Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

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“Não temos nenhuma segurança de que a situação vai mudar para melhor”

Para o cientista político e especialista do Instituto Millenium, José Álvaro Moisés, a escolha dos novos ministros do segundo mandato do governo Dilma baseada na distribuição de cargos a partidos com o objetivo de obter apoio no Congresso Nacional amplia a descrença da população nos políticos e no próprio sistema democrático. “Ao adotar um critério de formação do ministério que visa apenas assegurar uma maioria em quaisquer circunstâncias, a presidente contribui para aumentar a desconfiança e o descrédito, não apenas do governo dela, mas nas instituições democráticas”, afirma.

Segundo o cientista político, o principal problema na composição do novo ministério do governo Dilma não é a falta de formação técnica dos escolhidos, como muita gente tem apontado, mas os critérios que norteiam a seleção dos nomes. “Em nenhum lugar no mundo existem ministérios formados apenas por técnicos”, explica, acrescentando: “Entraram partidos e pessoas que, muitas vezes, acabaram de ser derrotados nas eleições. Isso é mais grave porque, em certo sentido, significa que esses políticos não obtiveram o apoio dos eleitores para permanecer nas suas funções”.

As indicações dos ministros são parte da estratégia do governo para obter apoio dos partidos nas votações do Congresso Nacional. Segundo pesquisa do jornal “Estado de São Paulo”, as siglas estão menos fiéis à Dilma do que em 2011. O estudo revela que a média de adesão às propostas da presidente no último ano do primeiro mandato foi de 68% dos deputados presentes. Em 2011, a taxa ficou acima de 80%.

A forma como o governo está administrando a composição dos ministérios demonstra, na opinião de José Álvaro, que, do ponto de vista político, o segundo mandato se caracterizará pelo continuísmo. “Não temos nenhuma segurança de que a situação vai mudar para melhor”.

A escolha dos ministros também merece críticas por demonstrar pouco compromisso do governo com o combate à corrupção. “Aparentemente, a presidente Dilma não está levando em conta critérios republicanos e nem as reclamações da sociedade brasileira, que quer dar um basta na corrupção”, afirma o cientista político.

Além dos critérios empregados na composição dos 39 ministérios, o cientista político analisa o conceito de governabilidade, a percepção da opinião pública sobre as decisões da presidente reeleita e a expectativa de mudanças na condução da política nacional. Leia a entrevista:

Instituto Millenium: A presidente Dilma Rousseff dividiu os ministérios entre os partidos da sua base de apoio. A qualificação técnica dos indicados parece não ser uma preocupação da presidente. Para a Defesa, Dilma escolheu Jaques Wagner (PT), sem experiência na área. Como o viés político da indicação dos ministros impacta na qualidade das políticas públicas?

José Álvaro Moisés: O problema não é se os políticos indicados para os ministérios têm qualificação técnica ou não. Em regimes democráticos de todo o mundo cargos importantes podem ser ocupados por políticos. A questão é quais são os programas desses políticos e como eles são capazes de articular, mobilizar as equipes técnicas dando, ao mesmo tempo, autonomia para que elas possam desenvolver o seu trabalho. Isso depende, em grande parte, do planejamento e da apresentação dos objetivos de cada ministério aos eleitores.

No caso da reeleição da presidente Dilma, o problema não é o fato de ela ter indicado políticos, mas o critério adotado para compor a coalizão majoritária. O critério adotado não está suficientemente claro do ponto de vista público. Entraram partidos e pessoas que, muitas vezes, acabaram de ser derrotados nas eleições. Isso é mais grave porque, em certo sentido, significa que esses políticos não obtiveram o apoio dos eleitores para permanecer nas suas funções.

O critério adotado para a formação do presidencialismo de coalizão é extremamente pragmático se levar em conta, exclusivamente, o objetivo do governo do Partido dos Trabalhadores (PT) e da presidente Dilma, desde o mandato anterior, de obter maioria no Congresso. Ainda assim, ela teve uma série de problemas para aprovação de projetos no Congresso Nacional durante o primeiro mandato. A administração, propriamente dita, da coalizão majoritária é incompetente, sem estilo e cuidado. Em alguns casos, essa administração está sendo transferida para outras pessoas que não são necessariamente as mais bem preparadas. O ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante (PT), esta recebendo críticas dentro do próprio partido. O que significa que ele não está obtendo consenso para desenvolver as políticas adotadas em sua própria área.

Em nenhum lugar no mundo existem ministérios formados apenas por técnicos. A questão é: como os políticos recebem mandatos e dão autonomia e independência para os corpos técnicos desenvolverem seus programas. Mas, o programa não é uma coisa aleatória, depende do planejamento. O que nós não sabemos é o que cada um desses ministros vão fazer. Até agora nenhum ministro, técnico ou não, explicou o que vai fazer. Nem o governo teve o cuidado de explicar os critérios utilizados para a formação da coalizão majoritária.

Imil: O combate à corrupção foi uma promessa de campanha reforçada pela presidente no discurso da posse. O pastor George Hilton, novo ministro dos Esportes, foi flagrado com R$ 600 mil em caixas de papelão no aeroporto da Pampulha, Belo Horizonte (MG), em 2005. O novo ministro dos Transportes é Antônio Carlos Rodrigues (PR). Em 2011, o ex-ministro dos Transportes Alfredo Nascimento, também do PR, foi afastado por envolvimento em escândalo de corrupção. Como o senhor avalia essa situação?

José Álvaro Moisés: É um problema de critério na formação da coalizão majoritária. Aparentemente, a presidente Dilma não está levando em conta critérios republicanos e nem as reclamações da sociedade brasileira, que quer dar um basta na corrupção. Ela indicou nomes que não passaram por uma verificação para evitar a indicação de políticos envolvidos em fatos de corrupção.

Claro que isso só agrava a preocupação da sociedade com o tema da corrupção. Ao contrário do que a presidente Dilma disse, isso mostra que o tema da corrupção não está sob controle. Não é a presidente da República quem comanda diretamente o processo de fiscalização e controle da corrupção, são as instituições do chamado “sistema de integridade”, ou seja, o Ministério Público, a Polícia Federal, a Justiça Federal, a Controladoria Geral da União, os Tribunais de Contas e o próprio Congresso Nacional. Essas instituições vêm tomando uma série de medidas na questão da corrupção. Agora, cabe à presidente não indicar pessoas que tenham indícios de envolvimento em corrupção. Não houve esse cuidado.

Imil: A busca da governabilidade é um dos argumentos usados pela presidente Dilma para justificar a formação das suas alianças. Esse argumento é válido?

José Álvaro Moisés: O conceito de governabilidade foi introduzido nos anos 1970 pela Ciência Política. A governabilidade também é um atributo de quem é governado, não apenas de quem governa. A governabilidade é uma coisa pensada, estruturada para atender aqueles que são governados. Desse ponto de vista, o critério de formar uma maioria sem grandes princípios, apenas para assegurar que as propostas do Executivo sejam votadas, não garante a governabilidade. Mesmo porque, governabilidade não é uma coisa que possa ser resolvida apenas pelo poder Executivo, ela é um atributo de todas as representações dos governados. Portanto, o papel do Congresso Nacional também é extremamente importante para criar governabilidade.

Quando o Congresso fiscaliza, controla e, eventualmente, não aprova alguma medida, ou agora, como no caso do PMDB, que quer eleger um presidente do Congresso que não seja do mesmo partido do Executivo, são maneiras de qualificar a governabilidade.

O governo se baseia em um conceito errôneo de governabilidade, segundo o qual, governabilidade é só aquilo que o Executivo quer aprovar. Governabilidade não é só isso, é também aquilo que é necessário para os governados. Isso não pode ser verificado apenas pela vontade do Executivo. Isso depende também do Legislativo e do Judiciário.

Imil: O senhor acredita que a montagem dos ministérios baseada no loteamento e na barganha política contribui para aumentar a descrença da população nos políticos e no próprio sistema democrático?

José Álvaro Moisés: Contribui. Tenho conduzido pesquisas na Universidade de São Paulo (USP) sobre a questão da desconfiança dos eleitores nas instituições. Um dos principais elementos que provocam a desconfiança é a dificuldade dos políticos de representarem a população efetivamente. A insuficiência desse mecanismo faz com que as pessoas não tenham confiança nos partidos, no próprio Congresso Nacional e nos políticos em geral. Ao adotar um critério de formação do ministério que visa apenas assegurar uma maioria em quaisquer circunstâncias, a presidente contribui para aumentar a desconfiança e o descrédito, não apenas do governo dela, mas nas instituições democráticas.

Imil: Na opinião do senhor, que critérios deveriam ser adotados na indicação dos chefes das diferentes pastas?

José Álvaro Moisés: O critério mais importante é apresentar um programa para a opinião pública e mostrar o que cada partido vai fazer em relação a esse programa.

Imil: É comum nas democracias a indicação de ministros sem critérios e programas claros?

José Álvaro Moisés: Isso varia muito de caso para caso. O problema é que o sistema político brasileiro tem uma série de deficiências que leva os presidentes a formar maioria para poder governar. Muitas vezes, nesse processo de formação de maioria, o critério republicano, o critério de esclarecimento da opinião pública e o critério de especificar no programa do partido que foi eleito qual o aspecto que será desenvolvido por cada partido não são seguidos. Não é que o Brasil seja o único no mundo a indicar ministros sem critérios, mas nos últimos anos têm sido assim. Em particular, nas administrações do PT.

Imil: A partir da formação da equipe ministerial, é possível apostar em mudanças ou mesmo na reforma política, outra promessa de campanha da presidente, nos próximos quatro anos, ou senhor aposta no continuísmo?

José Álvaro Moisés: Muito provavelmente, do ponto de vista político, vai ocorrer o continuísmo. Estamos vendo isso nos primeiros passos que o governo deu, pela forma como o governo está administrando a composição dos ministérios. É possível que algumas mudanças sejam propostas, principalmente, na área da economia. A presidente já tomou uma série de medidas nessa área e mesmo no caso de alguns benefícios sociais. Ela adotou uma série de diretrizes para retomar o crescimento da economia que vão contra tudo aquilo que ela tinha dito que não queria fazer durante a campanha eleitoral. Isso é uma indicação de que mudanças podem ocorrer, mas não necessariamente serão boas mudanças. Não temos nenhuma segurança de que a situação vai mudar para melhor. As afirmações, as promessas de mudanças não foram suficientemente explicitadas. Em algumas áreas está claro que ela vai tomar medidas que não dizem respeito ao interesse do país. Na área da economia, é evidente que é preciso criar estabilidade, fazer ajustes e retomar o crescimento. Mas não está claro por que isso afetaria os benefícios sociais. Eles disseram que não mexeriam nisso.

http://imil.org.br/divulgacao/entrevistas/temos-nenhuma-segurana-de...

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