Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

Multidão e cobertura massiva nas redes sociais. Não, não era rolezinho. A chegada da fast-fashion Forever 21 no país foi um verdadeiro "rebuliço domesticado" em filas. As mocinhas e moçonas esperavam horas - eram mais de 700 antes da loja abrir no sábado - na unidade do shopping Morumbi, em São Paulo. O preço era um dos atrativos. Blusinha de marca "estrangeira" por menos de R$ 10 e no shopping? Uau! Nem as piratas da 25 de Março. Mesmo isso, contudo, ainda não dá conta total do frisson inicial. Bom, a marca tem seu peso e uma legião de fãs pelo mundo. Tópico importante para as viajadas. Mas o que fez diferença mesmo foi juntar os dois fatores. Pela primeira vez o consumidor brasileiro pode experimentar comprar tendências globalizadas a preços acessíveis mesmo e em seu país de origem.

Como o mercado já registrou e a consultora Gloria Kalil tem ressaltado, "a moda está fora de moda". Cada vez menos consumidores reconhecem valor no caráter fugaz do universo fashion, a menos que paguem pouco por isso. Há outros itens, além da roupa, que podem exprimir uma atitude ou representar seu lugar no mundo, como a tecnologia, por exemplo. "O fast-fashion é uma realidade mundial. Mas o consumidor brasileiro tinha aceito que o jogo se dava até determinado patamar de preço. Agora ele viu que a barreira foi rompida. Se a Forever 21 conseguir manter sua política de preços e expandir sua rede, como prometeu, as varejistas nacionais vão sentir o impacto", diz o sociólogo Dario Caldas, coordenador do Observatório de Sinais.

Fenômenos como esse não afetam só os "players" do fast-fashion. Eles também incomodam o setor de luxo, que tem registrado quedas anuais nas vendas de vestuário. É por isso que as grifes têm buscado reconectar seus consumidores com o processo de fabricação. Levá-los aos ateliês, envolvê-los nesse universo da sutileza do feito à mão para que eles reconheçam um valor intrínseco no produto. Mas essa é só uma das ferramentas.

A grife brasileira de luxo Lita Mortari, por exemplo, chegou aos 30 anos diante de um dilema. Qualidade, por si só, não é mais um atributo que comove os consumidores, ainda mais quando isso significa preços altos. Aderir sem restrições ao frenesi "fashionista" para renovar o público também não seria um caminho. Por isso, a fundadora Eliana Penna Moreira voltou às origens - "roupas femininas e bem cortadas para mulheres que trabalham" - para mostrar sua relevância para o público feminino, num contexto contemporâneo, ao mesmo tempo em que conseguiu equacionar preços.

Com três lojas em São Paulo, ela está conversando com as moçoilas bem-sucedidas que trabalham na cidade. "A nossa cliente precisa se sentir segura para a jornada que uma cidade como São Paulo impõe. Ela pode ir do escritório para o restaurante, passando horas dentro do carro e depois ir a um evento - tudo com o mesmo figurino. Ela não se sente atendida nos blogs de moda. Mas é bem informada e merece ser reconhecida e bem tratada", acredita Eliana.

Sua proposta é mais que desenvolver opções para a mulher urbana. As peças são classudas, confortáveis, versáteis e com caimento perfeito sem que isso signifique roupas de "tiazinha". Cores e silhuetas contemporâneas trazem frescor e a informação de moda necessária, enquanto calças com cintura no lugar, pernas retas e tecido elástico dão aquela sensação de alívio "como veste bem".

"A Lita Mortari surgiu de uma necessidade minha de poder trabalhar e criar meus filhos ao mesmo tempo. Por isso, nosso olhar está em sintonia com as executivas e as empreendedoras, mas sempre com uma linguagem feminina. Nunca aderi às ombreiras gigantes", explica Eliana, que hoje tem uma equipe jovem para auxiliá-la, como a filha Bianca, no marketing, a nora Fernanda Youssef, no estilo, e o filho Guilherme, nas finanças.

Entre 2006 e 2009, a empresa passou por dificuldades, a dissolução da sociedade (Li vem de Eliana e Ta, da prima Tânia), a recuperação judicial e a redução do número de lojas. Mas foi preciso o chacoalhão para que a marca fosse em busca de seu lugar dentro do mundo do luxo. Além da retomada da vocação e do estilo, Eliana também cuidou dos custos. Ela importava 90% dos tecidos da Europa. Hoje, esse percentual caiu para 50%.

"Tinha receio de não encontrar qualidade por aqui. Também desenvolvi fornecedores de muita qualidade em países como o Peru, que tem uma alpaca de altíssimo padrão." A empresa terceirizou ainda várias etapas da produção. "Se não tivesse feito isso, minhas peças custariam 30% a mais." Hoje, seus preços começam em R$ 400 e o tíquete médio é de R$ 1,5 mil.

Com a casa arrumada, Bianca pode oxigenar a comunicação. Hoje, por exemplo, a marca vai reunir as designers peruanas Meche Correa, Sumy Kujon, Kyara Macchiavelo e Gretel Gonzales, que foram parceiros na nova coleção, num evento para clientes. Mas a ideia é criar cada vez mais canais de conexão com a consumidora, como, por exemplo, oferecer cursos que tenham impacto na rotina, do tipo "como desvendar as funções de seu celular".

Com os brasileiros gastando R$ 4 bilhões em roupas no exterior, segundo dados da Abvtex, e as fast-fashions internacionais redefinindo quanto vale a moda por aqui, muitas marcas locais minguam em resultado e relevância. Não há mais espaço para amadorismo. E é preciso coragem para reescrever a própria história.

angelaklinke@uol.com.br


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