Alexandre Lopepe é um europeu convicto, mas, de seis meses para cá, ele só quer comprar produtos franceses. “Tive esse estalo depois que vi uma série de reportagens sobre os danos que a produção de algodão causa ao meio ambiente na China”, explica esse morador de Toulouse de 28 anos, especialista em informática no setor espacial. “Nunca fui militante, mas nesse caso acabei me tornando, pela ação”. Claire Nahoun teve uma “revelação no inverno passado”, ela lembra. “Uma noite, meu filho, que faz estágio em uma loja de brinquedos, me disse que 80% do que eu tinha era fabricado na China. Aquilo me chocou”, explica essa assistente em um escritório de advocacia. “Desde então passei a olhar todas as etiquetas e me surpreendi ao ver tantas grandes marcas de roupas made in China. Sou a favor da globalização, mas a partir de agora direciono minhas compras”.
Quanto a Thierry Lehoux, gerente de uma consultoria em Nantes, sua conscientização começou há pouco menos de dois anos, no auge da crise mundial. “Nós fomos ingênuos em defender o livre-comércio”, ele comenta. “A poluição e os baixos salários dominam na Ásia, e aos poucos fomos perdendo nossas indústrias, nossos departamentos de pesquisa e até nossas sedes sociais. Eu privilegio o comércio local para que a produção volte à França”.
Seriam atípicos, esses consumidores? Muito pelo contrário. Segundo pesquisa realizada pelo IFOP junto a 1.004 pessoas, publicada no dia 21 de novembro, 66% dos franceses anunciam estar dispostos a pagar um pouco mais caro (de 5% a 10%) se o produto for fabricado na França. Claro, são declarações de intenção, mas que agora são efetuadas na prática.
Na internet, o site alittlemarket.com, rápido em revelar tendências, vem dobrando de tamanho a cada seis meses. Ele expõe as produções francesas de 20 mil artesãos – roupas, malas, decoração, bijuterias: são 400 mil visitas por mês, 15 milhões de acessos. Oito em cada dez clientes, entrevistados em outubro, declaram comprar no site para movimentar a economia local. “A cada dia cem novos criadores pedem para expor no site”, explica, ainda surpreso, o cofundador Nicolas Cohen.
Esse entusiasmo não passou batido por Hervé Gibet e Fabienne Butin. Em 2008 esses dois pioneiros criaram, paralelamente aos seus trabalhos – ele é jornalista em Paris, e ela professora de pintura em Cassis –, os sites La Fabrique Hexagonale e Madine-France para ajudar os consumidores a descobrir empresas que fabriquem localmente. “No início, houve quem achasse que eu era um apoiador de Pétain”, explica Hervé Gibet. “E eu, uma militante de extrema direita”, diz Fabienne Butin. “Foi no final de 2010 que a tendência se inverteu: comprar produtos franceses se tornou um gesto de cidadania”, reconhecem os dois pioneiros.
Sinal dos tempos: neste verão, a empresa bicentenária Pleyel, conhecida mundialmente por seus pianos, pediu a Hervé Gibet para ser listado online. Os sites franceses de venda vêm se multiplicando: 100% Made in France, France-Avenue, Acheter français n’est pas un luxe, etc. Até os sites destinados aos pequenos bolsos estão aderindo. Assim, o 30eurosmaxi.com marca os produtos franceses com uma bandeirinha. “Nossas vendas vêm aumentando 30% ao ano. Fiquei surpresa com a variedade de produtos franceses acessíveis aos pequenos orçamentos”, explica sua fundadora, Hanane El Riz. “O entusiasmo vem de pouco mais de um ano”, diz Alexiane Pesenti, diretora de marketing do Vilac, cujas bonecas Petitcollin são vendidas nesse site. “É uma consequência positiva da crise. O poder de compra está diminuindo, os franceses compram menos, mas melhor.”
Resultado: algumas indústrias, em dificuldades nos últimos anos, estão se recuperando. “Este ano aumentei o logo ‘made in France’ na embalagem de nossos brinquedos. Isso virou uma estratégia comercial”, afirma Jacques Ecoiffier, dono da empresa de brinquedos de mesmo nome. A linha Klorofil, da empresa Vulli, que exibe uma bandeira tricolor, se encontra em destaque nas lojas de brinquedos neste Natal.
O “toque francês” também anda de vento em popa fora do país. “Quando dez parques nova-iorquinos se equipam com nossas cadeiras (as do parisiense Jardim de Luxemburgo), é um pouco do Quartier Latin e da Sorbonne que eles estão comprando”, reconhece Bernard Reybier, presidente da Fermob, que tem quase metade de seu faturamento no exterior. Já Jean-Yves Hepp está bastante orgulhoso de apresentar seu tablet Qooq, 100% francês, no templo mundial do high-tech, o Consumer Electronics Show em Las Vegas, em janeiro. “Vou vendê-lo aos americanos agora que sua produção acaba de passar de Shenzen, na China, para Montceau-les-Mines (Saône-et-Loire), sem que isso me custe mais caro”, ele explica.
Mas, sem ingenuidade. O consumidor terá dificuldades em encontrar produtos industriais franceses – exceto pelos agroalimentares, é claro – nas prateleiras dos super e hipermercados. “Certos distribuidores não querem entrar no jogo, e vendem brinquedos feitos na China mais caro que os nossos”, acredita Jacques Ecoiffier. As pequenas empresas francesas ainda não conseguiram seduzir o grande varejo, acostumado a multiplicar os preços chineses de quatro a cinco vezes e assim ter margens substanciais.
Para conseguir sobreviver, uma nova geração de empreendedores tem se voltado para modelos alternativos de distribuição. A fabricante de móveis Edito, criada em 2008, oferece em seu site um modelo atraente: o internauta pode comprar móveis 100% fabricados em Evry. Mas ele também pode financiar parte do desenvolvimento de um protótipo oferecido online. Ele poderá então comprar o produto com desconto (-20%), mas como “coeditor” também recebe “royalties” a cada venda (cerca de 1 euro por móvel vendido para cada 100 euros de investimento inicial). A empresa não possui estoque, não apresenta nenhum custo de desenvolvimento e só tem um showroom em Paris.
O modelo evidentemente seduz: 100 mil euros, ou seja, 10% do faturamento, serão revertidos este ano para os internautas, acredita seu diretor-geral, Francis Lelong, criador do site de venda de sapatos Sarenza. “Nós não somos ambientalistas, mas temos valores fortes”, ele explica. “Podemos ser igualmente bons produzindo na França e sendo um pouco mais criativos”.
As iniciativas se multiplicam. O site Archiduchesse oferece desde 2009 uma coleção de 48 cores de meias fabricadas em Limoges, tendo já vendido 50 mil pares. A Jacques & Déméter, marca de sapatos de luxo a menos de 250 euros, acaba de entrar na Rede, agora em novembro. Em seu comando está uma jovem dupla de criadores que, até o Natal, multiplicará sua presença nas “pop-ups”, locais de venda temporários que têm brotado na França. “É um bom meio de ir até os clientes”, explica o cofundador Maxime Van Rothem.
Apesar de tudo, para o consumidor não é tão simples se situar. “A proveniência dos produtos é bem menos transparente do que 20 anos atrás”, conta Thierry Lehoux. “Recentemente, quis comprar uma bateria de carro. Perguntei ao vendedor de onde vinham os três modelos oferecidos... ele foi incapaz de me responder, e só me disse que os três funcionavam bem!”. Para esclarecer a situação, o selo Origine France Garantie foi lançado em maio. Certificado por um órgão privado, a agência Veritas, ele estipula que “50% do valor do produto tenha sido adquirido em território nacional, e que as instalações onde ele tenha assumido suas características essenciais estejam situadas na França”. Uma definição um tanto vaga... e custosa para colocar em prática.
“Eu quis receber uma certificação, e recebi um orçamento de quase 3.000 euros”, explica o jovem designer têxtil Philippe Gaber, que decidiu criar seu próprio logo para mostrar sua “francesidade”. Já a ótica Atol providenciou a certificação de sua última coleção de óculos Nu.
Quanto às empresas rápidas demais em pegar carona na tendência de exibir uma bandeira... os 60 mil visitantes mensais do La Fabrique Hexagonale passaram a ficar atentos. “São enviados especiais voluntários que repassam informações, como discretas mudanças de locais de produção”, observa Hervé Gibet. A Web 2.0 a serviço de um novo controle por parte do cidadão.
Tradução: Lana Lim
http://noticias.uol.com.br/midiaglobal/lemonde/2011/12/10/comprar-p...
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Oxalá os brasileiros acordem para a realidade e percebam em que cilada estamos entrando. Sabemos o poder nefasto e devastador que são níveis elevados de desemprego.
Embora a dificuldade esteja cada vez maior, ainda está em tempo de salvar nossa cadeia têxtil.
Um momento para reflexão e outro para ação, sem exagerar no xenofobismo.
concordo com Alexandre e procuro sempre produtos franceses mas na vestimentaria aind a aqui na França esta muito caro , mas sempre fico irritada qdo vou em lojas pq a qualidade dos produtos chineses sao pessimos e todoas as loja s parecem iguais.... nao existem mais industrias na França tudo é descentralizado..... uma pena , mas acho que logo as coisas mudarao , temos qu boicotar os produtos chineses no mundo!abraços!
pois é.....todos se viram para reverter um pouco esta situação......e nós brasileiros, o que fazemos????todos importadores almejando altos lucros, independente se no futuro teremos ou nao consumidores!!!! alem da gurra que estão fazendo ...um tentando vender mais barato que outro!!!! que merd ..... que chegou este país!!!!
adalberto
a crise na França ta "braba" e parece que vao ter que desvalorizar a moeda , diminuindo assim as importaçoes de produtos chineses, o mundo tem que boicotar ou colocar limites com produtos vindo de la.... temos que preservar nossos valores , nossa economia nossa dignidade!
mas se o governo da subsidio maior para a produçao brasileira as coisas irao melhor....
realmente o fim da picada!!!!! Aqui na França nem industria tem mais ; fora a de automoveis vai de "pire en pire" (cada vez pior) como dizem os franceses.....bacana tc com vc ..mas... nao perca as esperanças eheh pensamento positivo..... abraço
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Gilberto Miyake disse:
Olá Marcelle.
Esqueça! O governo jamais fará isso.
Subsídios são condenáveis, do ponto de vista da OMC.
Hoje, o governo já impôs as alíquotas máximas permitidas para a importação de têxteis e, mesmo assim, a diferença de preços é enorme. Para se ter uma ideia, um produto asiático, colocado no mercado nacional, com todos os impostos e taxas, fica de 35 a 50% mais barato que o mesmo produto - exatamente igual - produzido aqui no Brasil.
Então, é questão de tempo: neste ano ou no próximo, a indústria têxtil brasileira, uma cadeia que muito nos orgulha, pela criatividade e pela eficiência, será detonada (mais uma, dentre tantas) pela indústria têxtil chinesa.
Enquanto lá, as indústrias pertencem ao estado, aqui, o estado só participa do lucro, taxando-o o máximo que podem. E, se a empresa tem prejuízo, deve-se o imposto, antes de tudo. E se quebram, os administradores é que foram incompetentes.
É o fim da picada...
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