Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

O peso da indústria e sua relação com a universidade

 

 O peso da indústria e sua relação com a universidade

 

Jornal Valor

 

Por André Campos

A reduzida interação entre a universidade e a indústria brasileira tem sido captada pela pesquisa de inovação tecnológica do IBGE. A limitada atividade de pesquisa e desenvolvimento local tornaria desnecessário o uso de conhecimento local e explicaria este fenômeno. Em que pese este argumento, o tamanho da indústria brasileira no contexto internacional pode iluminar este problema.

Relatório do "McKinsey Global Institute" traz elementos para esta reflexão1. A partir da relação insumo-produto classifica-se a indústria de 75 nações até o ano de 2010. O estudo aponta que o valor adicionado nominal bruto da indústria posiciona o Brasil em 6º lugar globalmente, à frente da França, Índia, Reino Unido e Coreia do Sul. Houve ainda um avanço desde 1980 quando o país ocupava a oitava posição. O tamanho da indústria brasileira deveria colocá-la como forte demandadora de conhecimento local, mesmo descontando-se possíveis distorções dos valores calculados em função da valorização cambial do real.

A participação da indústria é também relevante considerando-se a gama de setores analisados e a partir do cálculo do valor adicionado da produção. Os setores industriais são agrupados pelo estudo de forma alternativa às tradicionais tipologias baseadas em produtos, mercados consumidores, tecnologias de processo de produção, intensidade de mão de obra ou de tecnologia. Sugere-se um agrupamento a partir de requisitos de custo (de matéria-prima, mão de obra e capital); de intensidade de inovação e da capacidade dos bens produzidos de serem comercializados em nível global ou local. Seria possível pensar, como hipótese, que a indústria brasileira apresenta baixa relação com as universidades locais devido a uma especialização em setores de baixa inovação e intensidade de pesquisa e desenvolvimento. Isso não se sustenta, pois o Brasil apresenta participação global relevante em todos os cinco setores analisados.

O governo deve criar políticas para fomentar a relação entre as indústrias brasileiras e a academia

O país se destaca no setor "'intensivo em recursos naturais e energia", formado pelas indústrias de petróleo, carvão e energia nuclear, produtos de madeira, papel e celulose, produtos de base mineral e metais básicos. Estas são caracterizadas por grande dependência ao custo e à oferta de energia, e à proximidade aos mercados finais em função de elevados requisitos de investimento e de custo de transporte. O Brasil responde globalmente por 6% do setor (quarto posto). Em linha com nosso nível de desenvolvimento, o país se destaca no setor de "produtos intensivos em mão de obra e comercializados globalmente", que inclui as indústrias têxtil, de curtume, confecções, móveis, joalheria e brinquedos, particularmente dependentes do baixo custo de mão de obra e de transporte. Aqui o Brasil responde globalmente por 4% do setor (quarto posto). Uma participação relevante nestes setores e muito menor nos demais, explicaria a fraca relação entre a indústria e a universidade.

Contudo, o país responde por parcela relevante da produção global também em setores mais intensivos em pesquisa e desenvolvimento, que em tese deveriam ter uma relação mais próxima com a universidade. Este é o caso dos setores chamados de "inovações globais para mercados locais" e de "processamento regional". O primeiro inclui a indústria farmoquímica, de máquinas e equipamentos, automotiva e de material de transportes, que tipicamente apresentam de média para alta intensidade em pesquisa e desenvolvimento, relevante dependência a inovações e a novos modelos de negócios.

O segundo inclui as indústrias de borrachas e produtos plásticos, de produtos de metais fabricados, imprensa e alimentos, bebidas e tabaco. Estas têm necessidade de proximidade a fontes de matéria-prima, moderada dependência a pesquisa e desenvolvimento e elevados níveis de automação. Nestes dois setores o Brasil respondia globalmente por 4% do setor (quinto posto). Nota-se nelas forte penetração do capital multinacional no Brasil, que pode em tese inibir a relação com o sistema universitário local, uma vez que somente uma parcela minoritária (mas lenta e tendencialmente crescente) das atividades de pesquisa e desenvolvimento são localizadas nas filiais destas empresas.

O quinto setor, de "'inovação e tecnologia global", corresponde às indústrias da eletrônica, semicondutores, computadores e material de escritório, produtos médicos, óticos e de precisão fortemente dependentes a redes de produção e de pesquisa e desenvolvimento, e de custo de transporte relativamente reduzidos. O Brasil responde aqui por respeitáveis 2% da produção global (quinto posto ao lado de economias avançadas como o Reino Unido, a Itália e a Suíça). Cabe questionar as causas da ausência de uma relação mais forte a indústria e o meio universitário brasileiro nestes e nos demais setores mencionados, dado o seu peso internacional.

Aceitando-se os resultados do relatório, o Brasil continua sendo um relevante ator nas atividades de produção industrial, não obstante a delicada conjuntura da indústria, e deveria portanto apresentar uma dinâmica mais virtuosa na relação universidade-empresa. Se a relevância da indústria brasileira em termos globais é evidente, o papel dos empresários e do governo para o fortalecimento da relação entre a universidade e a indústria é claro.

As estratégias empresariais dos capitais nacional e multinacional aqui instalados devem se pautar pelo longo prazo, pela orientação para a inovação e incremento da competitividade por meio do desenvolvimento das capacitações empresariais e das cadeias produtivas, de sorte a assegurar a presença nos mercados local, regional e no "resto do mundo" avançado e emergente. Se estes objetivos forem permanentemente seguidos, provavelmente o empresário deverá buscar o meio universitário local. O governo pode facilitar esta busca por meio de políticas que fomentem diretamente e indiretamente a maior gama possível de setores industriais a se relacionar com a universidade e pelo fortalecimento da estrutura burocrática pública para a consecução desta tarefa.

1 'Manufacturing the future: The next era of global growth and innovation'

André Luiz Sica de Campos tem doutorado na Universidade de Sussex e é professor na Faculdade de Ciências Aplicadas da Unicamp.

 

 

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