Nas contas de Bradesco e Santander, por exemplo, mesmo se os resultados do terceiro e do quarto trimestre forem positivos, a BRF poderá ter prejuízo no fim do ano – ainda que muito menor que o de R$ 372 milhões apresentado em 2016.
A seu favor, a BRF tem o fim da “tempestade perfeita” que se abateu sobre a empresa no início do ano, diz Gabriel Vaz de Lima, analista do Bradesco BBI. A Operação Carne Fraca, que apurou esquema de pagamento de propina a fiscais sanitários, lançou dúvidas inicialmente sobre a qualidade dos produtos da empresa. Com embargos à carne brasileira e clientes temerosos, a BRF teve queda na demanda e viu dispararem gastos com transporte e armazenamento de produtos.
A empresa também convivia com pressão nos custos causada pela alta do preço do milho, usado na alimentação dos frangos de Sadia e Perdigão, em 2016. Esses efeitos agora começam a se dissipar com a gradativa melhora nas exportações e estrutura de custos mais equilibrada na cadeia de produção.
“Conjunturalmente, o cenário está muito favorável à empresa”, afirma Ronaldo Kasinsky, analista do Santander. “Mas há dúvida sobre a capacidade execução. Vai acertar na gestão ou seguirá no processo de tentativa e erro?”.
Pressão. O temor de que problemas de gestão minem a recuperação da companhia, manifestado por analistas como Kasinsky, é compartilhado pelos fundos de pensão Petros (dos funcionários da Petrobrás) e Previ (Banco do Brasil), que são os principais acionistas da BRF, com 22% da companhia.
O anúncio de que o atual presidente, Pedro Faria, ficará até o fim do ano no cargo foi apenas a última de uma longa lista de trocas no alto comando da BRF. Desde 2013, quando a gestão do fundo de private equity Tarpon e do empresário Abilio Diniz teve início, foram cerca de 20 mudanças de executivos apenas nas vice-presidências da empresa – a conta é muito maior se consideradas diretorias e gerências. Na área financeira, por exemplo, foram cinco diretores em quatro anos – o último, Lorival Nogueira Luz Junior assumiu em setembro. Há outras áreas críticas como marketing e RH, ambas em seu quarto executivo desde então.
Descontentes com os resultados, os fundos têm pressionado por mudanças. Na administração, além de ajudarem a forçar a queda de Faria, contribuíram para a demissão do vice-presidente de integridade, José Roberto Pernomian, que tem condenações na Justiça. Ambos tinham apoio e eram alinhados ao empresário Abilio Diniz, presidente do conselho de administração da BRF.
Tensão. Segundo pessoas próximas à empresa, o clima nas reuniões do conselho tem sido pesado. O pedido de renúncia de um dos conselheiros independentes, Carlos Parcias, feito no fim de outubro, foi interpretado por pessoas próximas à companhia como mais um sinal de desgaste. Ele alegou motivos pessoais.
“Há dificuldade em entender quem está dando as cartas. E isso deixa todos confusos, sem saber se a situação se estabilizou ou não”, diz Kasinsky.
Por meio de nota, a BRF afirmou que não concederia entrevista por estar em período de silêncio em função da divulgação dos resultados, marcada para quinta-feira. A Petros afirmou que se reserva ao direito de não comentar assuntos estratégicos da companhia. A Previ não comentou o assunto.
Planos da BRF para subsidiária One Foods são adiados
O futuro da One Foods, subsidiária criada pela BRF para cuidar da produção de alimentos destinados ao público muçulmano, só deve ser definido em 2018. A divisão se tornou uma das principais apostas da BRF para crescer e valorizar suas ações – ontem, elas estavam cotadas a R$ 42,93; um ano antes, a R$ 52,87.
A BRF começou a se preparar no início de 2017 para estruturar a abertura de capital da One Foods no exterior, numa operação que, nos cálculos do alto escalão da empresa e de acionistas, poderia render US$ 1,5 bilhão.
Os planos tiveram de ser adiados com o surgimento da Carne Fraca. A operação mirou frigoríficos do País e envolveu a BRF, que chegou a ter funcionários presos.
Com isso, ganhou força entre acionistas a possibilidade de vender uma fatia diretamente a um investidor em vez de ir ao mercado, numa operação na Bolsa.
Mais recentemente, esse caminho passou a ser defendido também pela Tarpon, que tem 8,5% da BRF, e era uma das principais entusiastas da oferta pública de ações da One Foods.
A concretização do plano – seja qual for o caminho escolhido – esbarra, no entanto, em dois obstáculos. Primeiro, a BRF precisa recuperar o desempenho da One Foods. No segundo trimestre, a companhia apresentou margem de lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda) de só 1,6% frente aos 15,2% registrados um ano antes.
Há ainda um debate intenso sobre como deve ser a relação entre BRF, que controla a produção e é dona das marcas, e a subsidiária, responsável pela venda nos mercados do Oriente Médio.
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