Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

Fonte: |Valor online|
Heloisa Magalhaes

Há cerca de dez anos, praticamente todas as roupas de malha, casacos, camisas, calças e pijamas vendidos na Feirinha de Itaipava, em Petrópolis (RJ), eram fabricadas por ali mesmo, na serra fluminense onde a industria têxtil é uma tradição. Depois, começaram as "importações" de São Paulo. E nos últimos anos houve uma verdadeira inundação de produtos chineses. "Inundação?", questiona o economista e professor Antonio Barros de Castro, do Instituto de Economia da UFRJ e assessor da presidência do BNDES. Para ele, ainda não há um tsunami chinês: " Comparativamente, o processo está apenas começando", diz ele.

Nos portos brasileiros, os bens de capital chineses desembarcam cada vez em maior volume. São soluções caracterizadas na China como de prateleira, enquanto aqui são produzidos sob encomenda. Vêm para o setor elétrico, como turbinas das usinas do rio Madeira, para a siderurgia, como altos-fornos importados pela Gerdau e ThyssenKrupp. Além de soluções para a área de telecomunicações, bens seriados para a indústria em geral, como partes, peças e componentes, exemplifica o vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro.

O professor Barros de Castro lembra que, após a crise financeira, a China está pressionada pelo fato de que não há mais crescimento nos mercados tradicionais de manufatura, como EUA, Europa e Japão. Então, além de desenvolver o mercado doméstico, onde os preços baixos são fundamentais, o país tem de descobrir mercados alternativos. "Um bastante suculento é o Brasil", diz.

Vale lembrar que as importações da China começaram a crescer de forma mais acentuada em 2003 e até o fim de 2008 haviam crescido 833%. Em 2003, respondiam por 4,4% das compras brasileiras no exterior, percentual que saltou para 11,6% em 2008. No primeiro semestre, a participação da China chegou a 12,1% no total das importações brasileiras. Já as exportações para a China, em 2003, respondiam por 6,2% da pauta brasileira. Em 2008, passaram a 8,3%, e neste primeiro semestre chegaram a 14,9% do total exportado pelo Brasil .

O crescimento das vendas brasileiras para a China vem sendo puxado pelas commodities, que responderam por 77% das vendas totais para o país, diz o executivo da AEB. Já os manufaturados, em, 2008, responderam por 7% das exportações. Eram 19% em 2000.

Felizmente, o Brasil tem as commodities. Puxada por elas, neste primeiro semestre, a balança comercial com a China foi até superavitária, em US$ 3,6 bilhões, para o Brasil. No mesmo período de 2008 o déficit foi de US$ 1,5 bilhão. Mas a questão é se as commodities marcam o único caminho que o Brasil pode trilhar na relação comercial com a China. O maior exportador de produtos agrícolas do mundo são os Estados Unidos, mas também são os grandes exportadores de manufaturados. Buscaram desde cedo caminhos para se beneficiar do movimento do gigante ainda nascente.

A participação brasileira quase que exclusivamente baseada nas commodities é um alerta para a AEB. "O exportador não tem ingerência sobre o preço e quantidade. Nós estamos no movimento de atender a demanda sem nenhuma programação própria. Não temos um objetivo no comércio com a China. O Brasil é um exportador de peso, peso aí com duplo sentido. Mas também mesmo para crescer nas commodities não tem uma estratégia organizada. Em logística e infraestrutura somos um caos", diz ele.

Para o professor Barros de Castro, o "Brasil é um país retardatário" no que se refere a ter em conta a emergência chinesa e suas implicações. Afirma que no Leste Asiático a adaptação à China foi progressiva ao longo de, pelo menos, os últimos dez anos. "No hemisfério ocidental, os Estados Unidos se adaptaram muito rapidamente para o bem e para o mal. O sistema econômico mundial está assimilando um gigante e todas as suas partes se alteram em função dessa nova realidade", diz. Há pelo menos cinco anos que o professor utiliza a expressão "sinocêntrico" para definir o mundo do ponto de vista comercial, um movimento que, segundo ele, tem implicações que impõem um reposicionamento tanto das empresas como das políticas nacionais.

Mas para isso, independentemente de diagnósticos e análises do tsunami chinês, Barros de Castro avalia que "uma fronteira aberta é o entendimento de como operam a economia e a sociedade chinesas e de que arranjos e instituições saem esses resultados espetaculares na economia".

"A presença chinesa é um fenômeno mundial, o problema é saber como reagir a ele. A reação só pode ser por escolha das nossas possibilidades. Temos de descobrir nossas possibilidades no mercado chinês, pois a melhor defesa é o ataque. Hoje, o máximo que se vê é um ou outro empresário deslocando fábrica para lá para se beneficiar dos custos chineses, mas existem vários campos e blocos de oportunidades se abrindo", diz.

Para o professor, o próprio mercado interno chinês é uma oportunidade a ser explorada. "Os preços chineses não são meramente baixos. São preços obtidos deliberadamente baixos para que também as próprias massas do país tenham acesso aos bens", diz.

A China fez uma revolução na área de telecomunicações, produzindo telefones celulares a preços baixíssimos, voltados fundamentalmente para o mercado interno há, pelo menos, quatro anos. Enquanto aqui, naquela época, os terminais, mesmos subsidiados pelas operadoras, eram vinculados ao plano oferecido ao usuário, no mercado chinês já havia telefones custando menos de US$ 5, relatou na época um empresário do setor.

Há uma "voracidade consumidora chinesa", como diz o professor Castro, mas alimentada por uma estratégia deliberada. "O que eles fazem é sistêmico, não é burlar uma regra aqui, um truque ali. Não é nada disso, tem origens na organização industrial deles, tem raízes profundas no sistema econômico e social deles. As respostas tem de ser sistêmicas também", avalia o professor, que vai promover um seminário na UFRJ, nos dias 2 e 3 de setembro para exatamente mergulhar no desafio chinês. A proposta é penetrar pelos meandros do modelo chinês, entender as raízes e sair atrás das oportunidades.

Heloisa Magalhães é chefe de redação da sucursal do Rio de Janeiro

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Comentário de Bárbara Hartz em 17 julho 2009 às 11:13
Encontrar oportunidades para o Brasil no gigante chinês é uma iniciativa interessante. Acho que é importante aliar a isto o conhecimento do que o Brasil tem a oferecer para competir na China ou no mercado internacional. Ou seja, qual é o nosso diferencial? Quais são as inovações que podem afirmar este diferencial e como podem ser incentivadas?

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