escrito pelo engenheiro Marcelo Ferrer e publicado originalmente no blog Lide Fiscal
Recentemente a 7.ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1.ª Região negou recurso proposto pela Fazenda Nacional contra sentença de primeiro grau que concedeu tutela antecipada a uma empresa, restabelecendo sua inscrição no CNPJ, pois havia sido declarada inapta em processo administrativo fiscal.
O fato que gerou a fiscalização motivando a abertura de processo administrativo fiscal para fins de declaração de inaptidão da empresa foi o pedido da empresa para aumentar seu limite de operações no comércio exterior (revisão do Radar Ordinário), a Receita Federal teria identificado divergências e irregularidades na documentação apresentada, o que resultou em fiscalização a qual concluiu pela interposição fraudulenta presumida, em razão da não comprovação da origem dos recursos aplicados pela agravada no comércio exterior.
Na sentença inicial, o juízo concedeu a tutela antecipada, pois os "documentos acostados à inicial revelam a existência regular da empresa, não havendo razão para que seja considerada como sociedade de fachada ou que atue na ilicitude", decisão que a Fazenda Nacional recorreu.
A grande pergunta que fica aqui é: Como evitar este tipo de situação?
Temos o dever de entrar com o pedido de revisão de radar quando existir discrepância entre o volume transacionado pela empresa e o limite auferido na concessão inicial do Radar Ordinário, para não nos sujeitarmos ao enquadramento no procedimento especial de fiscalização conforme IN SRF 228/02, mas a própria tentativa de evitá-lo pode ser o motivador do enquadramento!
Meu entendimento é que para evitarmos este tipo de situação temos que entender o âmago da intenção / exigência fiscal, que é o de identificar a Origem e Disponibilidade dos recursos empregados no comércio exterior, então vamos analisar as legislações envolvidas.
A Receita Federal estabeleceu através da IN SRF 650/06 os procedimentos de habilitação de importadores, exportadores e internadores da Zona Franca de Manaus para operação no Sistema Integrado de Comércio Exterior (Siscomex) e credenciamento de seus representantes para a prática de atividades relacionadas ao despacho aduaneiro.
As modalidades de habilitação são a Ordinária, a Simplificada (com seus desdobramentos), a Especial e a Restrita, mas a modalidade que demanda a maior atenção do contribuinte é a Ordinária (inicial ou revisão de estimativa), em decorrência do desfecho natural do processo em caso da não comprovação da Origem e Disponibilidade dos recursos aplicados nas operações de comércio exterior, que é abertura de procedimento especial conforme IN SRF 228/02 (§ 3 º do Art. 21º da IN SRF 650/06).
A Portaria MF nº 350/02 dispõe sobre os procedimentos de controle da origem dos recursos aplicados em operações de comércio exterior visando o combate à interposição fraudulenta de pessoas, onde na prática apenas estabelece limites e a competência da Secretaria da Receita Federal e do Banco Central para fazê-lo.
Independentemente do controle efetuado pelo BC neste quesito, os contribuintes sentem mais o peso da Secretaria da Receita Federal quando o assunto é comprovação da Origem e Disponibilidade dos recursos, pois em menos de uma semana da publicação da Portaria MF nº 350/02, a SRF publicou a IN SRF 228/02, a qual já estava pronta para ser colocada em prática sendo que até hoje gera muita controvérsia e curiosamente não foi editada / aperfeiçoada desde então, passados quase 10 anos.
As legislações citadas acima não deixam os contribuintes exatamente confortáveis com a definição do termo "Origem e Disponibilidade", pois operações não bancárias (via caixa) embora atualmente incomuns, não são ilícitas, embora sejam de "Disponibilidade" difícil de comprovar.
Existem também os lançamentos efetuados a título de simples faturamento decorrentes de vendas para entrega futura (CFOP 5.922, por exemplo), que também podem ser confundidos com recebimento de adiantamento de recursos para operações em comércio exterior, o que não é permitido a não ser que a operação seja por conta e ordem (IN SRF 225/02).
O Art. 6º da IN SRF 228/02 (sem ser específico o suficiente para dirimir as principais dúvidas dos contribuintes) indica alguns dos elementos de prova que comprovam a origem lícita, a disponibilidade e a efetiva transferência, se for o caso, dos recursos necessários à prática das operações de comércio exterior.
Resumidamente, para o contribuinte demonstrar a regular Origem e Disponibilidade dos referidos recursos é necessário entender quais são as entradas de recursos esperadas em uma empresa. Em meu entendimento são três os principais tipos de entrada de recursos em uma empresa:
Integralização de Capital Social, onde a origem é verificada através do IRPF do sócio que está efetuando a integralização e a disponibilidade é verificada com os respectivos comprovantes da transação bancária entre contas correntes (comprovante de TED, DOC, Cheque, extratos bancários do sócio e da empresa, etc...). A sugestão aqui é somente integralizar capital social via transação bancária, jamais integralizar o capital social via aporte no caixa da empresa em espécie para evitar problemas ou muito menos aumentar o capital social via "conta contábil de reserva de lucros", acreditem, já vi autuações em decorrência disto e por mais injusto que seja, se não houver o fluxo financeiro entre as contas bancárias do sócio e da empresa, a disponibilidade não é com provada no critério da fiscalização.
Faturamento de produtos e serviços, onde a origem é verificada através das notas fiscais envolvidas na transação (entrada dos produtos vendidos, venda dos produtos e de prestação de serviços) e a disponibilidade é verificada com os respectivos comprovantes de pagamentos e quitações, recebimentos vinculados às respectivas notas fiscais citadas, inclusive com contratos de câmbio se for o caso, e extratos bancários. A sugestão é dar prioridade às transações bancárias, que são de fácil comprovação.
Empréstimos, onde a origem é verificada através do contrato de empréstimo, e a disponibilidade através de extratos bancários indicando o recebimento do empréstimo, os respectivos pagamentos das parcelas, débitos de TAC, IOF, etc..., A sugestão é não contrair empréstimo de pessoa física ou pessoa jurídica que não tenha a atividade empréstimo como objeto societário (vide § 1º do Art. 6º da IN SRF 228/02), mas caso seja inevitável, lembre-se que o provedor destes recursos fica sujeito a ser fiscalizado pela Receita Federal para identificação da Origem e Disponibilidade dos recursos.
Existem outros pontos aos quais os contribuintes devem se atentar, como registros contábeis fidedignos, mão de obra adequada à atividade, regularidade da documentação de suporte às atividades da empresa (contratos social, de locação e de uso de marca comercial, regularidade das declarações fiscais, etc...), mas me arrisco a dizer que tendo a questão Origem e Disponibilidade equacionada, praticamente 90% do caminho foi andado no sentido de comprovar a existência de fato da empresa, nos critérios do procedimento especial de fiscalização da IN SRF 228/02.
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