Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

Diretor da Coteminas - “Estamos numa política perigosa de reduzir empregos no Brasil”


Câmbio supervalorizado, custo da mão de obra alto e preço da matéria-prima principal, o algodão, disparando. A mistura fez do primeiro quadrimestre do ano um período difícil para a indústria têxtil brasileira e a do Rio Grande do Norte não escapou ilesa ao movimento. “Foi um começo de ano difícil”, analisa o presidente do Sindicato das Indústrias de Fiação e Tecelagem do Rio Grande do Norte e diretor da Coteminas, João Lima. De malas prontas para embarcar para a Rússia, para participar do último módulo do “Programa BRICs on BRICs”, que apresenta mercado, potencialidades e riscos oferecidos  nos países do BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China) a executivos desses países, ele recebeu a TRIBUNA DO NORTE na última quarta-feira (cerca de quatro dias antes de viajar) e fez um raio-x do que 2011 representou até agora para o setor. Na lista de assuntos abordados, incluiu temas polêmicos como a necessidade de reforma tributária e de ações por parte do governo para melhorar o câmbio. Confira os principais trechos:

O preço do algodão mais que dobrou este ano no Brasil, - segundo pesquisa do Cepea, até março subiu cerca de 170% - e isso acabou provocando uma crise no setor têxtil, com impactos mais profundos no Sul do país. Empresas fecharam, demitiram, cancelaram entregas. Qual foi o impacto no Rio Grande do Norte?

O algodão é uma commodity internacional. É uma mercadoria negociada em bolsas de mercadorias do mundo todo, como é a soja, como é o milho. Então o preço é um preço internacional. Quando ele aumenta, normalmente aumenta no mundo todo. É claro que países produtores como o Brasil às vezes tem uma pequena vantagem porque como o algodão é produzido internamente há vantagem no frete, por exemplo. Mas este ano, historicamente, o preço, em dólar, corrigido para a realidade de hoje, só tem paralelo na época da Independência dos Estados Unidos, quando a Inglaterra bloqueou os portos americanos e como Estados Unidos é grande exportador de algodão o preço do algodão subiu muito. A realidade do algodão este ano de 2011 é essa. O algodão subiu 100%, 120%, 150%. A quebra em safras de países produtores e a demanda em outros países, especialmente na China, provocou essa elevação. E como tem muito produto que vai para o mercado em que o algodão representa 50%, 60% do preço final,a  indústria acaba sentindo.

Que produtos são esses?

Normalmente o produto têxtil tem como primeiro item de custo a matéria-prima. Em segundo vem mão de obra, em terceiro vem energia, depois vem outros custos. Quanto mais pesado é um produto, maior é o peso da matéria-prima nele. Numa calça jeans, por exemplo, o peso do algodão é maior que em uma camiseta. Então esse aumento no preço do algodão refletiu de maneira que as empresas que produzem fio, que produzem tecido, que confeccionam produto tiveram obrigatoriamente que repassar parte disso para o consumidor final. E ao levar esse preço para o consumidor final, o mercado deu uma certa freada e passou a  comprar menos. Com isso, algumas empresas do Sul e do Sudeste pararam, deram férias coletivas, porque o mercado deu uma segurada nas compras.

No Rio Grande do Norte chegou a esse extremo?

O aperto para o setor têxtil é geral. O efeito é o mesmo, mas felizmente nossas empresas são bem estruturadas. As empresas maiores como Vicunha, Coteminas, Linhas Correntes, Nortex, são bem estruturadas. Todas estão sofrendo com a  crise, mas estão administrando porque temos certeza também de que esse mercado vai voltar a crescer. 

Emanuel AmaralJoão Lima/Presidente do Sindicato da Indústria TêxtilJoão Lima/Presidente do Sindicato da Indústria Têxtil
As empresas do estado são bem estruturadas, mas o que precisaram fazer na prática para evitar um impacto maior com a alta da matéria-prima?

Ao invés de parar como outras, nós aumentamos os estoques porque temos certeza de que o mercado vai voltar a melhorar. Tenho certeza também de que aumentamos menos os nossos preços então continuamos vendendo mais do que os outros. É uma situação muito apertada, mas eu diria que as empresas situadas no Rio Grande do Norte, de forma geral, têm administrado muito bem a situação. Todo o setor têxtil tem procurado também fazer produtos que gastem menos matéria-prima, usando alternativas ao algodão. Existe, porém, uma situação mais grave. O sindicato tem várias indústrias do estado filiadas, mas tem também uma cooperativa em Jardim de Piranhas que tem mais de 50 empresas filiadas. E lá o produto final tem muita matéria-prima intensiva. São produtos baratos e pesados. Então lá em Jardim de Piranhas muitas empresas pararam.

Quantas foram?

Não sei precisar o número, mas lá há uma situação muito grave de paralisação de empresas pequenas. Como fabricam mais pano de prato, tapetes, produtos pesados, a situação ficou mais difícil.

Qual é a tendência para o preço da matéria-prima daqui para frente?

O algodão está agora em fase descendente, mas não sabemos ainda em que velocidade vai cair nem até onde a queda vai chegar. Não tenho dúvidas de que a situação vai se normalizar. Quando aumenta muito o preço, aumenta a quantidade de pessoas plantando. E como esse aumento que teve agora (no preço) foi um aumento violento, então a área plantada de algodão no mundo vai crescer muito. No Brasil, as estatísticas apontam que a próxima safra tem uma área plantada cerca de 30% maior que a anterior. Isso representa mais oferta de algodão.

O senhor disse que investir em produtos diferenciados tem sido uma solução encontrada pela indústria. E plantar algodão, como a Coteminas pretende fazer (a companhia anunciou na semana passada a criação de uma empresa dedicada à produção e comercialização de commodities agrícolas: a Cantagalo General Grains), já tem sido uma aposta também de outras empresas do setor no estado?

Eu sei que a Vicunha teve uma experiência de plantar algodão no passado. Não sei se estão plantando agora, mas eu acho que sim. No caso da Coteminas, o projeto não é plantar só algodão. A empresa que a Coteminas está lançando vai plantar milho, soja, algodão e outros produtos que sejam economicamente viáveis no país. E no caso do algodão, não é em função do preço. Esse não é um projeto da Coteminas SA, não é da indústria. Quem está fazendo o investimento é uma holding da Coteminas, que está fazendo esse investimento porque acredita no potencial do Brasil como produtor de grãos. A empresa já tem um investimento muito grande em terras de boa qualidade. A holding foi adquirindo ao longo do tempo. Há mais um sócio que tem também terras e conhecimento na área de plantação. Então uniu-se todo esse know how para criar essa empresa.

Há perspectiva de plantar alguma coisa no Rio Grande do Norte?

Inicialmente a empresa tem estoques de terras no Sudeste. Então vai começar pelo Sudeste. Mas é uma empresa para ser nacional. Então se surgir no RN a oportunidade de virmos a plantar algodão ou outro produto, então tranquilamente a Coteminas virá para cá.

O Rio Grande do Norte já foi um grande produtor de algodão. Hoje engatinha perto de estados como a Bahia. Como o senhor enxerga a cotonicultura do RN?

Tem duas vertentes para se plantar algodão no Rio Grande do Norte. Uma vertente seria tentar localizar áreas com condições parecidas com a da Bahia, áreas grandes, totalmente mecanizáveis, e fazer plantação em alta escala, com alta produtividade, como é feito na Bahia. Outra realidade, que teria um cunho muito mais social, seria estimular a  atividade na cultura familiar, como acontecia no passado. Se você me perguntar se do ponto de vista de produtividade o estado poderia competir com a Bahia, eu diria que não. Mas pode-se criar um modelo em que o agricultor teria custos mais baixos, em que poderia plantar de forma consorciada com outras culturas, mas, para isso funcionar, teria que ter um mecanismo de apoio do governo estadual, da Emater, para dar tecnologia, para ter um programa pelo menos de garantia de um preço mínimo e de ajuda na comercialização. O pequeno produtor, ao plantar, não consegue suportar uma variação muito grande de preço. Se fizer esse tipo de arranjo produtivo eu tenho certeza de que o Rio Grande do Norte poderá produzir algodão. Isso pode melhorar a qualidade de vida das pessoas que estão no campo e  fixá-las no campo. Enxergo o algodão com uma função social no Rio Grande do Norte. Existem alguns projetos localizados. O pessoal do Vale do Assu, por exemplo, se articulando. Mas a produção do estado hoje é insignificante frente a produção nacional. No passado, muitas indústrias vieram para o Rio Grande do Norte em função do estado ser produtor. Um exemplo disso é a Linhas Correntes (Coats), que veio para o estado porque havia oferta de algodão de fibra longa. Algodão não tem mais. Mas o estado tem pessoas treinadas, com a cultura têxtil. E as indústrias permanecem no estado porque existe justamente essa cultura.

Que avaliação o senhor faz do quadrimestre?

Eu diria que tivemos um quadrimestre muito apertado e de adaptações. Enfrentamos problemas com o preço do algodão em alta, mas essa é uma situação sazonal. Esperamos que vá passar. Agora o setor têxtil e de confecção, que eu diria que são interligados, tem enfrentado dificuldades conjunturais. Uma delas é que o setor exportava, mas com a realidade cambial do Brasil , com o Real valorizado, praticamente deixou de exportar. A outra realidade é que o custo da mão de obra no Brasil, e o Nordeste não está fora disso, está muito caro.  Para você ter uma ideia, o custo de um operário têxtil, quando você soma salário e outros benefícios no ano e divide por 12, ele é praticamente 3,5 ou 4 vezes mais caro do que um trabalhador têxtil na China fazendo o mesmo trabalho. E a mão de obra é normalmente o segundo maior custo da indústria têxtil. Hoje quem exporta têxtil no mundo é a China e a Ásia, em função de terem custo mais baixo e câmbio valorizado em seus territórios. Então o setor têxtil brasileiro hoje está produzindo para o mercado interno.  Felizmente o mercado interno tem crescido. Agora, o Brasil tem que tomar medidas que corrijam o câmbio, que desonerem a folha de pagamento das empresas, porque se não vamos perder o mercado aqui dentro também. Estamos reduzindo empregos no Brasil e aumentando empregos na China. A importação de produtos manufaturados no Brasil vindos da China é uma curva crescente. E estamos começando a destruir a indústria de manufatura no Brasil Essa realidade vem se agravando. O que faz o custo da mão de obra ser alta é a burocracia, a legislação trabalhista engessada, do século passado, a  quantidade de encargos na folha de salário. Está ficando caro produzir manufaturado no Brasil.

O governo federal tem falado de forma mais intensa nos últimos dias em reforma tributária e desoneração da folha de pagamento. Como a indústria têxtil enxerga esse movimento? Essa discussão vai pra frente?

Eu gostaria muito de acreditar nisso. Isso seria muito importante não só para o setor têxtil, mas para o setor de manufatura. Já que não consegue desonerar tudo, o governo deveria criar políticas diferentes por setores. O setor de mão de obra intensiva – como é o caso da indústria têxtil – tem carga tributária maior que a mineração, por exemplo. E o Brasil hoje está tendo ainda uma balança comercial positiva em função de exportar commodities. Minério de ferro, que deixa buraco e não emprega ninguém, carne, soja. Está exportando produtos básicos e importando manufaturados. Estamos numa política perigosa de reduzir empregos no Brasil. Então qualquer esforço que for feito na desoneração da folha de pagamento é muito bem vindo. Agora, a gente tem ouvido discurso, mas na prática, a legislação cada dia piora. Não é que criem encargos novos, mas é que criam burocracias novas que vão sempre no sem tido de encarecer o custo da mão de obra.

Fonte:|tribunadonorte.com.br|

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Lei de oferta e procura, lamentavelmente. Importamos manufaturados quando se precisa e o preço está baixo, assim como a Coteminas o fez em importar pano de camuflagem da China para manufaturar uniformes para as forcas armadas, do Brasil.

Sim o preco dos funcionários Textil andam altíssimos. Um técnico anda ganhando em media 300 % a menos do que um motorista de taxi. Quatrocentos por cento a menos do que um caminhoneiro. Menos do que um pedreiro, do que uma manicure, do que um barbeiro e bem menos do que um camelo.

Mecanização da indústria é menos mão de obra? Obvio e irreversível. Para isso teríamos que DIVERSIFICAR A NOSSA produção e AUMENTAR o nosso campo industrial especialmente na fabricação de PORCARIAS E QUINQUILHARIAS. Sejamos fatuais: O ser humano, em geral, adora porcaria: E porcarias devemos fabricar PORQUE HA UM MERCADO  para isso. Se não fabricarmos DREK, importaremos drek da China.

O setor Textil, eu penso, e para viciados ou masoquistas. Sou os dois e nele estou. Porem e um de uma peculiaridade singela, que não posso ainda me expressar bem na escrita. É como se fosse uma gratificação inaudita, enrolada em sofrimento. Também gera muito emprego e dar margem ao artístico - mecânico em cada um de nos. Da um toque Napoleônico ou Cesariano aos Capitães da Indústria em mover centúrias e legiões de homens. É uma grande fonte geradora de trabalho e enquanto o ser humano tiver que cobrir as suas vergonhas (ou realçar os seus capitais de investimento social), sempre haverá alguém plantando / fabricando fibras, gente fiando e gente tecendo.

E assim e a indústria têxtil: Para um grupo único de “cojones bien puestos” e que evita propositalmente o raciocínio cartesiano, E por isso, como esposas de malandro, apanhamos mais ficamos. SdM

Concordo plenamento com o comentarista abaixo.

Com o agravante das importações da China.

De que lado será que ela está?    Do capital é lógico!.

 

Lei de oferta e procura, lamentavelmente. Importamos manufaturados quando se precisa e o preço está baixo, assim como a Coteminas o fez em importar pano de camuflagem da China para manufaturar uniformes para as forcas armadas, do Brasil.

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