O futuro da Inteligência Artificial depende, sim, da capacidade do setor de romper com padrões excludentes.
Imagem: Shutterstock
Nos bastidores da tecnologia, um padrão persiste há décadas: a ausência de mulheres nos espaços de tomada de decisão. Se a Inteligência Artificial (IA) promete transformar o mundo, por que sua construção, no aspecto da diversidade e inclusão, ainda reflete um modelo tão ultrapassado? O aspecto que vemos desta lacuna não é fruto do acaso, mas sim o resultado de uma construção histórica que excluiu, apagou e subestimou a presença feminina no setor.
De acordo com o relatório “Women in AI”, desenvolvido pela consultoria tributária Deloitte e AWS (Amazon Web Service), 47% da força de trabalho no setor de tecnologia em geral nos Estados Unidos é composta por mulheres. Contudo, esse número despenca para apenas 26% no campo de dados e Inteligência Artificial. Essa disparidade não ocorre apenas por falta de interesse ou qualificação, mas porque, historicamente, a tecnologia foi moldada por estruturas que dificultam a ascensão feminina.
Tal exclusão, que remonta ao passado, ainda se perpetua no presente. Um exemplo recente é o corte de programas de diversidade por empresas como a Meta, que foram de certa forma impulsionadas pelo fim das políticas de ações afirmativas nos Estados Unidos. Essas decisões retroativas afetam diretamente a inclusão feminina no setor, ignorando uma luta de anos para a conquista de seu lugar.
Uma medida dessa não apenas retrocede uma longa trajetória, mas também ignora o esforço aplicado até hoje, reforçando barreiras que já eram bastante desafiadoras. Quando buscamos o histórico da presença feminina no universo da Inteligência Artificial, vemos que não é nada recente.
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Ada Lovelace é considerada a primeira programadora de computadores do mundo, quando cooperou com Charles Babbage na construção de uma máquina analítica, em 1833. Outra referência é Joan Clarke, criptoanalista que ajudou a decodificar o sistema de criptografia nazista na Segunda Guerra. Ainda que haja o pioneirismo, essas mulheres foram praticamente apagadas e outras ainda lutam por espaço no setor até hoje.
Nesta nova geração, importantes nomes deviam ser mais evidenciados, como a indiana Anima Anandkumar, diretora de aprendizagem de máquina na NVIDIA, e a brasileira Gabriela de Queiroz, diretora de Inteligência Artificial na Microsoft for Startups, que criou iniciativas como IA Inclusive e R-Ladies, focadas em aumentar a participação feminina na tecnologia.
Temos ainda a diversificação cultural trazida pelas mulheres, como, por exemplo, a chinesa Fei-Fei Li, cofundadora do ImageNet, que desempenhou um papel essencial na evolução dos algoritmos de visão computacional, e a israelense Daphne Koller, cofundadora da empresa de tecnologia Coursera, que contribuiu para o desenvolvimento de ferramentas de IA para personalização do aprendizado e suporte a educadores.
Neste cenário desigual, a questão de equidade no setor traz um fator delicado, que se enquadra na qualidade da IA afetada pela falta de diversidade. Isso porque modelos de Inteligência Artificial são treinados a partir de dados que carregam as mesmas visões da sociedade, mas que, por diversas vezes, são distorcidas. Ou seja, a equipe responsável pelo desenvolvimento dessas soluções não reflete a diversidade do mundo real, trazendo um grande risco de perpetuação de preconceitos.
É preciso que haja esforços coordenados vindos de empresas, universidades e instituições que formam os profissionais de tecnologia. Essa mudança estrutural bastante esperada e necessária só virá, de fato, quando as organizações de todas as esferas assumirem a responsabilidade de criar ambientes mais inclusivos. Projetos eficazes, como a criação de programas de mentoria e networking, assim como a contratação e promoção de profissionais nas organizações, são caminhos que precisam ser percorridos.
A diversificação das equipes é um fator determinante para a evolução da própria tecnologia, que precisa ser pensada e desenvolvida por profissionais com diferentes experiências e visões de mundo, sobretudo, comprometidos com mudanças afirmativas no setor.
O futuro da Inteligência Artificial depende, sim, da capacidade do setor de romper com padrões excludentes e construir um ecossistema em que mulheres possam, de fato, sentar à mesa e transformar essa revolução tecnológica em uma revolução para todos.
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