Produzir fios com maior qualidade é o desafio do setor da cotonicultura, ou cultura do algodão. Os produtores vêm investindo em máquinas para colher o algodão adensado, que diminui o espaçamento entre as linhas de plantio para cultivar mais plantas em uma área, aumentando a produtividade. Mas a principal questão discutida entre indústria e produtores rurais é se essa busca pela maior produtividade para reduzir custos de produção está contribuindo também para diminuir o comprimento da fibra, sendo que o mercado sinaliza querer fibras mais longas, mais finas e resistentes.
O assunto foi discutido durante o III Workshop da Qualidade do Algodão, que reuniu produtores de algodão, pesquisadores, consultores, representantes da indústria têxtil e trabalhadores da cadeia do algodão nesta sexta-feira (12) em Cuiabá (MT).
A expectativa é de que o algodão adensado volte a crescer no Estado, na opinião de Álvaro Sales, diretor executivo do Instituto Mato-Grossense do Algodão (IMAmt). Ele acredita que é um caminho sem volta e que os investimentos feitos pelos produtores nos últimos anos na colheita e no beneficiamento podem contribuir para garantir a qualidade do algodão adensado. "Cada vez mais a cultura do algodão está se posicionando como uma cultura pós-soja. Isso faz com que o produtor consiga tem uma renda com a soja, colha e depois plante o algodão", diz.
Como uma cultura de safrinha, o algodão tem que ser cada vez mais resistente à falta de chuva característica do inverno mato-grossense. "Dentro do Ima, estamos trabalhando porque nós temos que produzir um algodão mais tolerante à seca, porque esse deslocamento do algodão da safra normal para a segunda safra, você pré-dispõe em determinados anos talvez uma falta de chuva no final do ciclo", explica.
Durante a primeira mesa redonda, discutiu-se as necessidades da indústria e as tendências para os tecidos no futuro, o que passa pela qualidade do fio que a demanda do mercado. O novo desafio do setor é produzir fibras mais longas, mais finas e resistentes, que gerem tecidos mais leves de acordo com o desejo dos consumidores brasileiros.
Após ser colhido no campo, o algodão passa pela algodoeira para separação da pluma e do caroço de algodão, depois pelo processo de fiação para fazer o fio, em seguida pela tecelagem, que produz os tecidos, e por fim pelas indústrias de confecções, que fazem os produtos. Em Mato Grosso, há mais de cem algodoeiras e duas empresas de fiação.
Rogério Segura, de uma empresa química de Santa Bárbara do Oeste (SP), está há 30 anos no ramo têxtil e participou da mesa redonda. Segundo ele, houve uma grande evolução na fibra do algodão nesse período, e o algodão brasileiro não está entre os piores nem os melhores do mundo, mas ainda importa-se a fibra de fora porque não temos qualidade suficiente para transformá-la aqui.
"O algodão brasileiro é excepcionalmente bom e ele tem evoluído muito, mas ainda não chegou a níveis de qualidade do algodão egípcio, israelense, o espanhol ou o americano. No entanto, o movimento é de continuidade no algodão", prevê.
Ele informa que o brasileiro hoje se veste em função do clima e por isso a moda busca conforto, o que influencia no tipo de fibra que deve ser produzida no campo. "A palavra-chave no Brasil em termos de moda vai ser bem estar, conforto. É sentir bem, estar com uma camiseta, um jeans no peso adequado. A mulher brasileira adora strech, mas não aquele pesado, um mais confortável."
O gerente industrial da indústria têxtil Vicunha, Thales Figueiredo, destaca que a tendência no mundo dos tecidos de jeans, como o denin e o índigo, e do brim, também se caminha para conseguir um tecido mais leve, mas é preciso ter resistência para ser tratado quimicamente. "Produzíamos um tecido mais pesado, com fios mais grossos que, por ter mais matéria prima no fio, aceitava mais tratamentos. Hoje, quando parte para fios mais finos, passa a ter uma exigência maior do fio", explica.
De acordo com o produtor de algodão em Campo Novo do Parecis, Ernesto Martelli, conseguir essa fibra desejada pela indústria é um desafio a que os produtores de Mato Grosso estão atentos. Ele informa que cerca de 20% do algodão é importado pela indústria brasileira, porque o algodão do Brasil ainda não conseguiu chegar no ponto para produzir tecidos mais finos.
"Estamos trabalhando inclusive com novas variedades para chegar na qualidade que de fato a indústria nacional e internacional melhor trabalha com a pluma, então o Estado está fazendo muito bem o seu papel e acredito que em mais 2 anos ou 3 anos chegamos lá", destaca.
Para isso, é preciso pesquisa. E o setor se mostra preocupado em conseguir essas variedades de algodão para serem cultivadas. "Isso é realmente um desafio muito grande para a pesquisa. O algodão que tem essa característica são os egípcios, mas são outras espécies de algodão que vamos buscar genes para produzir aqui", ressalta Álvaro Sales, do IMA.
Sales explica que as intempéries do clima são determinantes para a qualidade do algodão e, nos dois últimos anos, ocorreram condições anormais em algumas fases do desenvolvimento do algodão no Estado. Ele exemplifica que, se há muita seca no período de formação do capulho, pode afetar a formação das fibras; se chover na época da colheita, quando as fibras já estão formadas, também pode prejudicar a cultura. "Não podemos esquecer que algodão é uma cultura produzida no campo e qualquer produto que é natural dependente das condições climáticas", afirma.
G1