Fonte: Valor Econômico |
Na semana passada, o Tribunal de Contas da União (TCU) decidiu que o governo está obrigado a compensar, por meio do aumento de receita, as desonerações tributárias que vier a fazer. Até agora, a compensação era feita com um alegado "excesso de arrecadação" e com ajustes na programação orçamentária e financeira do ano. O TCU concluiu que o artigo 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) não permite esses dois mecanismos. Por causa da decisão do TCU, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, pediu, nessa terça-feira, que o Congresso Nacional incluísse na lei orçamentária de 2013 uma estimativa de perda de receita de R$ 9,796 bilhões por causa da redução de alíquotas do PIS/Cofins, que será feita no próximo ano e beneficiará setores a serem definidos. Isso significa que a previsão da arrecadação desses dois tributos em 2013 será reduzida em R$ 9,796 bilhões. Mantega solicitou também que fosse incluída na lei orçamentária uma perda adicional de receita de R$ 800 milhões da Previdência Social, por conta da ampliação da desoneração da folha de salários. Na proposta orçamentária, enviada pelo governo em agosto, havia apenas uma previsão do impacto da desoneração da folha de salário, no valor de R$ 15,2 bilhões. Com os R$ 800 milhões, esse valor subirá para R$ 16 bilhões, que, somados aos R$ 9,796 bilhões do PIS/Cofins, totaliza uma renúncia de receita de R$ 25,796 bilhões com as desonerações em 2013. Desonerações tornam mais difícil avaliar receitas Para compensar essa perda, o governo elevou em R$ 6 bilhões sua estimativa para a receita com dividendos das empresas estatais no próximo ano e em R$ 4,596 bilhões a previsão para a receita de concessões e permissões de serviços públicos. Ou seja, para compensar a perda da arrecadação de três contribuições (PIS, Cofins e contribuição patronal ao INSS), ele aumentou duas receitas não tributárias, que podem ou não ocorrer. Há várias questões a serem discutidas na compensação da desoneração tributária com o aumento da receita. A primeira delas é saber como foi estimada a renúncia da receita, se foi usado um modelo que considera o efeito positivo da diminuição dos tributos. É de fácil compreensão que muitas vezes uma queda da carga tributária aumenta as vendas do setor beneficiado e, com isso, a arrecadação sobe. O cálculo da renúncia não é trivial, pois não é possível prever quantos contribuintes dos tributos deixarão o setor beneficiado com a desoneração durante o prazo de vigência da medida e quantos ingressarão. Além disso, o peso dos tributos é suportado mais por uns do que por outros, dentro do mesmo setor. O nível da arrecadação de cada ano está muito mais relacionado com o ritmo da atividade econômica do que a qualquer outra coisa. Se a economia está desacelerando, nada garante que a receita de um determinado tributo continuará em expansão, mesmo que não ocorra desoneração. Portanto, é necessário, antes de mais nada, saber com qual previsão de crescimento da economia foi feita a projeção da perda com a desoneração. A previsão de perda de receita com a desoneração é, portanto, difícil ou quase impossível de ser verificada. Ela não é um dado empírico. Em 2012, o governo diz que realizou desonerações tributárias no montante de R$ 43,4 bilhões. Esse dado consta de várias apresentações do ministro da Fazenda, Guido Mantega, a empresários brasileiros e estrangeiros. Não está claro como o governo chegou a esse valor e se elas foram feitas quando o governo trabalhava com uma perspectiva de crescimento da economia de 4,5% neste ano. De qualquer forma, é difícil acreditar que se as desonerações não tivessem sido feitas, a receita tributária do governo federal neste ano teria sido maior em R$ 43,4 bilhões. A arrecadação de tributos neste ano não foi bem, mas o fraco desempenho está muito mais relacionado com a desaceleração da economia e com a redução da lucratividade das empresas do que com as desonerações feitas pelo governo federal. O governo estimou que a receita da Previdência Social será de R$ 314 bilhões em 2013, considerando as regras anteriores à desoneração da folha de salários. Se a arrecadação ficar abaixo desse valor, o Tesouro cobrirá a diferença, até o limite de R$ 16 bilhões, pois essa é a estimativa oficial para o custo desta desoneração. Mas não está claro, por exemplo, o que acontecerá se a receita previdenciária superar os R$ 314 bilhões. Muitos poderão entender que não houve perda de receita com a desoneração da folha. Mas é claro que essa avaliação não considera que o crescimento da arrecadação previdenciária depende de outros fatores, como o aumento da formalização da força de trabalho. Na verdade, não é possível prever com algum grau de precisão o impacto da troca da contribuição patronal ao INSS pela contribuição sobre o faturamento, com alíquotas de 1% ou 2%, dependendo do setor. Se o crescimento da economia for muito forte, como espera o ministro Guido Mantega, o faturamento das empresas beneficiadas com a desoneração aumentará muito, o que reduzirá a perda da Previdência Social com a mudança. Existe outra dificuldade nessa discussão. O governo não é obrigado a prever compensação na lei orçamentária para as desonerações dos chamados impostos regulatórios, de acordo com a LRF. Nessa relação estão o Imposto sobre Importação (II), o Imposto sobre Exportação (IE), o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). Por isso, políticas como a de redução do IPI para automóveis ou produtos da linha branca não exigem compensação de aumento de receitas. Assim, nem todos os impactos das desonerações são identificáveis no Orçamento. As desonerações tributárias, com a compensação exigida pelo TCU, tornam ainda menos transparentes as estatísticas das receitas e despesas do Tesouro Nacional e mais difícil de prever a execução orçamentária e financeira do próximo ano.
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