Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

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CARF analisa usufruto de participação societária na perspectiva do usufrutuário

CARF analisa usufruto de participação societária na perspectiva do usufrutuário e mantém isenção dos dividendos e tributação exclusiva na fonte à alíquota de 15% para os juros sobre capital próprio - Ramon Tomazela - Paulo Coviello Filho

Por; Decisões

No dia 7.3.2017, a 1ª Turma Ordinária, da 4ª Câmara, da 1ª Seção doCARF, por meio do acórdão n. 2401-004.568, deu provimento ao recurso voluntáriode determinado contribuinte, interposto no processo administrativo n.10437.720889/2014-82, cuja discussão versava sobre o tratamento tributário, peloimposto de renda da pessoa física (IRPF), de rendimentos de juros sobre capitalpróprio (JCP) e dividendos, recebidos pelo usufrutuário pessoa física, emdecorrência de direitos econômicos mantidos, após a constituição do usufruto.

 

No caso, conforme relatório do acórdão, uma pessoa física, acionista dedeterminada pessoa jurídica operacional, em conjunto com outros acionistasdessa mesma pessoa jurídica, constituíram uma sociedade holding e capitalizaramessa sociedade, por meio de integralização da nua propriedade das ações dapessoa jurídica operacional, reservando para si o usufruto dos direitoseconômicos de tais ações. Em razão do usufruto constituído, o usufrutuáriorecebeu da pessoa jurídica operacional (i) JCP, os quais foram tributadosexclusivamente na fonte, nos termos do art. 9°, parágrafo 3°, inciso II, da Lein. 9249, de 26.12.1995, e (ii) dividendos, os quais não foram oferecidos àtributação, com base na isenção prevista no art. 10 da mesma Lei n. 9249.

 

Ao examinar o caso concreto, a fiscalização entendeu que o contribuinte,em razão da constituição do usufruto, não configurava mais como acionista dasociedade, de forma que não poderia conferir aos valores recebidos o tratamentotributário de dividendos e de JCP. Segundo a fiscalização, esses rendimentosseriam decorrentes da condição de usufrutuário e não de acionista, de forma quedeveriam ser submetidos ao regime de tributação anual de IRPF, às alíquotas databela progressiva (até 27,5%).

 

O contribuinte se irresignou contra a autuação fiscal, argumentando queo instituto do usufruto, disciplinado nos art. 1.390 a 1.411 do Código Civil, prevêjustamente a divisão dos atributos da propriedade. Assim, a sociedade holdingteria ficado com a nua-propriedade e os direitos políticos decorrentes dasações da pessoa jurídica operacional, enquanto o contribuinte teria mantido odireito aos frutos, neles incluídos aos JCP e os dividendos.

 

A 1ª instância administrativa julgou a impugnação improcedente, mantendointegralmente a autuação fiscal. Em face dessa decisão, o contribuinte interpôsrecurso voluntário, o qual foi julgado pela 1ª Turma Ordinária, da 4ª Câmara,da 1ª Seção do CARF, por meio do acórdão n. 2401-004.568.

 

Nesse julgamento, em decisão colhida por maioria, a Turma Julgadoraentendeu que o tratamento conferido pelo contribuinte aos rendimentos recebidosa título de dividendos e JCP estava correto. O voto vencedor, de lavra doConselheiro Cleberson Alex Friess, entendeu que o raciocínio da fiscalizaçãonão poderia prevalecer, eis que o usufruto é figura típica do direito privado,não havendo nenhuma norma tributária, relativa ao IRPF, conferindo tratamentodiverso aos rendimentos de dividendos e JCP recebidos pelo usufrutuário. Aindasob o ponto de vista do direito privado, o voto também destacou que o art. 1228do Código Civil [1] é claro ao definir os atributos da propriedade, sendo queos art. 1390 e seguintes admitem expressamente a divisão das faculdadesinerentes ao direito de propriedade, em razão do usufruto. A decisão tambémconsignou que não foi identificada nenhuma irregularidade ou ilicitude pelafiscalização na constituição do usufruto.

 

Adiante, consignou a decisão que a Lei n. 6404, de 15.12.1976, possuiuma série de disposições que tratam especificamente sobre a constituição deusufruto de participação societária, citando os art. 40, 114, 171 e 205. Naspalavras da decisão, "conquanto nãoempregue uma linguagem uniforme em todos os artigos que tratam do usufruto, aLei S/A reconhece, ao fim e ao cabo, que tanto nu-proprietário quantousufrutuário estão legitimados a exercerem direitos de acionistas".

 

Especificamente sobre o art. 205 da Lei n. 6404, a decisão chamouatenção para o fato de o dispositivo autorizar expressamente o pagamento dedividendos ao usufrutuário da ação. De modo semelhante, apesar da inexistênciade disposição normativa similar para os JCP, até por se tratar de institutojurídico criado posteriormente à edição da Lei n. 6404, a decisão destacou quetanto os dividendos quanto o JCP representam formas de remuneração do capitalinvestido pelo acionista, a despeito das diferenças existentes em suas naturezasjurídicas e nos respectivos tratamentos tributários.

 

Analisando especificamente o art. 9° da Lei n. 9249, que dispõe sobre otratamento tributário dos JCP, a decisão afirmou inexistir razão para que otratamento lá conferido seja restringido ao acionista, excluindo-se ousufrutuário, eis que "O legislador nãoadotou esse tipo de restrição, mesmo porque a instituição do usufruto nãoaltera a natureza jurídica dos frutos percebidos pelo usufrutuário."

 

No que tange aos dividendos, tratados no art. 10 da mesma Lei n. 9249, adecisão ressaltou que não há qualquer menção na Lei à figura do acionista,tampouco à do usufrutuário, de forma que não poderia haver tratamento distintopor parte do interprete. Assim, concluiu que "cuida-se de uma verdadeira isenção tributaria de natureza objetiva, namedida em que o legislador ordinário escolheu como parâmetro um determinadofato jurídico, sem levar em consideração as condições das pessoas beneficiadaspela exceção".

 

Válido ressaltar, ainda, que, conforme destacado pela decisão oracomentada, a mesma operação também gerou autuação da sociedade holding querecebeu a nu-propriedade das ações em aumento de capital. Naquele caso,processo n. 16327.720576/2011-13, a fiscalização autuou a sociedade holding poromissão de receitas de JCP distribuídos pela pessoa jurídica operacional,exigindo o IRPJ, a CSL, o PIS e a COFINS. Essa autuação também foi julgada peloCARF, por meio do acórdão n. 1103-001.123, de 21.10.2014, que cancelou aautuação por também considerar perfeitamente válida a constituição do usufruto ea decorrente divisão dos atributos da propriedade.

 

A decisão proferida pelo CARF está correta, pois, no caso de usufrutosobre ações, os valores recebidos pelo usufrutuário continuam a receber otratamento jurídico-tributário de dividendos ou de JCP, conforme a naturezajurídica do pagamento realizado.

 

De fato, o instituto jurídico do usufruto pode ser definido como odireito real que outorga ao usufrutuário o direito de usar e perceber os frutosde coisa alheia, por tempo determinado ou por prazo vitalício. Assim, esseinstituto garante ao usufrutuário o direito de usar e de gozar de bem alheio,com a obrigação de conservar a sua substância.

 

Logo, com a instituição do usufruto, o proprietário mantém apenas anua-propriedade do bem, que equivale ao domínio, despido dos direitosreservados ao usufrutuário, que passa a usar e desfrutar do bem alheio, semalterar a sua substância. Assim, os frutos derivados da coisa alheia pertencemdiretamente ao usufrutuário, mas sem que isso acarrete qualquer modificação emsua natureza jurídica ou no respectivo tratamento tributário.

 

Diantedisso, percebe-se claramente que o usufrutuário possui o direito de fruir dasutilidades e dos frutos das ações, como os dividendos e o JCP. Como o usufrutoestende-se, salvo disposição em contrário, aos acessórios da coisa, os demaisproveitos econômicos provenientes das ações, como eventuais ações bonificadas,também devem ser atribuídos diretamente ao usufrutuário, em razão do direitoreal sobre coisa alheia.

 

Ademais, na ausência de previsão legal específica, não há razões para seadmitir o tratamento tributário diverso pelo IRPF entre acionista eusufrutuário dos rendimentos de JCP e dividendos. Sob a perspectiva da Lei n.9249, não há nenhum elemento que permita se chegar à conclusão proposta pelafiscalização. Nesse contexto, parece que a solução do caso está de acordo com obrocardo jurídico "ubi eadem ratio, ibieadem dispositivo", definido por Carlos Maximiliano [2] como: "Onde existe a mesma razão fundamental,prevalece a mesma regra de direito', os casos idênticos regem-se pordisposições idênticas".

 

Esse raciocínio fica evidente nocaso dos dividendos, em que há disposição expressa na legislação societária (art.205 da Lei n. 6404), admitindo opagamento direto ao usufrutuário da participação societária. No caso dos JCP,em que não há disposição expressa, aplica-se a mesma lógica, eis que os JCP constituemforma de remuneração do acionista, assim como os dividendos.

 

Por fim, cabe frisar que a reserva de usufruto, ainda que confira plenapossibilidade de uso e de fruição do bem pelo usufrutuário, não tem o condão dereverter a transferência jurídica das ações, realizada por ocasião daintegralização do aumento de capital na pessoa jurídica.

 

Portanto, como os valores recebidos pelo usufrutuário a título dedividendo e o JCP mantêm as suas naturezas jurídicas intactas, cabe aousufrutuário, na ausência de previsão legal específica, aplicar o mesmotratamento tributário estabelecido para cada espécie de rendimento, comocorretamente apontado pelo CARF no acórdão ora examinado.

 

 

_________________________ 

[1] "Art. 1.228. O proprietáriotem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la dopoder de quem quer que injustamente a possua ou detenha."

[2] MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e Aplicação do Direito. 20ªEdição. Rio de Janeiro: Forense, 2011, p. 200.

[3] Em relação aos dividendos, vale mencionar a decisão proferida pelaSuperintendência Regional da Receita Federal ("SRRF") da 9ª Região Fiscal, naSolução de Consulta n. 11, de 14.1.2010, segundo a qual os lucros distribuídosaos usufrutuários de quotas de sociedade limitada devem ser qualificados comodividendos isentos, caso tenham sido calculados com base em resultados apuradosa partir do mês de janeiro de 1996. Confira-se: "Ementa: USUFRUTO. QUOTAS DE CAPITAL. LUCROS DISTRIBUÍDOS. INCIDÊNCIA.Os lucros distribuídos aos usufrutuários das quotas do capital da empresaconstituem rendimento não sujeito à tributação pelo imposto de renda, desde quetenham sido calculados com base em resultados apurados a partir do mês dejaneiro de 1996"




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