Os têxteis pós-consumo estão a transformar-se numa matéria-prima cada vez mais viável para a indústria de vestuário, que procura reduzir o excesso de utilização de recursos. Mas para que tenha realmente impacto, a perspetiva dos empresários e gestores tem de mudar.
O primeiro passo para isso, acredita Karla Magruder, fundadora da consultora Fabrikology, citada pelo Sourcing Journal (ver Post-Consumer Textiles Aren’t Waste—They’re a ‘New’ Commodity), será deixar de chamar “resíduos” ou “lixo” aos têxteis pós-consumo. «Há muito a acontecer no que diz respeito a pensar nos têxteis pós-consumo. Vou tentar manter-me afastada da palavra “resíduo” porque já não vai ser um resíduo. Vai ser uma commodity», sublinhou durante a sua intervenção no painel sobre produção sustentável na Conferência de Sustentabilidade Têxtil, promovida pela Textile Exchange, que decorreu de 22 a 24 de outubro, em Milão.
Fábricas e organizações que têm a sustentabilidade em conta e se focam em artigos de vestuário pós-consumo vão buscar estes produtos a pontos de recolha de resíduos têxteis, separam e desfazem em fibras, que voltam a fiar e a transformar em vestuário novo – com menos impacto.
Mentalidades em mudança
É um conceito que ainda não entrou na maior parte da indústria, que muitas vezes considera que estes produtos, que de outra forma iriam parar a aterros, têm menos qualidade e uma performance mais fraca quando comparados com materiais orgânicos ou virgens.
«As pessoas ainda estão a tentar compreender o que é o pós-consumo e que impacto tem no ambiente», refere Deepak Goel, diretor da indiana Geetanjali Woollens, que há quatro décadas trabalha com têxteis pós-consumo.
A Agência de Proteção Ambiental dos EUA estima que cerca de 10 mil milhões de quilos de resíduos têxteis pós-consumo vão parar anualmente a aterros só nos EUA. E com um processo como o da Geetanjali, que cria novo fio a partir de têxteis usados sem usar qualquer corante ou químico e sem utilizar água até ao processo da fiação, há uma prova clara do impacto positivo dos têxteis pós-consumo – embora poucas marcas tenham abraçado esta opção.
«Estas roupas velhas que deitamos fora, se as marcas não apoiarem os têxteis reciclados pós-consumo, eventualmente pessoas como nós vão parar de reciclar», apontou Goel. «E depois? Fazemos uma nova Austrália no meio do Pacífico? Daqui a 10 anos vamos poder fazer uma nova Austrália com a quantidade de resíduos que teremos», sublinhou.
Reciclagem à vista
Os riscos para a indústria de vestuário são muitos, uma vez que as roupas não vão sair de moda e a vontade dos consumidores de comprar mais coisas não vai mudar muito. Vai ser necessário uma mudança na cadeia de aprovisionamento, desde a fábrica até à administração das empresas.
«Produzimos entre 10 e 11 milhões de metros de produto e 3% vai para o lixo», referiu Andreas Crespi, diretor-geral da Eurojersey SpA, uma empresa italiana especializada em malhas.
Reciclar é crucial, quer a indústria esteja ou não preparada, e a mudança de mentalidade irá exigir perceber como passar de algo que o mundo considera há muito lixo para pensar nos têxteis pós-consumo como um recurso. «Chamamos-lhe resíduo porque não damos valor àquilo que temos», assumiu Andreas Crespi. «Não podemos continuar dessa forma», assegurou.
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