Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

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“O Brasil não é mais a bola da vez”

A recuperação da economia americana e de alguns países da Europa, como a Alemanha, irá aumentar a competição por fluxos de capitais, diz o presidente da BM&FBovespa


Fernando Martinho/Paralaxis

 

O desafio é grande. Convencer, em quatro anos, 4,4 milhões de pessoas a usarem parte de suas economias para comprar ações e pelo menos 200 empresas a abrirem capital. Com um pequeno detalhe: um cenário de alta de juros dentro e fora do Brasil, que tem afugentado investidores estrangeiros. Para isso, Edemir Pinto, economista, que já dedicou 25 anos de sua carreira à construção do mercado de capitais brasileiro e hoje preside a terceira maior bolsa de valores do mundo, traçou um plano de educação financeira para o país. O objetivo é quebrar paradigmas e reduzir medos. Seu projeto de médio prazo, porém, dificilmente será concluído sem um empurrão do governo. Com juros altos e sem uma política fiscal consistente, segundo ele, fica complicado desenvolver todo o potencial da bolsa. A seguir, o presidente da BM&FBovespa faz críticas à política cambial, fala sobre concorrência e consolidação e discute o papel das novas tecnologias no mercado de ações.

 

 

1. A expectativa de aumento de juros no Brasil e lá fora reduzem o interesse dos investidores pelo mercado de capitais. Ao mesmo tempo, a BM&FBovespa tem uma meta ambiciosa, de atrair mais 4,4 milhões de investidores até 2015. Como conseguir isso nesse cenário pouco animador?_A meta é mesmo ambiciosa e foi concebida nesse cenário menos otimista. O que nos motivou a traçá-la foi justamente o comportamento dos investidores brasileiros [pessoa física], durante a crise de 2008. Pela primeira vez, eles não debandaram. Esperávamos uma saída mais intensa e que a bolsa chegasse aos 20 mil pontos. Mas ela não desceu abaixo dos 30 mil. Foi um sinal de amadurecimento e de que, com um programa de educação de médio e longo prazo, com ações em escolas, universidades e empresas, podemos mudar paradigmas, mitos e medos e expandir o mercado de capitais. Há espaço também para lançar muitos novos produtos para setores específicos, como o imobiliário e o de energia. Não à toa, somos a terceira bolsa em valor de mercado no mundo todo, empatada com a alemã. O que nos coloca nessa posição é nosso potencial de crescimento.

 

 

2. Além do cenário externo, quais os principais entraves a essa expansão?_A pouca poupança interna é um desafio a ser vencido. Somos muito dependentes dos investidores estrangeiros e ficamos vulneráveis a qualquer solavanco externo. Na China, é a poupança doméstica que financia grande parte do mercado de capitais. Outro problema é o risco regulatório. Aqui as regras mudam com frequência e vivemos com uma espada na cabeça. Neste ano o governo já anunciou medidas para reduzir a entrada de dinheiro estrangeiro. Isso dificulta muito o fluxo de capitais.

 

 

3. Há outras saídas para conter a valorização do real em relação ao dólar?_Não há solução fácil, nem simples. O Brasil quer ser a quinta economia do mundo e ninguém faz isso sem ter uma moeda forte. Mas o governo tem de fazer seu papel. Precisa ter políticas de médio e longo prazo para as questões estruturais do país, como a fiscal. Também terá de lançar políticas públicas de estímulo à poupança interna. Aí vamos poder nos comparar com outros mercados.

 

 

4. Com os projetos para Copa do Mundo e Olimpíada e a estabilidade econômica, é difícil imaginar que a moeda irá desvalorizar, correto?_Sim, o dinheiro vai continuar entrando no país, mas ele não está vindo para a bolsa. Vem para investimento direto mesmo. Nesse sentido, o Brasil não é mais a bola da vez. A recuperação da economia americana e da alemã faz com que esses países voltem a concorrer pelo investimento estrangeiro. Até o ano passado, posso dizer que, ao lado da China, éramos soberanos, recebendo um volume grande de investimentos. Mas agora não é bem assim. Só neste ano, R$ 1 bilhão deixou a bolsa em direção a outros países. Durante a crise, perdemos R$ 25 bilhões. Depois, em 2009 e 2010, recuperamos R$ 20 bilhões. O saldo total ainda é negativo.

 

 

5. Para crescer, a bolsa precisa também atrair novas empresas. Mas, e quanto às dificuldades em se preparar para uma abertura de capital?_A maior dificuldade não é o acesso ao mercado, mas aos consultores financeiro e legal, um serviço que custa caro. Os bancos e os escritórios de advocacia estão focados em médias e grandes operações. O que fazemos é fomentar um ambiente de negócios e aproximar esses dois mundos. Não podemos focar só em grandes empresas. Nosso trabalho de atração tem de começar desde baixo e ser perene.

 

 

6. Uma nova bolsa deve ser criada no Brasil, por meio de uma parceria entre a operadora Bats e a gestora Claritas. Quais as armas da BM&FBovespa para enfrentar uma concorrência que hoje não existe?_Em primeiro lugar, acho que o movimento dessa nova bolsa vai na contramão do mercado. O que vemos hoje é um processo de consolidação, que deve se acentuar, e não de aumento da concorrência local. Não somos um monopólio, porque a competição hoje é global, não há mais barreiras, e os grandes players, que trazem liquidez, arbitram em todas as bolsas do mundo. Mas, se eles realmente decidirem vir para cá, nosso trunfo é o modelo de negócios. Somos uma bolsa vertical, integrada, que oferece todos os serviços e produtos financeiros a um preço competitivo.

 

 

7. Como o sr. responde às críticas em relação às altas taxas cobradas pela BM&FBovespa?_Isso não faz sentido. Quem diz que somos caros compara alhos com bugalhos. A Nyse, por exemplo, só faz trade. Então, não dá para comparar esses custos com os nossos, uma vez que oferecemos todos os serviços e fazemos também o post-trade. Como o IFRS, International Financial Reporting Standards [norma internacional de apresentação de balanços], vou divulgar em detalhes o quanto cobro de trade, de post-trade e de custódia, por exemplo. Aí sim os preços vão ficar comparáveis.

 

 

8. Nos Estados Unidos, sete em cada dez operações nas bolsas são feitas por operadores de alta frequência [sistemas que, por meio de algoritmos e computadores ultrarrápidos, são capazes de realizar milhares de ordens de compra e venda]. Para alguns especialistas, esse tipo de operação prejudica os investidores menos experientes. Existe um nível ideal no uso de tecnologia no mercado de ações?_Os operadores de alta frequência são uma realidade. Há três anos, havia mil operadores nesse pregão aqui ao lado. Hoje, todo mundo está nas mesas. Daqui a três anos, metade desse pessoal não estará mais na mesa, porque irá operar os fundos de alta frequência. É uma evolução natural na forma de operar e arbitrar os mercados em tempo real. E não é uma tecnologia nociva. Ao contrário, como realizam muitas operações ao longo do dia e muito rápidas, eles trazem liquidez ao mercado, o que hoje falta ao Brasil, pois o número de investidores ainda é pequeno.

 

 

9. Quando o senhor assumiu a presidência da bolsa, disse que queria se aproximar de outros mercados da América Latina, e cogitava fazer aquisições e parcerias para ampliar a atuação da BM&FBovespa. Mas isso ainda está no papel. Por quê?_Fizemos visitas, nos aproximamos. Só que Chile, Colômbia, Peru e Argentina, por exemplo, ainda não têm nenhuma relevância no mercado de capitais. Para se ter uma ideia, 85% dos derivativos negociados na América Latina estão no Brasil. Outros 11% são negociados no México. Primeiro precisamos ajudar esses países a desenvolver suas bolsas.

 

 

10. Tornar-se a bolsa que consolidará as operações de toda a América Latina deixou de ser interessante?_Não diria isso. Digo que é hora de rever as estratégias de crescimento. Isso porque, se a fusão entre a Deutsche Börse com a Nyse Euronext, anunciada em fevereiro, for aprovada, todas as bolsas precisarão repensar suas estratégias. Essa iniciativa mostra que a Nyse foi atrás de um novo modelo. Ela, que era uma bolsa apenas de negociação, com o acordo passa a ser vertical e integrada, lista papéis de companhias e os negocia. Isso nós já fazemos. E também somos globais. Hoje temos 5% das ações do CME Group [holding que controla a bolsa de Nova York], que detém 5% das nossas. Iremos reforçar a integração no próximo ano, quando colocarmos no ar a mesma tecnologia de negociação utilizada pelo CME. Teremos potencial para olhar outros continentes e tomar iniciativas de fusões e parcerias. 

 

 

 

FONTE: http://epocanegocios.globo.com/Revista/Common/0,,EMI223332-16363,00...

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