Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

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Barco leva justiça a comunidades isoladas na Amazônia

Barco leva justiça a comunidades isoladas na Amazônia

Fonte  Notícias STJ

SÃO PAULO, Brasil – O dia 18 de agosto vai ficar marcado na vida de muitas comunidades isoladas da Floresta Amazônica.

 

É quando começa a jornada de número 100 do Justiça Itinerante, um programa do Tribunal de Justiça (TJ) do Amapá que leva atendimento jurídico de barco a comunidades geograficamente isoladas.

 

A jornada é feita de barco porque o estado está incrustado na Floresta Amazônica, com 70% de seu território recortado por rios e mata nativa.

 

Cerca de 60.000 pessoas moram em comunidades isoladas pela floresta e pelos rios, longe dos centros urbanos do estado, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

 

A desembargadora Sueli Pereira Pini entrou para o programa em 1996 e coordenou a iniciativa até 2005. Desde então, ela se reveza com outros juízes na condução das jornadas.

 

Antes de embarcar em sua primeira viagem, Sueli não fazia ideia do que iria encontrar.

 

“Foi uma viagem no tempo. Encontrei pessoas isoladas da civilização, sem energia elétrica ou saneamento”, lembra Sueli, que, em 21 de junho, se tornou a primeira mulher a virar desembargadora na Justiça do Amapá. “Descobri que pior do que o isolamento geográfico é o cultural.”

 

Sueli logo percebeu que aquelas pessoas precisavam de muito mais do que o barco do Justiça Itinerante tinha para oferecer. Os problemas não se restringiam a conflitos por terras, divórcios e outras questões jurídicas.

 

Havia ribeirinhos sem documentos. Faltavam serviços sociais, atendimento médico e educação.

 

Muitos entravam na fila para perguntar o que a juíza tinha para oferecer. Outros chegavam para pedir dinheiro e comida.

 

 

 

 

A desembargadora Sueli Pereira Pini entrou para o programa em 1996 e foi a coordenadora até 2005. “Descobri que pior do que o isolamento geográfico é o cultural”, diz ela. (Cortesia do Justiça Itinerante)

 

A desembargadora foi então agregando serviços a cada nova jornada. Entraram no barco representantes da Pastoral da Criança, do Exército, da Justiça Eleitoral, além de médicos, dentistas e técnicos da área de saneamento.

 

“Houve jornadas em que chegamos a levar 16 serviços públicos”, diz Sueli.

 

Ao longo de quase duas décadas, o programa acabou proporcionando muito mais do que acesso à Justiça. O barco, que sai para uma jornada de sete dias a cada dois meses, leva também educação e cidadania a dezenas de milhares de pessoas.

 

“Conheci mães de crianças portadoras de deficiência que não sabiam que tinham o direito à assistência do Estado”, diz Sueli. “A missão mais importante do Justiça Itinerante é dar fim ao analfabetismo jurídico.”

 

Arquipélago é a próxima parada

 

Ao zarpar no próximo dia 18, o barco “Tribuna – A Justiça Vem a Bordo” segue para o Arquipélago do Bailique, um distrito de Macapá, a capital do estado. A região tem cerca de 11.000 moradores, distribuídos em 50 comunidades.

 

A viagem do centro da capital até o arquipélago leva de 10 a 12 horas de barco.

 

 

 

 

O barco, que sai para uma jornada de sete dias a cada dois meses, leva justiça, educação e cidadania a dezenas de milhares de pessoas. (Cortesia do Justiça Itinerante)

 

Durante uma semana, cerca de 40 pessoas terão o barco como casa e escritório. Além de um juiz, vão atender a população do arquipélago representantes do Ministério Público, da Companhia de Água e Esgoto do Amapá, Secretaria de Educação do Estado do Amapá, Defensoria Pública, Tribunal Regional Eleitoral e Instituto do Meio Ambiente e Reordenamento Territorial.

 

Ao longo do dia, o barco será um espaço multidisciplinar, com sala de audiências, espaço para filmes e contador de história para as crianças. À noite, ele vira dormitório, com dezenas de redes coloridas para os servidores e tripulantes descansarem.

 

Leslie Ferraz, uma professora de Direito da Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Rio de Janeiro especializada em acesso à Justiça, participou de duas jornadas fluviais para o Arquipélago do Bailique, em 2005 e 2011.

 

“É impressionante como a comunidade se desenvolveu nesse período”, afirma Leslie, que também é pesquisadora visitante do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

 

A evolução que Leslie percebeu na segunda jornada não se restringe ao desenvolvimento econômico do arquipélago, favorecido com o Programa Bolsa Família do governo federal e outras iniciativas.

 

A professora afirma que verificou um grande desenvolvimento social na região, com o surgimento de novas lideranças e a melhor compreensão por todos de seus direitos como cidadãos.

 

“O que me chamou mais a atenção é que as pessoas despertaram para seus próprios direitos”, diz Leslie, que destaca o potencial transformador do programa. “Mais do que democratizar o acesso à Justiça, o programa desformaliza o Poder Judiciário no sentido de adequá-lo aos diferentes públicos, dinâmicas sociais e demandas comunitárias.”

 

Desde abril, Leslie trabalha numa pesquisa do Ipea para fazer um mapeamento de todos os programas de justiça itinerante no Brasil.

 

Ela conta que esse tipo de programa começou a ser criado no Brasil em 1995, com a criação dos juizados especiais.

 

 

 

 

A desembargadora Sueli Pereira Pini posa para foto com uma família ribeirinha do Amapá durante uma das jornadas do Justiça Itinerante. (Cortesia da Justiça Itinerante)

 

Em 2004, a Emenda Constitucional nº 45 incluiu a justiça itinerante na Constituição Brasileira. Desde então, as justiças estaduais e federais têm a obrigação de oferecer este tipo de programa para a população. Rio de Janeiro, São Paulo, Ceará, Sergipe e Pará são alguns estados que têm bons exemplos de justiça itinerante.

 

No Amapá, as jornadas fluviais ganharam regularidade bimestral a partir de 1996. O custo anual do programa é de R$ 276.500, segundo a pesquisa de Leslie Ferraz.

 

Sem dinheiro para ir à capital

 

No barco do Justiça Itinerante, todo tipo de processo é realizado. Divórcios são decretados, disputas por terras são julgadas, assim como assassinatos, assaltos e brigas por pensão alimentícia, por exemplo.

 

Muitas pessoas esperam a chegada do barco para resolver seus problemas. Elas não têm nem os R$ 70 da passagem de ida e volta até o centro de Macapá para dar início a processos como pedido de aposentadoria.

 

Foi o caso de Maria do Carmo, uma moradora do Bailique que Leslie Ferraz conheceu em sua última jornada.

 

“Ela chegou a renunciar ao seu direito de aposentar-se pela Previdência Social por não ter dinheiro para pagar a sua viagem e a de duas testemunhas até o fórum na capital”, lembra Leslie.

 

O Tribunal de Justiça do Amapá não tem registro de quantas pessoas foram beneficiadas nas últimas duas décadas. Leslie diz que, na primeira jornada que acompanhou, em 2005, foram feitos 4.782 atendimentos pelos diversos serviços públicos.

 

“Justiça Itinerante é a experiência mais concreta de democratização do acesso que tive a oportunidade de conhecer”, diz.

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