Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

CHINA - Será o bode expiatório dos problemas do Brasil???

 

 

Notícias do Estadão, apresentadas como vindas do Palácio do Planalto, apontam para divergências com a China. Semanas atrás, o Ministro do Desenvolvimento pareceu apontar na mesma direção, ao tomar as dores dos fabricantes de calçados e ameaçar a adoção de medidas protecionistas contra os sapatos chineses. Outras notícias, ainda relacionadas a sapatos e têxteis, falavam da desconfiança de que a China, para escapar das cotas estabelecidas pelo governo, estaria  exportando seus produtos baratos através de triangulação com o Vietnã, Camboja e Malásia.

O Estadão também informou que o atual debate estratégico no governo Dilma, no sentido de elevar a competitividade nacional, na verdade  estaria centrado em “conter a enxurrada de importações” chinesas. Ainda segundo tais informações, o governo Dilma estaria tendendo a adotar “tarifas dirigidas para produtos industrializados” da China, “uma fiscalização mais rígida nas alfândegas”, “mais processos antidumping” e “novas regras para mineradoras estrangeiras”, de modo a evitar que a China consolide “seu controle sobre as riquezas minerais brasileiras”.

O Estadão também deu espaço para Maurício Cárdenas, diretor do programa latino-americano da Brookings Institution, de Washington, segundo o qual o novo governo brasileiro estaria "buscando grandes mudanças” no rumo dos Estados Unidos, como parceiro mais confiável, o que teria “consequências para toda a América Latina, já que muitos outros países, experimentando os mesmos problemas” com a China, “devem seguir o exemplo do Brasil".

Para não dizerem que o jornal deixou de ouvir o “outro lado”, o Estadão transcreveu opiniões alertando que “redefinir a relação com a China é algo mais fácil na retórica do que na prática”. Simples: o comércio bilateral, de cerca de 2 bilhões de dólares, em 2000, se elevou para 56,2 bilhões de dólares, em 2010. Em outras palavras, “a China superou os EUA como maior parceiro comercial do Brasil” e, em 2010, foi a principal origem de “investimentos estrangeiros diretos, com cerca de 17 bilhões de dólares”. Isso teria ajudado a economia brasileira a alcançar o “crescimento mais expressivo em duas décadas”, incluindo aí um superávit comercial com a China de 5 bilhões de dólares.

Paralelamente, ministros do governo Dilma se reuniram, em São Paulo, com lideranças empresariais. Na prática, ouviram a pauta já cantada pelo Estadão. Porém, como era de esperar, explicaram que não é fácil adotar medidas protecionistas, nem acusar a China de dumping, sem levar em conta os dados globais do comércio bilateral, ou desprezar as regras estabelecidas pela OMC. Ainda paralelamente, o secretário do Tesouro e o presidente dos Estados Unidos  anunciaram visitas ao Brasil, com alguns jornalistas insinuando que ambos gostariam de tratar com a presidenta Dilma de como enfrentar a China.

Bem vistas as coisas, Washington, empresários brasileiros descontentes e até FHC, que declarou o governo “ingênuo” nas relações com a China, formaram um coro para transformar a China no grande bode expiatório dos problemas do Brasil no mercado internacional. É verdade que a política de diversificação implementada pelo governo Lula ajudou a reduzir a dependência do Brasil aos Estados Unidos e Europa. Mas os Estados Unidos perderam a posição de maior parceiro comercial do Brasil por seus próprios problemas. Querer reverter a situação criando intrigas não é um bom caminho.

Em termos concretos, não há dúvida de que as relações entre o Brasil e a China, apesar das vantagens globais que têm trazido para o Brasil, estão realmente desniveladas. Mais de 80% das exportações do Brasil para a China são de minério de ferro, soja e algumas outras commodities minerais e agrícolas. No entanto, ao contrário do que insinua o Estadão, as exportações de minério não são realizadas por mineradoras chinesas no Brasil, mas fundamentalmente pela Vale. É fato, também, que muitas indústrias brasileiras ficaram de fora do "boom" econômico do ano passado, e que elas estão culpando os chineses  pelo risco da "desindustrialização". Para examinar isso, vamos deixar de lado o fato de que muitos dos empresários, que hoje brandem o perigo chinês, não soltaram sequer um “ai” quando a política neoliberal de Collor-Itamar-FHC realizou a mais intensa “desindustrialização” que o Brasil já conheceu. Vamos apenas nos limitar a lembrar como esses empresários enfrentaram, nos últimos 15 anos, a emergência da China.

Ainda no final dos anos 1990, o governo FHC e boa parte dos empresários brasileiros continuavam aferrados à idéia de que o crescimento chinês era uma bolha sem futuro. O governo FHC chegou  mesmo a iniciar medidas para fechar o consulado brasileiro e o escritório do Banco do Brasil em Shanghai. E a maior parte dos empresários brasileiros, ao invés de se capitalizarem através de investimentos e negócios com a China, sequer se mexeu, mesmo quando já eram evidentes a aceleração industrial chinesa e a ampliação de seu mercado interno, Alguns só começaram a acordar quando o presidente
Lula, em sua visita presidencial à China, carregou atrás de si cerca de 500 empresários.

Apesar disso, as principais iniciativas empresariais para aproveitar as oportunidades oferecidas pelo crescimento chinês continuaram sendo as do governo brasileiro e, em parte, das empresas chinesas, que vinham ao Brasil para comprar produtos ou para se instalar aqui. Conta-se nos dedos o número dos empresários brasileiros que foram à China pesquisar oportunidades. A maior parte ficou esperando a vida levar e ver o que ia acontecer. Nem se deu conta de que, a partir de  2006, cresceu substancialmente o número de empresas chinesas dispostas a investir em plantas de fabricação no Brasil e, portanto, participar não de um processo de “desindustrialização”, mas sim de industrialização.

Algumas das principais dificuldades para os investimentos diretos chineses no Brasil são a ausência de projetos privados e, em certa  medida, também governamentais, a desconfiança com que boa parte dos empresários encara os investidores chineses, e o emaranhado de leis, decretos e regulamentos que “protegem” certos ramos industriais, dominados por corporações estrangeiras, contra a entrada de outros concorrentes..

Uma avaliação mais fria das relações do Brasil com a China aponta que uma parte do empresariado brasileiro quer responsabilizar esse país por sua própria incapacidade de investir em inovação, ganhar competitividade e enfrentar os problemas da crise econômica gerada pelos Estados Unidos e demais paises desenvolvidos. É essa crise que tem reflexos diretos sobre o câmbio e a exportação de manufaturados, mas esses empresários preferem desviar a atenção para a China e, pior, apresentar como saída, além do desgastado protecionismo, uma nova aliança com os Estados Unidos, como teria insinuado, segundo a matéria do Estadão, “uma autoridade próxima a Dilma”.

Ou seja, eles querem resolver os desequilíbrios existentes, que envolvem não só os chineses, através do uso do tacape contra a China. No entanto, nas relações com a China, uma tentativa dessas não passará de estupidez. Primeiro porque a postura do governo Dilma, como foi a do governo Lula, é a de desenvolver a indústria no Brasil. O que demanda, além do adensamento das cadeias produtivas industriais, destruídas durante o predomínio neoliberal de Collor-Itamar-FHC, a gigantesca modernização do verdadeiro custo Brasil, isto é, da  infra-estrutura energética, de transportes e telecomunicações, além da  infra-estrutura urbana e da ciência e tecnologia.  Esse é o caminho certo para dar nova musculatura econômica e comercial ao Brasil e torná-lo um player internacional em igualdade de condições com os demais.

Segundo, porque se esse é o caminho, a China não pode ser tomada como inimiga. Ao contrário, a China é hoje o país que melhores condições oferece para o Brasil contar com capitais de investimento direto, que podem ser investidos para tirarmos o atraso da alquebrada infra-estrutura nacional e para adensar as cadeias produtivas industriais. Além disso, a China possui, a preços mais competitivos, grande parte das máquinas, equipamentos e tecnologias que o Brasil ainda precisa importar para seu processo de industrialização. Negociar para que essa participação chinesa seja win-win depende da capacidade de negociação dos brasileiros, não dos chineses.

Terceiro, porque o pedido feito por Soraya Rosar, especialista em comércio da CNI, para o governo brasileiro “pressionar para um maior acesso ao mercado chinês”, só teria sentido se os empresários se dispusessem realmente em acessar tal mercado. Como pressionar a China a abrir ainda mais seu mercado se boa parte dos empresários brasileiros não faz, nem quer fazer, pesquisas de mercado, nem quer  investir para conquistar nichos daquele crescente mercado?

Se a atitude dessa parte dos empresários brasileiros continuar sendo a de deixar a vida levar e o governo resolver seus problemas, e a presidenta Dilma quiser acelerar ainda mais o crescimento, atraindo mais capitais externos para investimentos diretos, em algum momento ela terá que intensificar a criação de estatais que respondam mais rapidamente aos desafios que esses empresários se negam a enfrentar. Com isso, talvez consiga não só equilibrar as relações com a China, mas também dar um salto na indústria brasileira.

*Wladimir Pomar é analista político e autor de A Revolução Chinesa (Editora Unesp).

Exibições: 100

Comentar

Você precisa ser um membro de Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI para adicionar comentários!

Entrar em Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

Comentário de Edson Machado da Silva em 9 fevereiro 2011 às 8:08

Pois é Fabricio...cada um defendendo o Seu...

O que mais me entristece é a total desunião entre os setores (primários, secundários e terciários), e o pior ainda é a desunião ente os pares (pessoas ou empresários do mesmo setor). E isso contribui para que mantenhamos no poder pessoas (políticos) com total desinteresse em defendernos, pois se nós, que somos pares, não conseguimos nos entender, ou nos arregimentar para defender o nosso espaço, nossa área, nossa classe, nosso umbigo... como conseguiremos demover da cabeças deles de pensarem somente em si e passar a defender os interesses da nação como nos países de primeiros mundo, por exemplo?

Não tenho nada contra à pessoa (o cidadão), mas o que Vc acha que o tiririca (escrevo propositadamente em minúsculo, pois não creio ser isso um nome próprio) poderá fazer por nós como sendo um de nossos representantes político? O que os vários contores, artistas, jogadores de futebol, palhaços, ... farão por nós no poder???

A industria nacional, em todos os seus âmbitos, sofre uma força totalmente desleal em relação ao Estado, pois esse, que tinha que dar condições favoráveis de essas existirem como força motriz na geração de emprego e renda, a cada ano inventa um tipo de imposto ou taxa diferente para engordar seus cofres, e eu não sei pra que (pensando como cidadão que acredita no governo) pois, tanto a saúde, quanto a educação, e a segurança, estão falidos; e isso sem contar com as estradas, os aeroportos, os portos....Se for colocar tudo, isso irá longe...rsrsrs

É engraçado quando vemos nos meios de comunicação que está faltando mão de obra especializada. Se o Estado não investe na educação, como conseguiremos gerar mão de obra especializada. E não me espanta quando vejo nos mesmos meios de comunicação que a criminalidade aumenta assustadoramente à cada dia.

Pois é meu amigo, vivemos, mais hoje do que antes, um terrível choque de identidade; e aqueles que tentam entender isso (o que é o n

Comentário de Sam de Mattos em 8 fevereiro 2011 às 21:32

A CHINA NÃO É NOSSA INIMIGA:

A China investiu e investe na indústria e educação ha 30 anos. Nós Brasileiros estamos abrindo nossos olhos AGORA.

Muitos industriais Brasileiros são despreparados. Precisamos mais de cabeças pensantes e educadas. Não adianta CHORAR. Esses são os fatos e “bate-boca” não trocara esse quadro: Temos arregaçar as mangas e começar fazer isso agora.  Urgente.

A China não é inimiga do Brasil.

A China cuida de seus melhores interesses - e CABE A NÓS BRASILEIROS A CUIDAR DOS NOSSOS.

A DEVALORIZACAO ARTIFICIAL da moeda Chinesa É REAL E EXISTE. “De ladinho”, com muito jeitinho, está pondo em todos nós.

DONA DILMA: O que os Jornais falam é verdade: O subsolo brasileiro está sendo vendido a PRECO DE BANANA.  Conheço até despachantes aduaneiros, REPETINDO, despachantes mais sofisticados, mais educados, uns com curso de engenharia e economia, estão saindo da área de importação/exportação, AREENDANDO TERRAS EM BASE DE LEASING (e.g., 99 anos de leasing) E FAZENDO UM SUB-LEASING DESSAS TERRAS COMO AREA DE MINERAÇÃO.  Fazem isto em Minas Gerais e Pará.

OLHO DONA DILMA, eu duvido que o PUDÊ possa lhe dar tantas “dicas” como nós do Blog Têxtil! Leia a gente, Dona Dilma. Nós somos a segunda maior força trabalhadora do Brasil, seguindo de perto os Metalúrgicos.

EM ANALISES FINAL nossa somos os piores inimigos de nós mesmos: Não a China. Ela somente nos explora porque somos OTÁRIOS, DESEDUCADOS, OPORTUNISTAS, TAPADOS, DESPREPARADOS e temos uma estrutura de PUDÊ venal, corrupta, obsoleta, incapaz e suja – tudo isso com algumas poucas e raras exceções.

AGORA BATO NA MESMA TECLA. O PODER ESTÁ AQUI DONA DILMA E AMIGOS. Temos mais terras produtivas do que a China. (E também de que nos EUA),

Temos 1,100,000,000 a menos boca para alimentar. 

TEMOS matéria prima ABUNDANTE.

TEMOS AGRICULTURA E PECUÁRIA.

Nós, Do

Comentário de Fabrício Leite em 8 fevereiro 2011 às 19:57

Certamente Edson! Você tem toda razão...

E o que você me diz da opinião do presidente da Associação dos varejistas que defende as importações uma vez que alega que nossa indústria não consegue acompanhar o crescimento deles...

Comentário de Edson Machado da Silva em 8 fevereiro 2011 às 19:36

Que "bonito"!!!

Ainda bem que no final da sua analise, vamos dizer assim, esse cidadão se apresenta como analista político, e não industrial ou econômico.

Corroborando ao que o nosso amigo Norberto diz, dê uma empresa, principalmente dos setores que estão sofrendo diretamente com a concorrência desleal dos países asiáticos, para ele gerir. Será que ele terá a mesma visão ao qual ele defende acima?

Abraços à todos!!!

Comentário de Fabrício Leite em 8 fevereiro 2011 às 18:55
O bacana deste BLOG é justamente a possibilidade de analisarmos diferentes pontos de vista e assim procurar fechar com maior precisão as ações a serem tomadas num futuro próximo!
Comentário de norberto canelada campos em 8 fevereiro 2011 às 18:50
interessante esta colocaçao. O articulista esquece apenas os custos de trabalhar no Brasil, carga tributaria, juros, infra estutura, custos de energia,burocracia e corrupçao endemica,etc,  aumentada violentamente nos ultimos governos. Facil culpar empresarios.

© 2024   Criado por Textile Industry.   Ativado por

Badges  |  Relatar um incidente  |  Termos de serviço