Aiuri Rebello
Do UOL, em São Paulo*
O objetivo da Fábrica Social é qualificar o trabalhador para tirá-lo da miséria
Após a publicação da reportagem abaixo, na manhã desta sexta-feira (22), o governo do Distrito Federal enviou nota ao UOL Esporte recuando na afirmação que havia feito anteriormente de que não haveria pagamento para os participantes do programa de qualificação profissional Fábrica Social. Abaixo é possível ler a reportagem original. No final do texto, foi incuída a nota enviada pelo governo do Distrito Federal após a publicação da reportagem. Aqui, é possível ler a reportagem feita a partir desta nota de esclarecimento.
A Secopa-DF, secretaria do governo do Distrito Federal responsável pela organização de Brasília para a Copa do Mundo de 2014 e para Copa das Confederações deste ano, formulou um programa social de qualificação profissional sem nenhuma relação com os mundiais da Fifa: a Fábrica Social.
O projeto, que está para ser lançado a um custo de R$ 35 milhões, vai convocar 2.000 pessoas do cadastro do programa social do governo federal "Bolsa Família" para trabalhar por dois anos sem salário, de segunda-feira a sexta-feira, das 8h às 19h, na confecção de uniformes escolares e artigos esportivos. De acordo com a Secopa-DF, trata-se de um projeto social que irá qualificar essas pessoas para o mercado profissional têxtil.
A estimativa é produzir, só neste ano, 700 mil uniformes escolares, além de artigos esportivos como bolas e redes, para as 612 escolas da rede pública de ensino do DF. Também receberão os produtos, a título de doação, 28 centros esportivos do DF.
Perguntada sobre o salário ou bolsa-auxílio para os participantes durante a participação no Fábrica Social, a Secopa foi categórica: "Não há pagamento de salário. Os participantes do programa receberão auxílio pecuniário somado ao benefício do programa Bolsa Família", diz a nota enviada ao UOL Esporte pela assessoria de imprensa do órgão. Ou seja, os participantes receberão apenas ajuda de custo para transporte e alimentação durante o expediente.
O projeto não conta com parceria de nenhuma instituição de ensino reconhecida pelo MEC (Ministério da Educação), como universidades ou centros profissionalizantes como o Senai (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial). Assim, ao final do processo de "qualificação", não haverá diploma ou certificado de conclusão válido e reconhecido. Embora prometa qualificar esta mão de obra, a Secopa afirma que não contratará professores, pois possui um "equipe técnica" de servidores públicos dentro da secretaria capaz de tocar o projeto, inclusive em seus aspectos pedagógicos.
De acordo com a Cias (Coordenadoria de Integração das Ações Sociais), setor da Secopa responsável pelo projeto, os participantes serão escolhidos por meio do cadastro de famílias em situação de pobreza e extrema pobreza do governo federal. O objetivo declarado é qualificar as pessoas para ajudá-las a sair da situação de pobreza.
"Concluída a formação e a capacitação, o participante será encaminhado para os programas governamentais destinados ao microempreendedorismo, associativismo, cooperativismo, entre outros", informa nota enviada pela assessoria de imprensa da Secopa ao UOL Esporte.
Segundo a Secopa, a iniciativa se enquadra na Lei nº 4.601, de 14 de julho de 2011, que institui o Plano de Superação da Extrema Pobreza no Distrito Federal – "DF sem Miséria". Até que seja concluído o projeto, não é possível saber se o objetivo anunciado será atendido por meio da estratégia de utilizar o trabalho dessas pessoas em período integral por dois anos sem pagar salário.
O que se sabe, porém, é que fornecer uniformes escolares aos estudantes da rede pública de ensino é uma obrigação do governo do DF. Assim, o que de fato o governo poderá obter é uma economia de recursos ao doar a produção do projeto social para a rede, já que deixará de adquirir esses itens junto a fornecedores que pagam salários aos seus funcionários.
Para o juiz do Trabalho Marcus Barberino, do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo, especialista em trabalho escravo, a Fábrica Social do DF, da forma como está estruturada, pode ser definida como "arquitetura da destruição". "A princípio, sem ler a estruturação do programa nem consultar a legislação específica do Distrito Federal, o pressuposto é todo ruim e provavelmente é ilegal", diz o magistrado.
"Este tipo de formação (para trabalhar em fábricas têxteis) pode ser feito em poucos meses, não tem cabimento manter as pessoas em regime de qualificação, sem salário, durante dois anos", afirma. De acordo com o juiz, o governo do Distrito Federal não poderia produzir itens de valor comercial para o mercado, mesmo que o mercado em questão sejam as escolas públicas, sem remuneração dos trabalhadores que estão sendo qualificados.
Para ele, o modelo fere a legislação trabalhista, já que os "aprendizes", neste caso, não terão um contrato de trabalho. Além disso, o juiz lembra que, de acordo com a legislação em vigor, não é possível submeter uma pessoa em processo de qualificação profissional a uma jornada de período integral durante toda a semana. "É uma enormidade. Com certeza esta situação vai gerar várias demandas na Justiça, os tribunais do DF podem se preparar", afirma Barberino.
"Se não for ilegal, com certeza, pelo menos, imoral é", diz Leonardo Sakamoto, blogueiro do UOL e especialista em direitos humanos, relações de trabalho e meio ambiente. "Nem na cadeia os presos em regime de qualificação profissional trabalham gratuitamente. Existe uma bolsa, que varia de lugar para lugar, além da redução de pena de acordo com os dias trabalhados", diz Sakamoto.
Na semana passada, foi publicado anúncio de licitação no Diário Oficial do DF, para a aquisição, por R$ 880 mil, de 434 "máquinas de costura e outras". Além disso, por mais R$ 300 mil, a secretaria pretende comprar quatro máquinas de bordar industrial eletrônicas. A CIAS (Coordenadoria de Integração das Ações Sociais) da secretaria da Copa de 2014 é a responsável pelas compras.
NOTA DO GOVERNO DO DF ENVIADA AO UOL ESPORTE DEPOIS DA PUBLICAÇÃO DA REPORTAGEM:
1) Os participantes do programa, além do auxílio previsto nos programas Bolsa Família e DF sem Miséria, ganharão vales transporte e refeição e mais um valor correspondente a 35% de cada item produzido. A estimativa é de que, somados todos esses benefícios, o auxílio chegue a algo entre R$ 1.500 e R$ 2.000 por mês para cada candidato.
2) O percentual será apurado sobre uma tabela de valores a ser elaborada pela Coordenadoria de Integração das Ações Sociais, gestora do programa. O orçamento do programa já prevê R$ 9,8 milhões para pagamento desse auxílio pecuniário.
3) A forma de auxílio dos participantes do programa está prevista no projeto de lei 1.292, encaminhado pelo Governo do Distrito Federal à Câmara Legislativa em novembro de 2012. Esse projeto de lei altera três artigos da Lei 4.601/2011, que institui o DF sem Miséria.
4) O programa Fábricas Sociais é um aprimoramento dos programas Pintando a Liberdade e Pintando a Cidadania, realizados com sucesso pelo Governo Federal entre 2003 e 2007.
5) Para participar do programa, é necessário que os candidatos estejam cadastrados nos programas federal e distrital de combate à miséria, medida que previne favorecimento e clientelismo.
Ugo Braga
Porta-Voz Governo do Distrito Federal
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Hoje o GDF cadastra "Alunos" com a promessa de ganharem até R$ 2.000,00 (VT + VR + Produtividade) para se capacitarem em um curso que não tem nenhum vinculo com alguma instituição de ensino.
O que acontece, na realidade, é que a maioria recebe menos que o salário mínimo e estão produzindo mais de 700 mil camisetas para o GDF distribuir "gratuitamente" na rede pública de ensino.
No Distrito Federal tem mais de 100 micro e pequenas empresas que só sobrevivem da venda anual de camisetas para a rede pública e, nenhuma delas, foi comunicada dessa produção e da mudança do uniforme, que agora terá o símbolo do Estádio Mané Garrincha e a gola e punhos na cor vermelha.
Isso, com certeza, fechará muitas empresas no DF.
"Se não for ilegal, com certeza, pelo menos, imoral é".
Os participantes do programa, além do auxílio previsto nos programas Bolsa Família e DF sem Miséria, ganharão vales transporte e refeição e mais um valor correspondente a 35% de cada item produzido.
É brincadeira quando nossos governantes resolvem ATRAPALHAR. Por que eles não permitem que coloquemos alunos/aprendizes, nas nossas fabricas, nestas mesmas condições? Como é fácil gastar o dinheiro publico, 35 milhões?? E se não der em nada, quem paga a conta? Muito bem colocado o termo do Juiz Barberino ¨É A ARQUITETURA DA DESTRUIÇÃO¨ de todos os micros, pequenos e medios que estão no entorno e são fornecedores do governo do DF.
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