacia quântica ganhou um novo protagonista, e um brasileiro está no centro dessa revolução. A Amazon Web Services (AWS) anunciou hoje (27/2) seu primeiro chip de computação quântica, batizado de Ocelot, que promete reduzir em até 90% os custos de implementação da correção de erros quânticos.
A iniciativa, conduzida por uma equipe de especialistas no AWS Center for Quantum Computing, no Instituto de Tecnologia da Califórnia (Caltech), é liderada por Fernando Brandão, diretor de ciência aplicada da AWS e professor de física no Caltech.
O feito representa um marco na corrida pelo desenvolvimento de computadores quânticos tolerantes a falhas, capazes de solucionar problemas de grande relevância comercial e científica — e impossíveis de serem resolvidos pelos computadores clássicos convencionais.
“O que estamos anunciando hoje é o chip que marca um novo paradigma. O grande problema de construir computadores quânticos é que eles sofrem com ruídos — e isso dificulta a execução dos algoritmos de ponta a ponta sem erros. A forma de contornar esse cenário é a correção de erros, como fazemos na computação clássica, mas o custo é grande. Para usar, por exemplo, um computador com 100 qubits (o análogo dos bits na computação quântica), precisaríamos de milhões de qubits físicos, o que ainda está muito distante de ser construído”, explica ele.
O Ocelot é, portanto, um avanço fundamental para tornar os computadores quânticos práticos e escaláveis. “Estamos trabalhando para construir um novo tipo de computador, baseado em leis diferentes da física clássica. Essa abordagem nos permitirá resolver problemas que hoje levariam mais tempo do que a idade do universo para serem solucionados com os computadores convencionais”, explica Brandão.
Fernando Brandão, diretor de ciência aplicada da AWS
A AWS iniciou o projeto há cinco anos, e Brandão é um dos fundadores. “Contamos com um grupo forte de cientistas teóricos, experimentais, engenheiros e profissionais de computação, todos no Caltech. Esse equilíbrio entre ciência e engenharia é fundamental para avançar, e estamos bastante satisfeitos com o resultado. Conseguimos uma abordagem inovadora de computação quântica, que reduz taxas de erro de forma significativa, e agora estamos prontos para a próxima fase de escalonamento”, comemora.
Segundo ele, a computação quântica promete revoluções em diversas áreas. No setor de materiais, poderá acelerar a descoberta de novos compostos para baterias mais eficientes, exemplifica o especialista. Na indústria de fertilizantes, ajudaria a otimizar a produção de amônia, que consome cerca de 3% da energia global. Em segurança digital, desafiará os protocolos de criptografia atuais. E na logística, ajudaria empresas a otimizar rotas complexas de entrega.
Brandão contou ao IT Forum que um dos maiores desafios da computação quântica é sua sensibilidade a ruídos ambientais. Qualquer vibração, variação de temperatura ou radiação pode desestabilizar os qubits e comprometer os cálculos.
Para contornar esse problema, o Ocelot emprega uma abordagem diferenciada, baseada nos chamados ‘qubits gato’, inspirados no experimento mental do gato criado pelo físico austríaco Erwin Schrödinger em 1935. O experimento demonstra os desafios da mecânica quântica. Esses qubits citados por Brandão têm a capacidade de suprimir naturalmente certos tipos de erros, reduzindo significativamente a necessidade de redundância na correção de erros.
O nome Ocelot foi escolhido de forma lúdica, conta, em uma brincadeira de palavras: uma alusão ao “oscillator” (oscilador) e à ideia dos “cat states” (estados de gato) em física quântica.
O chip consiste em dois microchips de silício integrados, com circuitos feitos de materiais supercondutores, incluindo tântalo, um elemento químico conhecido por sua estabilidade e baixa taxa de defeitos. A ideia é proporcionar uma arquitetura mais escalável, capaz de manter informação quântica de forma confiável por mais tempo.
A abordagem da AWS com o chip Ocelot é radicalmente diferente de muitos projetos quânticos em andamento. Em vez de criar qubits e somente depois tentar adaptar soluções de correção de erros, a equipe de Brandão desenhou toda a arquitetura já pensando nesse ponto crucial de maneira otimizada.
Essa prioridade dada à correção de erros quânticos é o que torna o Ocelot especialmente interessante, e com potencial mencionado por ele de reduzir em até 90% a quantidade de qubits físicos requeridos para cada qubit lógico efetivo.
Ocelot é o chip quântico de primeira geração desenvolvido pelo AWS Center for Quantum Computing em Pasadena, Califórnia. Crédito: Divulgação/AWS
Na prática, isso significa que, se antes projetava-se a necessidade de milhões de qubits físicos para obter algumas centenas de qubits lógicos, a nova tecnologia pode viabilizar o mesmo desempenho com uma fração dos recursos. Essa economia de escala tem potencial para acelerar o surgimento de aplicações comerciais, científicas e industriais da computação quântica.
O Ocelot foi construído em dois microchips de silício empilhados, cada um medindo cerca de 1 cm². Em cada superfície, há camadas ultrafinas de materiais supercondutores que compõem os circuitos quânticos.
O design inclui 14 componentes principais (5 qubits de dados, 5 circuitos de buffer e 4 qubits de detecção de erros), formando um protótipo que pode armazenar estados quânticos por tempo suficiente para testes detalhados de robustez. Esses experimentos, descritos em artigo publicado na revista Nature e no site Amazon Science, confirmam que a estratégia de “qubits de gato” funciona e abre caminho para a escalabilidade.
Conforme relatado por membros da equipe de Brandão, como o chefe de hardware quântico da AWS, Oskar Painter, o desafio ainda não acabou. Ele compara o estágio atual da computação quântica ao período dos computadores clássicos com válvulas a vácuo: máquinas gigantes, pouco confiáveis, mas que prepararam o terreno para a chegada do transistor e, mais tarde, dos microprocessadores.
Assim como aconteceu no passado, este momento da computação quântica demanda muita pesquisa em materiais, design e processos de fabricação, tudo para diminuir ruídos, defeitos e, consequentemente, a necessidade de correção de erro.
Embora o Ocelot ainda seja um protótipo, ele indica um caminho promissor para a computação quântica. A AWS planeja avançar em novas fases de desenvolvimento, resolvendo desafios de engenharia e escalabilidade. A previsão de Brandão é de que, com essa nova abordagem de correção de erros, seja possível avançar significativamente nos próximos três a cinco anos com um computador quântico.
Para ele, a computação quântica chegará a um momento que será democratizada via computação em nuvem. Assim como hoje as empresas acessam instâncias de computação de alto desempenho (HPC) pela AWS, no futuro os clientes poderão utilizar capacidade quântica para resolver problemas específicos sem precisar construir suas próprias infraestruturas.
É inegável que o cenário de computação quântica está em ebulição. Enquanto a AWS celebra o seu marco com o Ocelot, a Microsoft também anunciou recentemente seu chip de computação de ponta. A empresa apresentou avanços em sua plataforma de computação quântica na nuvem, o Azure Quantum, e vem investindo em novos algoritmos e parcerias que aproximam a tecnologia quântica de desenvolvedores e pesquisadores.
“A AWS tem um histórico de desenvolvimento de chips próprios, como para inteligência artificial (IA), e agora trazemos isso para o universo quântico. É tudo parte de uma grande jornada, ainda demorada, mas com potencial de ser muito positiva para a humanidade”, finaliza Brandão.
Bem-vindo a
Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI
© 2025 Criado por Textile Industry.
Ativado por
Você precisa ser um membro de Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI para adicionar comentários!
Entrar em Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI