Brand: O ferro com que se marca o gado para garantir-lhe a origem, o pertencimento e a identificação. Eis de onde se retira a palavra branding, um conceito que se traduz em ações e estratégias que visam à construção e manutenção da identidade de uma marca ao longo do tempo e para além da morte de seus fundadores.
Grifes de luxo como Dior e Chanel sobrevieram ao desaparecimento de seus criadores originais e constituem assim os maiores exemplos de toda a potência simbólica embutida na noção de marca na contemporaneidade.
A marca é uma entidade em que uma série infinita de valores dos mais diversos circulam entre os produtos comercializados e configuram-se como objetos “assinados” que, como cartas endereçadas a alguém, serão lidos a um só tempo pelas mensagens ali contidas e pela caligrafia e assinatura ali presentes. Uma presença atualizada de algo que não está ali necessariamente mas que se faz presente pela capacidade de evocação de uma aura que de alguma forma se inscreveu na origem desta marca e ali resiste como cicatriz.
Só a compreensão mais refinada e calculada, a beleza mesmo da mais pura matemática, pode sustentar a força de uma marca ao longo dos tempos. A marca, portanto, não pode jamais atrelar-se à natureza inconstante e traiçoeira da moda e suas ondas e fluxos mutantes.
Ainda que uma marca abrigue as flutuações oscilantes da moda, há uma verdade que brilha para além desta transitoriedade e sobrevive intocada, ou quase, à fugacidade dos caprichos da moda. A marca é, neste sentido, prima-irmã do estilo e, juntos, escrevem os nomes das marcas, os nomes que são marcas, em placas de bronze e ouro, onde se refletem como espelhos preciosos os vaivéns rodopiantes da dança da moda. Um aparente e todavia lógico contrassenso.
Marcas como Louis Vuitton, Hermès e Burberry, com histórias centenárias, mantêm-se vivas e relevantes por refletirem neste espelho de aparentes contradições a lógica pendular em que entrecruzam olhares o novo e o antigo, a alta-cultura e a cultura pop, a arte e o artesanato, o sublime e o absurdo.
Os diretores de criação da Louis Vuitton, o norte-americano Marc Jacobs, e da Burberry, o inglês Cristopher Bailey, promovem flertes inusitados à primeira vista para um universo que durante tanto tempo associou-se à dureza de um monumento histórico. Tanto Jacobs quanto Bailey, entretanto, lembram-nos de que, embora o monumento esteja ali há muito tempo, os leitores e intérpretes diante dele podem lê-lo à luz de novos tempos e, em muitos sentidos, reapresentá-lo ao olhar contemporâneo.
E assim aprendemos sobre bandas e artistas pop ainda ignorados pelo grande público com a curadoria de Cristopher Bailey para a Burberry, marca inglesa fundada em 1856 e conhecida pelos trench coats, que junto a este universo de novos nomes da música pop, presentes no site da marca e convidados a participar da abertura de lojas ao redor do mundo, assumem formas quase iconoclastas na visão de Bailey.
Com a Louis Vuitton de Marc Jacobs navegam nos mesmos mares o luxo de artigos de couro a preço de ouro e colaborações no mínimo excêntricas com artistas contemporâneos como Stephen Sprousee, Yayoi Kusama, além do brasileiro Vik Muniz.
A julgar pelo estrondoso sucesso mercadológico destas marcas, cabe que possamos, aos poucos, compreender que sem a reflexão do refinamento conceitual, não se constroem marcas, apenas empresas que pouco contribuirão para a cultura e economia criativas de seus países e, por conseguinte, do mundo globalizado em que vivemos.
A lógica predatória da elite brasileira, individualista e inculta, adora o estrangeiro e pouco contribui com os recursos de que dispõe, para uma verdadeira cultura de moda local, com marcas que possam traduzir a imensa riqueza criativa do Brasil, cada vez mais frágil diante de marcas cujos países de origem compreendem os reais significados de estilo, marca, cultura e identidade.
Até que se possa contar com estas auroras, viveremos em trevas cada vez mais escuras e desencorajadoras para o surgimento de marcas de moda realmente significativas em nosso país.
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