Negócios de impacto unem inovação e propósito para transformar desafios em oportunidades sustentáveis, gerando valor e crescimento responsável.
O Brasil sediará em novembro o principal evento da agenda climática global, a 30ª Conferência das Partes, a COP 30, da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC, na sigla em inglês). A expectativa é de que sejam definidos entre as Partes – os 198 países que compõem a convenção – acordos importantes para frear as mudanças climáticas e promover um futuro mais sustentável e justo.
A COP 30 também terá um impacto significativo no mundo corporativo ao lançar luz sobre o papel das soluções de mercado no enfrentamento de desafios sociais e ambientais. Os riscos ambientais e o aumento da desigualdade social estão entre os principais desafios globais apontados pelo Global Risks Report 2025, estudo produzido pelo Fórum Econômico Mundial. Esse cenário expõe desafios, sejam regulatórios, financeiros e reputacionais, como oportunidades de negócios, investimento e fortalecimento reputacional.
Os negócios de impacto, que surgiram nos anos 2000, são baseados em modelos que integram a sustentabilidade em suas estratégias de longo prazo. Esses empreendimentos possuem missão e soluções destinadas à resolução de problemas sociais e ambientais, ao passo que buscam monitorar seu impacto e gerar resultado financeiro positivo e sustentável.
O último Mapa de Negócios de Impacto Socioambiental, conduzido pela Pipe.Social e pelo Quintessa e divulgado em 2023, indica que essas empresas estão mais sólidas e em franca expansão, com impacto em todo o território nacional. Elas se destacam pela oferta de soluções tecnológicas, inovadoras e baseadas em ciência para desafios como inclusão produtiva, educação e serviços financeiros, e estão influenciando novos setores, como a economia verde.
Mas qual o caminho para transformar positivamente a sociedade e alcançar retornos financeiros? Para Dani Junco, fundadora e CEO da B2Mamy, empresa brasileira focada em empoderar mães por meio de educação, networking e construção de comunidade, os negócios de impacto devem prestar atenção no que as pessoas querem comprar.
“Não tem propósito bom que resista a um produto ruim. Um produto ruim é aquele que não tem margem, que as pessoas não querem comprar.” No fim do dia, mesmo que seja uma ONG, uma organização do terceiro setor, empresa privada ou negócio social, é preciso de um produto que venda.
“A nossa empresa é um Robin Hood. Se eu fosse vender impacto social, provavelmente os cheques não estariam na mesa”, comenta a idealizadora da femtech que já apoiou mais de mais de 200 mil mulheres e cresceu 22% em receita no ano passado, em comparação com o ano anterior.
A trajetória da B2Mamy coincide com as dificuldades de inúmeras empresas de impacto de escalar seus negócios e se tornarem sustentáveis. A empresa nasceu em 2016 com a criação de uma aceleradora, incubada pelo Google, com foco em mães empreendedoras. Uma resposta à experiência pessoal de Dani diante dos desafios para equilibrar a maternidade e a carreira após o primeiro filho.
Quando milhões de brasileiras perderam suas fontes de renda durante a pandemia, a B2Mamy precisava encontrar um modelo de negócios que fosse lucrativo e que permitisse atingir um público maior. Assim, expandiu em 2019 suas ofertas para uma plataforma B2B2C que conecta mães com recursos de comunidade, educação, networking, saúde e bem-estar. A plataforma também permite às marcas atingirem este público-alvo por meio de campanhas de awareness, testes de produtos e iniciativas de impacto social.
No mesmo ano, a abertura da Casa B2Mamy, um espaço físico na capital paulistana, marcou a entrada no segmento de coworking e eventos. O espaço com abordagem “family friendly” já corresponde a 30% da receita.
De olho no cheque que as marcas destinam para influencers e direcioná-lo para sua comunidade, a aposta da B2Mamy para este ano está no potencial das comunidades para gerar influência. “Cada mãe é uma grande plataforma de influência positiva ou negativa no círculo dela. Elas têm pelo menos quatro grupos de WhatsApp com outras cem mães”, conta As marcas podem usar a comunidade para se conectar com essas nano e microinfluenciadoras, que também ganham uma nova fonte de renda.
Mudar o fluxo do dinheiro para a mão das mulheres, principalmente das mães, é a principal mudança social que a B2Mamy promove. “Os homens circulam por muitos ambientes para fazer negócios, e o principal diferencial da nossa comunidade é permitir que as mulheres estejam mais capacitadas e conectadas para serem líderes e livres economicamente.”
Na visão da CEO, a onda anti-ESG liderada por Donald Trump nos Estados Unidos inevitavelmente reverbera no ecossistema brasileiro de negócios de impacto, contudo, em proporções menores do que quando a agenda começou a ganhar força. “Essas iniciativas já estão mais consolidadas do que há dois anos, principalmente para as empresas que têm esses esforços como um valor. Além disso, nós não estamos vendendo impacto, estamos fazendo impacto.”
Muito além da sigla ESG, o que importa é o impacto social gerado, enxerga Rafaela Cavalcanti, CEO e cofundadora da CloQ, fintech brasileira que fornece nanocrédito para indivíduos com histórico de crédito limitado ou nenhum. Ela enfatiza a necessidade de instituições financeiras alcançarem populações carentes. “Bancos e financeiras precisam de mais clientes para crescerem e a pirâmide só funciona se a base estiver também sólida e resistente.”
Para a executiva, o que difere as empresas de impacto das startups tradicionais é a conexão direta dos fundadores com o problema que estão tentando resolver. “Eles trabalham de uma forma emocional e conectada na solução desses problemas, o que implica em uma motivação além de ganhar dinheiro”, pontua.
Rafaela nasceu em Recife em uma família de empreendedores informais e viu de perto as dificuldades dos pais, que dependiam do negócio como única fonte de renda. Pequenos empreendedores como eles muitas vezes não têm conta bancária, enfrentam restrições de crédito por estarem negativados ou não podem esperar por análises demoradas em emergências, recorrendo a agiotas e pagando juros exorbitantes.
Após se formar em administração, Rafaela foi trabalhar e estudar nos Estados Unidos, quando se especializou como consultora de internacionalização de empresas. Passou por Índia e China e decidiu fazer um mestrado na Holanda, onde conheceu o atual sócio, o holandês Koen Lassooij.
Quando a visitou na Europa, a mãe de Rafaela contou que tinha recorrido a um agiota para custear a viagem. Ao compartilhar a situação com o sócio europeu, que havia desenvolvido para um banco internacional um score de crédito que utilizava dados não financeiros, percebeu que esse problema era particularmente comum no Brasil.
Em 2018, criaram a CloQ, fintech selecionada pelo programa Startup Chile. Logo os fundadores identificaram o Brasil como mercado ideal devido às 40 milhões de pessoas excluídas do sistema financeiro. “A CloQ promove inclusão financeira por meio de nanocréditos, que são empréstimos de até R$ 500, para indivíduos com histórico de crédito limitado, ajudando-os a construir uma pontuação positiva e acessar serviços financeiros.”
A fintech utiliza dados alternativos para avaliar crédito, ampliando seu alcance a clientes excluídos do sistema tradicional. Com mais de 100 mil usuários, seu público inclui trabalhadores formais que ganham até três salários e pequenos empreendedores. A CloQ participou de programas de aceleração como TC Impacta e Serasa, mas enfrentou desafios, como a desconfiança dos usuários em relação ao modelo de negócios e o ambiente de risco durante a pandemia, quando optou por crescer gradualmente enquanto outras empresas reduziram a oferta de crédito.
Para superar esses obstáculos, a empresa focou em construir uma reputação sólida, crescendo pelo “boca a boca” em vez de investir em marketing. O app já possui clientes em diversas regiões do País, com vídeos de depoimentos atingindo 30 mil visualizações.
A estratégia de crescimento inclui expandir parcerias B2B para conectar usuários a outras instituições financeiras. Em 2022, a CloQ adicionou 25 mil usuários à sua base, atingindo receita superior a R$ 1,5 milhão. Até 2025, planeja dobrar suas operações e iniciar as primeiras ações no B2B.
A ciência e a tecnologia são grandes aliadas na solução de problemas de alta complexidade e na construção de uma sociedade mais igualitária e ambientalmente sustentável. Nesse sentido, a Wylinka busca fomentar a inovação e o empreendedorismo e apoiar cientistas que desejam se tornar empreendedores, impulsionando o desenvolvimento de inovações científicas.
A organização de impacto surgiu em 2013 a partir da paixão de Ana Calçado, doutora em administração e inovação e mestre em bioquímica, e de seus sócios pela ciência e da percepção de que o mercado não dialogava com a inovação científica. Aprovada em 2004, a Lei de Inovação, que permitiu maior contato entre a universidade e o mercado, também contribuiu para a criação da empresa.
A Wylinka trabalha com projetos que capacitam cientistas, desenvolvem soluções e negócios e impulsionam o desenvolvimento de ambientes de inovação. Em 12 anos, a deep tech capacitou mais de 10 mil pessoas, sendo 2 mil somente no ano passado, e agora está focada em expandir seu alcance para regiões como a Amazônia e o Nordeste.
“Muitas vezes o cientista está promovendo a inovação, mas não pretende empreender. Nós direcionamos o desenvolvimento dessas tecnologias e dos processos para que elas cheguem a mais pessoas”, destaca a CEO e cofundadora da organização.
A abordagem da Wylinka para adaptar seu modelo de negócios às mudanças nas condições macroeconômicas é manter seu foco em sua missão, sendo flexível e adaptável. Ana reconhece que o mercado de inovação científica envolve disposição para risco e que os recursos podem ser escassos, especialmente em tempos de instabilidade econômica.
“Buscamos entender o contexto atual e adaptar nossas ofertas para atender às necessidades de parceiros em potencial. Isso inclui explorar projetos com resultados de curto prazo para demonstrar valor e atrair investidores que podem hesitar em investir em projetos de longo prazo e alto risco.”
Com base nessa experiência, a cofundadora da Wylinka recomenda que empreendedores de impacto socioambiental sejam flexíveis para se adaptar às demandas, encontrar formas de escalar seus negócios e torná-los sustentáveis. “Mesmo com paixão pela tecnologia ou solução, é preciso ter flexibilidade para entender o que o mercado está pedindo. Isso significa fazer uma leitura do mercado e entender onde estão as oportunidades e como comunicar o valor do negócio para aqueles que não o enxergam como prioridade.”
Diante do momento incerto das agendas ESG, a executiva realça que o propósito de promover a inovação científica é inegociável para a Wylinka. “Nesse cenário, buscamos parceiros que também não abrem mão dessa missão.”
As principais áreas de foco da organização para 2025 são mudanças climáticas, segurança alimentar, saúde e industrialização. “A ciência brasileira tem potencial para gerar soluções significativas nessas áreas em nível global”, finaliza Ana.
Izabela Mendes, doutora em genética e diretora fundadora da MetaGen Soluções Moleculares, lembra que a ciência no Brasil ainda é muito negligenciada. “Há pouco interesse e implementar as inovações científicas é ainda mais difícil. O grande diferencial será quando os cientistas dominarem a linguagem dos negócios, conseguindo se comunicar de forma eficaz com os empresários”.
A MetaGen é uma empresa brasileira de consultoria ambiental especializada em análise ambiental de DNA que busca traduzir a complexidade da genética para o mercado. Além de Daniel Teixeira, também doutor em genética, a organização conta com o sócio Vitor Borges, consultor ambiental que traz essa bagagem mercadológica.
Enquanto ainda estava no doutorado, Izabela percebeu um aumento na demanda por análises genéticas do setor privado e fundou a empresa em 2021. Seis meses após abrir o CNPJ, fechou o primeiro contrato. “Enquanto cientista, havia um incômodo de produzir dados em pesquisas científicas sem aplicá-los diretamente.”
A Metagen, que participou do programa de aceleração de negócios BNDES Garagem, utiliza análise ambiental de DNA, método não invasivo que coleta amostras ambientais (como água, solo e ar) para identificar espécies presentes em uma área. A técnica contrasta com os métodos tradicionais que exigem capturar e matar organismos.
Essas análises genéticas são utilizadas no monitoramento ambiental, ajudando empresas a avaliar a biodiversidade de um local. Elas permitem monitorar impactos ambientais, detectar espécies invasoras e fornecer dados para conservação. São consideradas soluções baseadas na natureza (SBN), técnicas inspiradas na natureza que proporcionam benefícios ambientais e sociais.
“Estamos fazendo diferença para aquela espécie que está ameaçada ou, então, para aquela comunidade que sofrerá com o impacto ambiental. Dessa forma, buscamos gerar um impacto positivo, tanto social quanto ambiental, no ecossistema em que atuamos.”
A análise genética para monitoramento ambiental é uma metodologia nova, regulamentada e amplamente aplicada no hemisfério Norte, mas ainda aguarda aprovação no Brasil. O principal desafio, segundo Izabela, é convencer as empresas de que essa metodologia é confiável e implementar algo novo.
Dentre os principais clientes estão consultorias ambientais, empresas de mineração, energia e reflorestamento, bem como institutos de pesquisa, privados ou pertencentes às universidades, e órgãos ambientais governamentais, como o ICMBio. A Metagen experimentou um aumento de 500% na demanda somente em janeiro de 2025, em relação ao ano passado. Esse crescimento é atribuído à crescente conscientização sobre questões ambientais e à necessidade de soluções inovadoras.
Os dados do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) indicam que os investimentos globais em soluções baseadas na natureza totalizaram US$ 200 milhões em 2022, enquanto as atividades que prejudicam a natureza movimentaram 30 vezes mais recursos financeiros. “Para alcançarmos as metas climáticas e reverter as crises associadas de mudança do clima e perda de biodiversidade, o mundo tem de investir US$ 4,1 trilhões nessas soluções.”
A cientista e executiva da Metagen acredita que a COP 30 em Belém deve acelerar ainda mais a análise ambiental de DNA no Brasil, pois reunirá as principais partes interessadas e aumentará a conscientização sobre o potencial da tecnologia.
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