Fonte:|noolhar.com|
Muitas coisas novas estão sendo desenvolvidas a partir da nanotecnologia. Só no laboratório do professor Oswaldo Luiz, na Unicamp, há desenvolvimento de produtos como tecidos anti-bacterianos e materiais para retirar a poluição de efluentes
Juliana Matos Brito
Em 1989, ele já estudava sistemas nanoestruturados. Em 1991, ele publicou o primeiro artigo sobre o assunto em publicação internacional. De lá pra cá, são muitos artigos, muitas pesquisas, 17 patentes nacionais e uma internacional em nanomateriais. O professor Oswaldo Luiz Alves, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), é um dos principais pesquisadores na área de nanotecnologia.
Ele esteve, na última semana, em Fortaleza para participar de uma banca de tese no Departamento de Física da Universidade Federal do Ceará (UFC) e para ministrar a aula inaugural do programa de pós-graduação em Química da UFC sobre nanotecnologia, desenvolvimento, oportunidades e desafios.
Além da pesquisa e dos produtos desenvolvidos, ele e sua equipe conseguem firmar uma interessante interação entre universidade e empresas, o que resulta em produtos que podem beneficiar a sociedade. Hoje, segundo ele, eles já desenvolveram, por exemplo, um tecido anti-bacteriano com nanomateriais e um nanoecomaterial para retirar a poluição colorida de rios e lagoas. ``Você não faz desenvolvimento tecnológico dentro da universidade. Todo o desenvolvimento tecnológico é feito no chão da fábrica``, acredita.
Em entrevista ao Ciência & Saúde, o professor Oswaldo fala um pouco do início dos estudos na área de nanotecnologia, quando ainda nem usavam esse nome para o estudo de sistemas nanoscópicos, além de um pouco sobre o panorama atual brasileiro das pesquisas na área.
O POVO - O senhor é formado em Química. Como surgiu o interesse em estudar nanotecnologia?
Oswaldo Luiz - A questão da nanotecnologia está bem lá atrás. Nós estudamos esse sistema pequeno muito antes dele ter o nome de nanotecnologia. A gente chamava de sistema nanoscópico. Nós tínhamos um contrato com a Telebrás e dentro desse contrato nós tínhamos de fazer o desenvolvimento de materiais com propriedades óticas bem especiais, na Unicamp. Foi nesse momento que nós começamos a estudar as nanopartículas de semicondutores embebidas em vidros, para usar como eventuais substratos para as telecomunicações óticas. E lá em 1989, nós fizemos as primeiras nanopartículas. E fizemos a nossa primeira publicação internacional sobre o assunto em 1991. Desenvolvemos muito conhecimento sobre esse tipo de partículas, mas aí veio a privatização da Telebrás. E essa privatização foi terrível porque os contratos todos foram encerrados. E aí como a gente já tinha esse conhecimento, começamos a desenvolver esse trabalho no Institudo de Química da Unicamp. E a coisa foi indo, foi se desenvolvendo, de maneira que hoje temos um grupo bastante consolidado na área de nanomateriais. Trabalhamos com vários aspectos da nanotecnologia, inclusive com os riscos da nanotecnologia, na medida que todos os trabalhos que produzimos estão sendo usados para testes.
OP - Há alguma novidade sobre os riscos que os nanomateriais podem porventura trazer?
Oswaldo - A novidade é que na verdade existe uma zona cinzenta entre os impactos da nanotecnologia no meio ambiente e na saúde humana. Como a nanotecnologia está se transformando em uma grande indústria, adicionou-se a esse tipo de problema a questão de problemas ou doenças em pessoas que trabalham com isso em setores industriais. Então, tem que haver respostas para isso porque tem que haver regulações para isso. E a melhor regulação é conhecer esse sistema. Foi aí que eu parti para uma rede bem grande, de 15 laboratórios, que estão fazendo os mais diferentes testes envolvendo diversos tipos de nanoestruturas.
OP - O senhor já tem algumas patentes de nanomateriais produzidos pela sua equipe, não é?
Oswaldo - O laboratório tem 18 patentes e dessas 18 patentes uma delas é internacional. E essa patente internacional está relacionada com tecidos anti-bacterianos, ou seja, são tecidos impregnados com partículas que apresentam essa propriedade anti-bacteriana. São tecidos para a área hospitalar.
OP - Esse produto já está sendo produzido?
Oswaldo - Esse não. Esse ainda tem uma patente internacional, estamos em negociação. Mas um outro produto que nós desenvolvemos, o nanoecomaterial, é um produto licenciado, pela Unicamp para uma empresa, e está em fase inicial de comercialização. O produto é desenvolvido em laboratório, com características nanométricas, e cuja a função é fazer remediação ambiental de efluentes de indústrias téxteis. Ele sequestra a cor dos rios. Tira a poluição colorida. Nós ainda temos patentes em vidros especiais para a área de telecomunicações, e em nanocompostos.
OP - Qual a importância da interação entre Univer sidade e empresas para a pesquisa?
Oswaldo - Essa é uma questão chave porque o conhecimento científico é feito dentro da universidade. A concretude do conhecimento científico aparece dentro das empresas. Você não faz desenvolvimento tecnológico dentro da universidade. Todo o desenvolvimento tecnológico é feito no chão da fábrica. Não é só o problema de você ter uma coisa que funcione, mas precisa ter mercado, precisa de matéria prima disponível, de marketing da empresa para ela poder vender e precisa atender uma necessidade da sociedade. Da nossa experiência do relacionamento com o setor produtivo, você tem que, ao fazer um contato com a empresa, estabelecer uma cumplicidade, ou seja, o projeto científico que vai ser desenvolvido é de interesse da empresa mas ambos tem de trabalhar juntos .
OP - E acaba dando um retorno para a sociedade em relação ao que é produzido na Universidade...
Oswaldo - Isso é importante porque você dá visibilidade ao trabalho que é feito nos institutos de pesquisa, nas universidades... E a gente tá vivendo uma situação muito importante. O Brasil deixa de ser um país caudatário, isto é, que está na cauda dos processos, e assume um protagonismo.
OP - Hoje, no Brasil, está mais fácil essa comunicação entre Universidade e empresa?
Oswaldo - Certamente nós temos muito o que caminhar, mas já avançamos bastante.
OP - Qual o futuro da nanotecnologia?
Oswaldo - Acho o seguinte, nós estamos no limiar de um novo tempo e nós estamos observando que vários fenômenos que nós jurávamos de pé junto que ele funcionava de determinado jeito, e a gente tá vendo que a gente tem que deixar nosso olhar mais rigoroso sob determinadas coisas. E se você me perguntar quais as áreas serão mais impactadas pela nanotecnologia, talvez eu tivesse coragem de fazer uma observação: áreas de materiais, sem a menor dúvida, que pode servir para aviação, para transporte, para siderurgia; e sob as ciências da vida. E quando eu falo de ciências da vida, eu falo de tratamento, diagnóstico, em coisas que afligem sobremaneira a população.
OP - Quando o senhor começou a estudar a nanotecnologia em 1989, tinha essa dimensão?
Oswaldo - Não. Essa dimensão fui construindo ao longo do tempo. Eu tinha a ideia de que a gente estava trabalhando com um sistema que tinha um grande potencial para as telecomunicações. Hoje temos uma concepção clara de toda essa evolução. Junto com isso, uma questão nos preocupava muito era o impacto da nanotecnologia para o meio ambiente e para o ser humano.
OP - Há algo negativo? Algum prejuízo já foi identificado?
Oswaldo - Não. Até esse momento nós não temos nenhum caso absolutamente concreto. O que a gente tem são casos que acham que é nanotecnologia, mas não é. O exemplo mais emblemático disso foi um produto de limpeza usado em hospitais da Alemanha, há uns dois anos. Se imaginava que o produto, cujo nome era Magic Nano, tivesse causado problemas respiratórios e estomacais em algumas pessoas. Depois ficou claro que o produto só usava o nome nano como fantasia, não tinha nada de nanotecnologia. De qualquer forma, o que é importante é que esse debate sobre riscos têm de começar a acontecer. Tem que ir para a sociedade.
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